Todos os especialistas de Medicina Interna do hospital Garcia de Orta (HGO) recusaram-se a fazer mais horas extraordinárias, pondo assim em risco a urgência do hospital de Almada. A informação foi avançada, esta terça-feira, ao Observador por fontes do Garcia de Orta.

Cerca de 20 médicos internistas entregaram, na passada quinta-feira, uma declaração de indisponibilidade para fazer horas suplementares às previstas no seu contrato de trabalho. As mesmas fontes hospitalares adiantam que os internistas do Garcia de Orta estão a fazer “no mínimo 440 horas extraordinárias por ano“, o que ultrapassa largamente o limite anual de horas extraordinárias — 150 horas — e põe em causa a segurança dos doentes.

Por exemplo, um médico que tem um contrato de 40 horas semanais, tem de dedicar 12 horas ao serviço de urgência. Todas as horas em que estiver escalado no serviço de urgência além destas 12, são consideradas horas extraordinárias — estes médicos são, muitas vezes, escalados para fazer urgências de 24 horas ao fim de semana. Apesar de estas horas extraordinárias se referirem a todo o horário dos médicos, o serviço de urgência acaba por ser aquele onde estes especialistas fazem mais horas suplementares.

O facto de os especialistas de Medicina Interna se recusarem a fazer horas extras acaba por pôr em risco o serviço de Urgência do Garcia de Orta, uma vez que não existem internistas suficientes para completar a escala da urgência. As escalas estão dependentes das horas extraordinárias destes médicos, acrescentam as fontes do Garcia de Orta.

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Ao Observador, as fontes hospitalares explicam que além das horas extras, são-lhe atribuídas responsabilidades que entendem que não deveriam ter. Seja porque não existem elementos suficientes noutras especialidades, seja porque há especialidades que simplesmente não estão no serviço de urgência, estes especialistas acabam por ter de tomar decisões clínicas que não lhes cabem e para as quais entendem que não têm competências.

Isso tem acontecido, por exemplo, agora que a urgência pediátrica tem estado encerrada ao fim de semana. Uma das fontes hospitalares sublinhou que, também por causa desta situação, os médicos da urgência geral acabam por ter de tratar “doentes que chegam pelo próprio pé ao hospital” e que estejam demasiados instáveis para serem encaminhados para o Hospital da Estefânia ou para o Hospital de Santa Maria. E nestas situações, mesmo que optem por chamar o pediatra que está de urgência interna (escalado para acompanhar os doentes que estão internados na pediatria), acaba por ser o internista a lidar com a situação, porque o pediatra pode demorar muito tempo a chegar — pode estar ocupado com uma situação crítica no serviço de Pediatria, por exemplo.

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De acordo com as mesmas fontes, o Conselho de Administração do hospital ainda não reagiu à declaração de indisponibilidade destes médicos. No entanto, uma vez que esta tem efeito imediato, os internistas não deverão ser escalados para fazer horas extraordinárias na urgência já no próximo mês.

Esta posição dos internistas do hospital Garcia de Orta vem no seguimento do pedido de demissão de dez médicos internistas das suas funções de chefes de equipa da urgência em meados de setembro.

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A verdade é que, apesar da demissão, nada mudou. Estes internistas continuam a ter de exercer as suas funções de chefes de equipa, porque continuam a ser escalados para o serviço de urgência enquanto chefes de equipa, e se não comparecerem, têm uma falta injustificada. O Conselho de Administração tinha 30 dias ou para os substituir, ou para chegar a acordo com estes médicos, e nenhuma das duas coisas aconteceu, adiantaram ainda as mesmas fontes hospitalares.

O Observador tentou contactar o hospital Garcia de Orta sobre esta recusa dos internistas em fazer horas extras, mas não foi possível obter uma resposta até à hora da publicação deste artigo.

Ainda esta terça-feira, os chefes de equipa das urgências pediram ajuda à Ordem dos Médicos por não estarem a conseguir garantir a segurança dos doentes.

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