Um ano após a derrocada para o interior de duas pedreiras em Borba (Évora), a estrada 255 continua cortada ao meio, familiares e herdeiros dos cinco mortos foram indemnizados e o inquérito tem nove arguidos.

O alerta para o acidente chegou às autoridades às 15:45 de 19 de novembro de 2018, quando um troço de cerca de 100 metros da Estrada Municipal (EM) 255, entre Borba e Vila Viçosa, colapsou, com um grande volume de rochas, blocos de mármore e terra a deslizarem para dentro de duas pedreiras contíguas, uma em laboração e outra desativada.

O desastre causou a morte de dois operários da empresa de mármore, na pedreira ativa, quando o aluimento provocou “o deslocamento da retroescavadora” que operavam, e de três homens que seguiam em duas viaturas automóveis na estrada que ruiu e que caíram para o plano de água da pedreira desativada.

A busca e resgate de vítimas começou de imediato e envolveu operacionais de diversos agentes da Proteção Civil, tendo os trabalhos sido dados como terminados a 01 de dezembro.

No local, também estiveram engenheiros do Exército, Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e equipas da Marinha, com mergulhadores e um veículo submarino com controlo remoto, para detetar as viaturas submersas nas pedreiras, utilizado pela primeira vez num espaço tão confinado.

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Os 13 dias da operação, rodeada de complexidade e que a Proteção Civil chegou a qualificar como tendo “dimensão ciclópica”, foram sendo marcados pela retirada dos corpos.

Os primeiros foram os dos operários da pedreira. O de um homem, de 49 anos, residente em Bencatel (Vila Viçosa), um dia após o desabamento da estrada, e o do seu colega, de 58 anos, morador em Vila Viçosa, no dia 24.

Seguiram-se os dos ocupantes dos veículos automóveis. No dia 30, foram retirados os corpos dos dois cunhados que seguiam numa carrinha de caixa aberta, um de 37 e outro de 53 anos, naturais e residentes em Bencatel. A quinta vítima mortal, um homem, de 85 anos, natural e residente em Alandroal, foi resgatada na manhã do 13.ºdia de buscas.

A tragédia levou ao local o então secretário de Estado da Proteção Civil, José Artur Neves, o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, Jaime Marta Soares, a líder do CDS-PP, Assunção Cristas, e o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, primeiro numa “visita relâmpago” sem falar aos jornalistas e, depois, terminadas as buscas, a Vila Viçosa, para um encontro com familiares das vítimas mortais.

O Ministério Público (MP) instaurou um inquérito, ainda em curso, para apurar as circunstâncias da derrocada, dirigido pelo Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Évora, coadjuvado pela Polícia Judiciária (PJ).

Em comunicado recente, para fazer “o ponto de situação” do inquérito, “um ano decorrido” sobre a derrocada, o MP revelou que foram ouvidas 21 testemunhas e constituídos nove arguidos, um deles uma pessoa coletiva.

Para o encerramento do inquérito, em segredo de justiça e com declaração de “excecional complexidade”, decorrem diligências para obter “elementos de prova documental” e de “prova pessoal”.

Um ano depois, a EM255 continua cortada ao trânsito. O troço que ruiu permanece “esboroado” para o interior dos poços, onde se pode ver terra vermelha, pedras e blocos de mármore, assim como, na pedreira desativada, o fundo com água. O acesso, do lado de Borba e de Vila Viçosa, está interrompido e as câmaras não anunciaram qualquer intervenção para repor a via.

As empresas de mármores recorrem a uma estrada alternativa para aceder às pedreiras na zona e, para os automobilistas, a opção é a variante entre Borba e Vila Viçosa, que liga à A6, aberta ao trânsito há mais de 15 anos.

A Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) abriu um inquérito para apurar as condições de segurança e saúde dos trabalhadores da pedreira ativa, mas desconhecem-se as conclusões, e o Governo pediu uma inspeção urgente às pedreiras situadas na zona de Borba.

Em janeiro, no âmbito do “Plano de Intervenção nas Pedreiras em Situação Crítica”, elaborado a nível nacional, o Ministério do Ambiente revelou ter identificado em 13% das pedreiras dependentes do Estado central, ou seja, em 191 casos, “situações críticas”, 55 deles no Alentejo, e determinou a adoção de medidas, como sinalização, vedações e estudos de redução de riscos.

Nos dias a seguir ao acidente, empresários do setor alegaram que a Câmara de Borba conhecia os perigos da estrada, por as pedreiras estarem demasiado próximas, e que já tinham defendido o corte da via, mas o autarca António Anselmo negou.

Um ano depois do acidente, o que já está concluído é o mecanismo extrajudicial para pagamento das indemnizações aos familiares e herdeiros das vítimas, decidido em Conselho de Ministros extraordinário no final de 2018 e conduzido pela Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral

Os 19 familiares e herdeiros das cinco vítimas mortais foram indemnizados pelo Estado num montante global de cerca de 1,6 milhões de euros, cujas ordens de transferência foram concluídas no final de junho.