O governo de José Sócrates foi o vencedor da manhã de debate na sessão plenária do Parlamento Europeu, em Estrasburgo. A presidente da Comissão Europeia não só enalteceu a importância do Tratado de Lisboa — fechado durante a presidência portuguesa de 2007 — como elogiou a forma como Portugal “em 2005 começou a sua transição limpa e investiu de forma significativa desde então“. Para o governo de António Costa também sobrou um elogio, com Ursula Von der Leyen a registar que “em 2023, irá encerrar a sua última mina de carvão mineral” e que o país “já tem um superavit de energia renovável”. Von der Leyen mostrou conhecer bem a situação portuguesa, mas teve um lapso: disse que no ano passado “perderam a vida mais de 60 pessoas” em incêndios “florestais horrorosos”. Só em 2017 é que houve esse número e acabaram por ser mais elevados: mais de 100 mortos (juntando os 66 de Pedrógão com os mais de 50 dos incêndios de outubro).

No segundo debate da manhã, sobre as conclusões do Conselho Europeu (foi a estreia de Charles Michel no Parlamento Europeu), Úrsula Von der Leyen, deu prioridade ao debate das alterações climáticas e lembrou que todos os Estados-membros têm pontos de partida diferentes. E se falou na Polónia como o país que precisará mais do Fundo de Transição — porque tem regiões em que a atividade é centrada no carvão — falou de Portugal como um bom exemplo, que já tem muito trabalho feito.

A presidente da comissão europeia destacou que “Portugal é um dos países mais afetados pelas alterações climáticas: tem uma longa costa, tem furacões, cheias e fogos florestais horrorosos”. Depois do lapso sobre o ano e o número de mortos, vieram os elogios. Além de destacar que Portugal é superavitário nas renováveis destacou que o país, juntamente com o governo holandês, “está a trabalhar e a preparar a energia de hidrogénio verde”. Para Von der Leyen a “questão para Portugal é como transportar a sua energia renovável através de Espanha e de França para outros países onde esta energia é necessária”. Desta forma, “de uma perspetiva portuguesa, o Pacto Ecológico Europeu tem a ver com infraestruturas de energia, com as interligações e com a adaptação e um ajuste às alterações climáticas”.

O primeiro português a falar no debate sobre o último conselho europeu foi Pedro Silva Pereira, que fazia parte do governo que em 2005 começou a apostar nas energias renováveis. Mas preferiu dedicar a maior parte da sua intervenção ao Brexit, dizendo que as eleições no Reino Unido da última semana demonstram que “há agora uma maioria suficiente para aprovar o acordo de retirada e concluir o Brexit até ao final de janeiro”. Para Silva Pereira este é “um momento triste na história da Europa, mas é também uma escolha democrática que devemos respeitar”.

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Silva Pereira admite a importância de temas como a conferência sobre o futuro da Europa ou o Pacto Ecológico, mas avisa a presidente da comissão que em questões como as negociações do orçamento da UE ou a conclusão da União Bancária a União Europeia tem estado aquém do esperado.

Já Paulo Rangel manifestou a “alegria” que sentia “ao ver que a comissão assume a ideia da interconectividade energética, nomeadamente ligando Portugal e Espanha ao resto da Europa”. Rangel aplaude o facto dessa ligação ser uma prioridade para o Green Deal e destaca que esta “não é apenas questão ecológica nem apenas económica, é também uma questão geopolítica”, já que assim a UE pode depender menos da Rússia em termos energéticos.

A terceira portuguesa a falar foi Margarida Marques que aproveitou a primeira presença de Charles Michel no Parlamento Europeu para dizer que o último Conselho Europeu quase não dedicou tempo ao futuro orçamento da UE. Isto, lamenta, é uma “oportunidade perdida para os líderes europeus chegarem a acordo sobre um orçamento que é fundamental para a União Europeia”. E acrescenta: “Fica agora nas mãos do presidente Charles Michel fazer o que até aqui ainda não foi feito (…), o Parlamento está pronto para negociar sobre novembro do ano passado”.

Lisboa a “alma” da Europa

Antes do debate de análise do Conselho Europeu, houve um debate que assinalava os 10 anos de entrada em vigor do Tratado de Lisboa (a 1 de dezembro de 2009). Os portugueses não falaram, uma vez que a sessão foi apenas para os líderes de bancada, mas no encerramento do debate, Úrsula Von der Leyen deixou elogios ao tratado que tem o nome da capital portuguesa.

Embora o tratado esteja em vigor há 10 anos, foi assinado em Lisboa, durante a última presidência portuguesa, a 13 de dezembro de 2007. O anúncio foi feito pelo então presidente do Conselho, por inerência de ser primeiro-ministro português, José Sócrates e pelo presidente da comissão europeia, Durão Barroso. No final, ambos deram um abraço, enquanto Sócrates largou o famoso “porreiro, pá”.

Doze anos depois desse momento e dez anos depois da entrada em vigor, Ursula Von der Leyen recorda que nessa altura sentia-se que “algo faltava ao  projeto europeu”, uma vez que já não havia “cortina de ferro” a UE era um dado adquirido, mas “faltava uma alma”. Os juristas, lembra a antiga ministra da Defesa alemã, dirão que o “Tratado de Lisboa deu à Europa uma personalidade jurídica própria”, mas “deu também à Europa uma alma.”

Esta “lufada de ar fresco”, lembra Úrsula Von der Leyen coloca a União Europeia como “mais do que um mercado único”, mas também um projeto de verdadeira “união”. Apesar de ter enfrentado “ventos terríveis” nos últimos anos, Von der Leyen destaca que a UE mostrou ser como “um junco, que verga, mas não quebra”. Para a líder da comissão a UE “não é um obra acabada, é uma construção permanente” e que o Tratado de Lisboa ainda não está a ser utilizado a 100%.

E, se na altura se discutia, se a UE devia ter um hino ou uma bandeira, nos últimos anos “milhões de cidadãos europeus foram para a  rua com a bandeira azul com as doze estrelas” enquanto outros se comoveram a ouvir o hino da Alegria.