As primeiras medidas foram tomadas assim que uma menor de 16 anos e a sua mãe, professora de Geografia em Portimão, tiveram resultado positivo nas análises ao novo coronavírus — tornando-se os primeiros dois casos no sul do país. A Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes, onde a jovem estuda, foi encerrada e todos os restantes alunos, professores e funcionários devem ficar em isolamento durante 14 dias. A Escola Básica 2,3 Professor José Buísel, onde a mãe dava aulas, na mesma cidade algarvia, foi também fechada na manhã desta segunda-feira.

A partir daí, as restrições foram aumentando. A Câmara Municipal de Portimão decidiu fechar espaços culturais e desportivos de acesso público — acabando por levar o Portimonense a suspender todas as suas atividades, com a exceção da equipa principal de futebol.

As medidas são semelhantes às que foram tomadas no domingo em Lousada e Felgueiras. Nesses dois concelhos do Norte do país, no entanto, todas as escolas públicas e privadas foram encerradas — algo que, para já, não aconteceu em Portimão. Mantém-se aberta, por exemplo, a escola frequentada pelos dois irmãos da jovem infetada, que foram às aulas normalmente até sexta-feira. Ao Observador, a diretora da Escola Básica Júdice Fialho explicou que a escola não irá ser encerrada até ter algum caso confirmado. O mesmo acontecerá com outras escolas do concelho — o que já levou a protestos de vários encarregados de educação.

PEDRO GUERREIRO/OBSERVADOR

Espaços públicos de lazer vão ficar fechados

Depois da confirmação dos casos, a Câmara de Portimão, sob o conselho das autoridades de saúde municipais, decidiu “encerrar ao público todas as instalações desportivas e culturais sob a tutela da câmara municipal, até ao último dia de março [dia 31].” Na prática, confirmou ao Observador fonte da autarquia, estarão fechados:

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  • a piscina municipal;
  • o teatro municipal;
  • o museu;
  • a biblioteca;
  • o pavilhão gimnodesportivo;
  • e o Portimão Arena.

A mesma fonte explicou que “há aspetos que estão ainda por decidir, porque alguns destes equipamentos municipais não têm gestão direta da Câmara”. É o caso, por exemplo, do complexo desportivo de Alvor e dos campos de ténis. Era também o caso do estádio do Portimonense.

Portimonense suspende todas as atividades desportivas

O facto do estádio do Portimonense Sporting Clube, clube da principal Liga de Futebol, ter gestão privada obrigava a que fosse o próprio a tomar as medidas que entendesse serem necessárias, com base nas recomendações dadas pela autarquia e pelas autoridades de saúde. Entre essas medidas, poderia optar por quatro cenários: pedir para adiar os jogos como visitado; fazer os jogos à porta fechada; realizar esses jogos noutro estádio; ou assumir as responsabilidades e realizar os jogos, sempre mediante a aprovação da Liga de Clubes.

Ao início da noite da noite desta segunda-feira, o Portimonense Sporting Clube optou por parar quase tudo. Em comunicado, o clube fez saber que decidiu suspender temporariamente todas as suas atividades desportivas das várias secções, ainda que com uma excepção.

O Portimonense conta entre as suas largas centenas de atletas vários jovens e crianças que frequentam as escolas da cidade entretanto encerradas, pelo que, sem alarmismos desnecessários mas convictos das nossas responsabilidades, esta é, nesta altura, a decisão que melhor protege os nossos jovens, contribuindo em simultâneo para combater a propagação do vírus.”

Esta suspensão temporária não abrange, no entanto, a equipa principal de futebol, equipa que participa na principal Liga. O Observador sabe, porém, que a administração da SAD do clube portimonense esteve esta tarde reunida com a Liga Portuguesa de Futebol Profissional, num encontro que poderá ter servido também para discutir o que fazer a breve e a médio prazo com os seus jogos.

Ao início da noite, as novas medidas anunciadas pelo Governo, nomeadamente a suspensão ou adiamento de todos os eventos com mais de 5.000 pessoas em espaços abertos, colocou em questão a próxima jornada, existindo um de dois cenários possíveis: a realização de todos os jogos à porta fechada (incluindo o Portimonense-Gil Vicente) ou o adiamento da jornada.

Duas escolas fechadas, todas as outras abertas — para já

Quanto ao encerramento de mais escolas na cidade, esse cenário não está em cima da mesa “para já”. “A nossa lógica, neste momento, é: um caso positivo numa escola e essa escola fecha; caso contrário, e até indicações em contrário, não haverá mais escolas encerradas”, explica fonte da autarquia.

A posição não agrada, no entanto, aos pais de vários alunos. Encarregados de educação de uma outra escola, a Secundária Poeta António Aleixo, em Portimão, criaram um abaixo-assinado para encerrar o estabelecimento de ensino, por precaução. Este abaixo-assinado é dirigido à Direção-Geral de Saúde e conta já com 725 assinaturas.

Certo é que também a Escola Básica Júdice Fialho, frequentada pelos dois irmãos da jovem infetada, vai continuar aberta, pelo menos para já. “Não vamos encerrar a escola, não que eu não queira, mas estamos à espera de uma resposta da Autoridade de Saúde Pública para saber o que fazer daqui em diante. Não estou autorizada a fechar a escola”, conta ao Observador a diretora do estabelecimento de ensino, Paula Teixeira.

Os dois alunos, que estão no 9.º ano, entraram esta segunda-feira em quarentena, depois dos resultados positivos da irmã e da mãe. Mas, até ao momento, nem professores, nem funcionários nem os alunos das suas turmas vão ser submetidos a testes do coronavírus ou têm indicação para ficarem isolados. Isto porque nenhum dos dois menores tem qualquer sintoma. A diretora da escola explica isso mesmo: “Só a partir do momento em que eles apresentarem sintomas é que nós teremos, digo eu, de fazer também os testes”.

Assim, até ao momento, ficarão encerradas apenas a Secundária Manuel Teixeira Gomes e a Escola Básica 2,3 Professor José Buísel, deixando 1.800 alunos sem aulas.

Ruas vazias, centros comerciais cheios, espetáculos em dúvida

Há, ainda assim, duas comunidades escolares a quem foi indicado o isolamento em casa. Mas alguns relatos fazem duvidar de que isso esteja a ser feito, dizendo que as pessoas que deveriam estar em isolamento não deixam de ir aos centros comerciais da cidade. “Portimão está às moscas. As ruas estão desertas, o sentimento de quem anda nas ruas é de desconfiança e incerteza do que se está a passar. Ninguém nos diz o que fazer ou o que não fazer”, conta um desses habitantes da cidade, que garante, porém, que “o centro comercial está repleto de jovens que deveriam estar em casa em isolamento”. “Os alunos das escolas que estão fechadas deveriam estar em casa, mas não estão, estão nos centros comerciais e nas praias”, assegura.

Carlos Pacheco, encenador e diretor do Teatro Boa Esperança em Portimão, diz ao Observador que recebeu todas as indicações da câmara municipal de que iriam ser fechados vários espaços públicos, mas que, até ao momento, não recebeu ordem para encerrar o teatro ou adiar os espetáculos da Revista à Portuguesa, que estreia a 14 de março. “Não vou cancelar dia 14 a estreia, não vou cancelar nada. Só irei cancelar se a delegada de saúde assim o exigir”, conta ao Observador. Trata-se de um espetáculo de referência no Algarve, com décadas de tradição, que esgota salas em todos os dias de espetáculo.

“Os telefonemas a perguntar se vamos cancelar espetáculos estão a chegar”, desabafa o encenador, explicando que já está a tomar medidas para minimizar as probabilidades de ter de encerrar o teatro: “Já comprámos desinfetante, iremos arejar ainda mais a sala e irei sensibilizar o público para não se cumprimentarem na sala e eu próprio não irei, durante ao espetáculo, ao público, como está ensaiado, para evitar o contacto físico”, explica Carlos Pacheco. O encenador adianta ainda que, se tiver de cancelar espetáculos, os prejuízos, “assim por alto”, “devem rondar os 10 mil euros”.

Caso da mãe e filha contaminadas pelo novo coronavírus

Todas estas medidas — ou dúvidas quanto ao que fazer — surgiram depois de os dois primeiros casos de coronavírus no Algarve terem sido confirmados. Depois do alerta, a menor de 16 anos foi enviada no domingo, 8 de março, para o Hospital Pediátrico Dona Estefânia, em Lisboa, onde se encontra internada. A sua mãe, professora, está agora no Hospital Curry Cabral, também na capital.

Também o marido e os outros dois filhos do casal estão sob vigilância permanente da Saúde 24, não apresentando até ao momento qualquer sintoma da doença. Os dois adolescentes, gémeos, estão em casa de um familiar, em isolamento. O pai não foi trabalhar na semana passada e também está em quarentena.

A professora dá aulas de Geografia na Escola Básica 2,3 Professor José Buísel e, depois de ter regressado de umas mini-férias de Carnaval em Itália com a filha e restante família — incluindo a irmã, que também está em isolamento —, não foi dar aulas, mas deslocou-se à escola onde trabalha para ter reuniões com outros docentes.

A direção da escola em questão esteve reunida na manhã de segunda-feira com as autoridades de saúde municipais, para tentarem perceber com quem é que esta docente teve contacto nesses dias, sabe o Observador.

O Agrupamento de Escolas Manuel Teixeira Gomes (AEMTG), escola onde a aluna estuda, em comunicado publicado este domingo, explicava à comunidade escolar que a estudante esteve de férias em Itália no período do Carnaval. Quando regressou, a aluna ligou à Linha Saúde 24, “que lhe deu instruções para monitorizar a sua situação clínica e cumprir algumas regras sociais e de higiene pessoal, mas que podia fazer a sua vida normal”. Desta forma, a aluna regressou à escola a 27 de fevereiro “e foi acompanhada diariamente pela equipa da SNS24”.

A Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes em Portimão estará encerrada até dia 20 de março. PEDRO GUERREIRO/OBSERVADOR

Nos dias 5, 6 e 7 de março, o Portimão Arena recebeu o Start Work, um evento dedicado ao emprego, empreendedorismo, educação e formação profissional, com a participação de vários alunos de praticamente todas as escolas do concelho de Portimão — entre elas, alunos da Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes. O Observador sabe que este evento teve especial atenção nas várias reuniões que a autarquia teve sobre os casos positivos de coronavírus na cidade, mas uma fonte garante ao Observador que nem a aluna nem a professora — ou qualquer outro membro da família em isolamento—  estiveram presentes.

Pessoas que contactaram com o caso de Portimão devem manter “distância social”

Ainda antes de ser confirmado também o caso da mãe e professora, a delegada de saúde pública de Portimão apelava às pessoas que estiveram em contacto com a menor que adotassem medidas de “distanciamento social” para evitar a propagação do vírus. “Pelo menos até 20 de março, toda a comunidade escolar deve monitorizar eventuais sintomas, adotando comportamentos de higienização e distanciamento social”, explicava no domingo a delegada de saúde pública Maria Filomena Agostinho, sublinhando que quem teve “contacto próximo” com a aluna “receberá dos serviços [Linha SNS24] uma indicação direta”.

Aquela responsável, que falava aos jornalistas após uma reunião no Centro Municipal de Proteção Civil e Operações de Socorro de Portimão, sublinhava que a Direção-Geral da Saúde (DGS) iria monitorizar a situação durante o período de encerramento da escola frequentada pela aluna, que vigoraria a partir de segunda-feira.

A reunião, convocada de emergência após a confirmação do caso, o primeiro a ser reportado no sul do país, juntou autoridades de Saúde, Proteção Civil, a direção da Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes e diretores de turma. Questionada acerca do estado de saúde do resto da família da aluna, a delegada de saúde pública de Portimão adiantava que “ainda aguardam os resultados [aos testes de despiste do novo coronavírus]”, mas que estavam “todos bem”. Só depois viria a confirmar-se a infeção também da mãe da menor, professora na Escola Básica 2,3 Professor José Buísel.