O mundo inteiro parece já ter acordado para a ameaça da pandemia do novo coronavírus, porém, tal como a aldeia gaulesa de Astérix, Obélix e companhia, ainda há um último reduto negacionista — a Bielorússia. Pelo menos naquilo que depender de Alexander Lukashenko, o presidente deste ex-pedaço da extinta URSS, que diz que a Covid-19 não é nada de grave e sucumbiria facilmente perante uma inusitada trilogia sugerida por este governante: vodka, sauna e um trator.

Depois de Boris Johnson e Donald Trump terem acordado para o perigo causado por esta infeção, Lukashenko tornou-se no último descrente do Covid-19, de tal forma que ainda permite o normal funcionamento da liga nacional de futebol, por exemplo. Ao contrário de todas as ligas europeias, a bielorrussa acaba de começar, apesar do protesto de alguns jogadores como Darko Bodul, avançado austríaco do Shajtior.

Na ausência de outras competições, portanto, o futebol bielorrusso está a tornar-se sinónimo de entusiasmo entre os apaixonados por futebol de países vizinhos como a Rússia ou Cazaquistão, locais que recebem a transmissão destas partidas. No último sábado, por exemplo, foram disputados seis jogos da competição, um deles o dérbi entre o FC Minsk e Dynamo Minsk, que reuniu pelo menos 3 mil espetadores no estádio.

À semelhança do futebol, explica o La Vanguardia, também o hóquei no gelo continua a cumprir o seu calendário normal. A liga da Bielorrússia está na sua fase final e as duas principais, a Yunost da cidade capital Minsk, e a Shajtior, de Soligorsk, já disputaram pelo menos dois jogos do playoff da luta pelo título.

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A Bielorrússia tem uma população de 9,5 milhões de habitantes e regista ainda um número relativamente baixo de infetados com Covid-19 quando comparada com outros países europeus (regista quase 100 casos). Segundo o Ministério da Saúde nacional, todos eles ou apresentam sintomatologia leve ou são completamente assintomáticos.

Surpresa é aquilo que Lukashenko mais sente ao olhar à sua volta, para os outros lideres europeus. Até chegou a protestar quando a Rússia decidiu fechar as fronteiras.  “Nesta vida tudo é possível, mas o importante é não entrar em pânico ”, disse o líder da Bielorrússia a 24 de março. “O que mais temo é que as pessoas comecem a ficar psicóticas à conta do que se vê nos media”.

Há uma semana, precisamente, o presidente ordenou ao KGB (instituição igual à que existia nos tempos soviéticos) que investigasse os média e os sites que estão a “entrar em pânico” e aconselhou toda a gente a proteger-se do coronavírus com um copo de vodka, sauna e trabalho no campo com um trator. Nas visitas diárias que este responsável e as suas equipas fazem a fábricas ou empresas em diferentes regiões do país, ninguém usa qualquer tipo de proteção.

Lukashenko chegou a dizer que jogar hóquei protege contra o vírus. “É melhor morrer de pé do que viver de joelhos! Não há vírus no gelo. Isto é uma frigorífico. Eu vivo a mesma vida que sempre vivi, ainda ontem tive uma sessão de treino com a minha equipa. Encontramo-nos, apertamos as mãos, abraçamo-nos, batemos uns nos outros…”, chegou a dizer.

Há uma coisa a que Lukashenko é definitivamente imune: às críticas. “Ele está a gozar com todo o planeta!”, disse Vladimir Zhirinovski, líder do Partido Liberal-Democrata da Rússia. O presidente honorário da União Russa de Futebol, Viacheslav Koloskov, também já classificou a sua atitude perante a pandemia como “pornografia e disparates”.

Entretanto, tudo vai seguindo o seu ritmo normal, tanto na agenda do líder como naquela que o próprio define para o país. Os grandes eventos, com participação de muitas pessoas, continuam a decorrer. A Semana da Floresta, por exemplo, também está prestes a começar: É uma campanha para atualizar o registo florestal onde no ano passado, veja-se, participaram 52 mil pessoas. O exército também mantém as suas manobras, incluindo aquelas que preveem a mobilização de mais de três mil soldados.

Felizmente, apesar da displicência do seu governante, o país está ciente do que está a acontecer. As universidades, por exemplo, preferiram manter o ano letivo para evitar que os alunos regressassem a casa, na província, e com isso contaminassem os mais velhos. Em Minsk, muitas pessoas andam de máscara na rua e muitos bielorrussos estão a  optar por ficar mais em casa. Um exemplo de que a indiferença, ao contrário do vírus, não é contagiosa.