Envolto numa temporada para lá de negativa e com insucesso do futebol profissional a marcar o dia-a-dia do clube, o Desp. Aves atravessou este fim de semana um ato eleitoral e uma mudança de liderança. António Freitas, que já tinha sido presidente do clube entre 1998 e 2001, voltou a ser eleito para a presidência dos avenses, sucedendo a Armando Silva — que estava na liderança há dez anos e não se recandidatou. Ou seja, este fim de semana, o Desp. Aves sofreu um corte com a cúpula institucional que liderava o clube há dez épocas, que chegou à histórica conquista da Taça de Portugal em 2017 e que leva três anos seguidos na Primeira Liga.
Tudo isto na antecâmara de uma semana e de uma jornada que pode tornar-se negativamente decisiva para o Desp. Aves. Numa altura em que é a única equipa da Liga que ainda não marcou nesta retoma, em que leva nove jogos seguidos sem ganhar e em que está afundada no último lugar com menos dez pontos do que o penúltimo, a equipa de Nuno Manta Santos pode ver confirmada a despromoção à Segunda Liga já esta semana. As contas eram simples: em caso de vitória com o Moreirense, a descida seria novamente adiada; em caso de empate, a descida só acontecia se o Marítimo ganhasse ao Benfica e o Tondela pontuasse com o Belenenses SAD; em caso de derrota, bastava então que os madeirenses vencessem os encarnados para que a despromoção ficasse garantida já esta segunda-feira.
Aves. O clube da vila é “made in China” (mas não só: há também português com “açúcar”)
O Desp. Aves recebia então o Moreirense, uma equipa que está tranquilamente a meio da tabela, e Nuno Manta Santos tinha mostrado na antevisão que continua a ser o elemento mais realista da Vila das Aves. Na conferência de imprensa, o treinador voltou a reconhecer que a despromoção será praticamente impossível de evitar mas deixou a única coisa que exige para as últimas jornadas: dignidade. “Estamos com a cabeça no cepo há muito tempo. Sabemos que está muito difícil o Desp. Aves manter-se, em termos matemáticos e pelo contexto do clube, mas temos de ter dignidade até ao fim para lutar pelos três pontos em todos os jogos. Nesta região sente-se muito este dérbi e queremos dar uma alegria aos nossos adeptos”, explicou o treinador, que pediu “uma resposta completamente diferente da do último jogo”, em que os avenses perderam com o Gil Vicente por 3-0.
Numa primeira parte quase sem balizas — e muito afetada, em ritmo e intensidade, pelo imenso calor que se fazia sentir na Vila das Aves às cinco da tarde –, o jogo foi muito discutido na zona do meio-campo. O Moreirense criou uma boa oportunidade logo nos primeiros instantes, num lance que acabaria anulado por mão de Filipe Soares mas onde Diakhité tirou um golo em cima da linha, mas raramente voltou a aproximar-se realmente da baliza de Fábio; o Desp. Aves mostrava sempre alguma relutância em avançar, com receio de destapar o equilíbrio nas costas, mas no nos últimos minutos do primeiro tempo esteve regularmente à volta da grande área adversária. Rúben Macedo, na ala esquerda do ataque avense, era o principal criativo da equipa de Nuno Manta Santos e o grande inconformado, puxando sempre o jogo para aquele corredor e procurando cruzamentos tensos para a área em busca de Varela e Pedro Soares.
Na segunda parte, a lógica manteve-se: o Desp. Aves continuava a insistir no corredor esquerdo e Rúben Macedo continuava a procurar criar lances de perigo. A qualidade individual, porém, acabou por ser decisiva na hora de desbloquear o resultado. Numa jogada que os elementos de Nuno Manta Santos nunca conseguiram construir, João Aurélio avançou com a bola controlada e tirou da manga um passe perfeito para Fábio Abreu, que ficou isolado na cara do guarda-redes e não falhou (52′). 12.º golo do avançado angolano na Liga, segundo jogo consecutivo a marcar e aquele que poderá ter sido, quase de certeza, o último fôlego do Desp. Aves na Primeira Liga.
Os avenses acusaram por completo o golo sofrido e não souberam reagir, oferecendo a iniciativa ao Moreirense e passando grande parte da segunda parte a recorrer unicamente a passes longos e diretos, num apelo algo desesperado por uma verticalidade que acabava por não ter objetivos práticos. O Desp. Aves chegou ao 10.º jogo sem ganhar, ao sexto sem marcar e aos mais de 500 minutos sem marcar um único golo. Fica agora à espera de saber o que fazem Marítimo e Tondela para descobrir se confirma a descida já esta semana ou só na próxima: mas já sabe que, com mais ou menos dignidade, está à beira de realizar os últimos jogos na Primeira Liga durante algum tempo.