O encerramento das escolas foi “determinante” para a “quebra abrupta da incidência” de novos casos, defende Carlos Antunes, investigador e professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Em entrevista ao Polígrafo, na SIC Notícias, o investigador diz que a evolução dos números da pandemia tem sido “muito positiva” e foi reforçada “passados oito dias do fecho das escolas”.

“Conseguimos em 14 dias reduzir os casos para metade. Países que conseguiram isso foram França, a Bélgica (8 dias). A Áustria demorou 22 dias na última vaga”, exemplifica. A decisão de fechar o ensino presencial foi, assim, “determinante para acelerar processo de queda”. Isso é visível “em todas as faixas etárias”.

Por exemplo, a 22 de janeiro (cerca de uma semana após o fecho das escolas), a incidência acumulada a sete dias, no grupo dos seis aos 12 anos, estava a aumentar em 6% ao dia. Até 6 de fevereiro, começou a diminuir e os grupos dos seis aos 12 e dos 13 aos 17 são agora os que “mais diminuem a incidência acumulada dentro do próprio grupo”. Carlos Antunes considera, por isso, que as escolas deviam ter fechado mais cedo. “Não tenho dúvida que da análise da incidência, o fecho das escolas foi determinante e que agimos tarde demais.”

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Para que o desconfinamento possa agora acontecer é preciso uma conjugação de fatores: que a incidência esteja abaixo dos 2.000 casos, o índice de transmissão (o chamado RT) fique “bem abaixo de 1.0” e que a taxa de positividade seja menor de 5%.

Quanto ao primeiro indicador, o país está neste momento com “5.100, 5.200 contágios”, mas Carlos Antunes acredita que “é provável chegarmos ao fim de fevereiro abaixo dos 3.000 contágios, próximos dos 2.000”. Só que a variante do Reino Unido e o chamado “efeito de saturação” podem dificultar esta trajetória. O “efeito de saturação” deve-se ao facto de, apesar do confinamento, 30% dos contágios continuarem a ocorrer e não poderem ser evitados, “mesmo prolongando o confinamento”. A isso acresce a “fadiga pandémica”, que faz a população “baixar a guarda”.

Já o RT ronda os 0,82, “mas sabemos que indicia o tal efeito de saturação e vai começar agora a subir — desde que permaneça abaixo de 1 está controlado”. E a positividade, que deveria estar abaixo dos 5%, está em cerca de 14%.

Ao Público, Carlos Antunes acrescenta que é preciso também ter em conta os números de internamentos e de doentes em cuidados intensivos, que seguem uma “dinâmica diferente”. Por exemplo, a redução do número de pacientes em UCI entre o pico da segunda vaga, a 21/22 de novembro, e o Natal foi “mínima” (de 530 para 490). “Portanto, se esta redução também for mínima, daqui a um mês nós vamos ter um grande problema”.

Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, também refere ao jornal que os números de internados, de doentes em UCI e da mortalidade ainda podem demorar “algum tempo” até diminuírem.

Início do desconfinamento? Só em março e de forma gradual

Na SIC Notícias, Carlos Antunes disse ainda que os modelos não permitem fazer projeções a longo prazo, pelo que não consegue dizer se uma nova vaga pode estar a caminho. Aponta o início do desconfinamento para o “início de março”, mas de forma “gradual”. Primeiro devem reabrir os ciclos escolares mais novos e, “medindo esse desconfinamento”, pode começar a pensar-se noutros ciclos, afirma.

O investigador defende o aumento da testagem, mas de forma ativa, como na Dinamarca, e não reativa como em Portugal. “A Dinamarca, quando se apercebe que há uma maior prevalência aumenta a testagem.” O país “tem metade da nossa população e faz quatro vezes mais testes”. Já em Portugal, há um sistema “passivo”, em que o número de testes aumenta à medida que o número de infetados também sobe e é preciso rastrear contactos. “Aumentarmos significativamente a testagem pode ser uma alternativa ao papel que o desconfinamento está a ter.”

Carlos Antunes também considera que é cedo para falar na Páscoa, mas diz que, por essa altura, já gostaria de ver o “efeito da vacina”.

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