O relatório da comissão parlamentar de Economia e Obras Públicas considera que a candidata apontada pelo Governo para a administração da Anacom, regulador das comunicações, “não reúne as condições para o exercício do cargo que se encontra indigitada”.

A conclusão surge na sequência da audição parlamentar de Patrícia Alexandra Correia da Silva Gonçalves realizada em julho. Apesar de reconhecer que a candidata apresenta “um currículo sólido a nível académico” e experiência profissional, o relatório da autoria do deputado do PSD, Paulo Moniz, assinala a existência de uma dependência hierárquica durante vários anos face a dois dos cinco membros da administração da Anacom, o que não dá garantias de independência.

A votação do relatório estava agendada para esta quarta-feira, mas foi adiada a pedido do PCP cujo voto  poderia ser decisivo. Segundo informação recolhida pelo Observador, o PSD e o Bloco de Esquerda iriam aprovar a recomendação do relatório no sentido da não nomeação. O Parlamento tem de dar parecer após audição das personalidades propostas para os reguladores, mas o Governo não é obrigado a seguir as recomendações feitas.

A personalidade apontada pelo Governo é técnica consultora na UTAO -Unidade Técnica de Apoio Orçamental, na Assembleia da República, tendo antes exercido funções de regulação e supervisão no Banco de Portugal, local de origem do presidente da Anacom, João Cadete de Matos, e de aconselhamento ao governador.

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” Verificou-se através da avaliação do currículo e confirmação durante a audição, que a candidata indigitada exerceu funções profissionais em 9 dos últimos 12 anos em dependência hierárquica directa de 2 dos 5 membros que compõem o Conselho de administração da ANACOM, os quais desempenham presentemente as funções de Presidente e Vice-Presidente daquela entidade reguladora”.

E mesmo considerando que a indigitada não regista impedimento ou incompatibilidade para o exercício de funções, o relatório refere que os factos “muito objetivos” da relação hierárquica passada entre Patrícia Silva Gonçalves e os atuais administradores do regulador “não permitem presumir e dar inequívoca garantia, da imprescindível e total independência no exercício das funções em apreço”.

A Cresap (comissão de recrutamento do Estado) qualificou a candidata de adequada, destacando “evidências da presença de competências técnicas e comportamentais que sustentam uma apreciação muito positiva para o desempenho do cargo em causa”. No entanto, também indicava a inexistência de formação académica ou experiência profissional nas áreas das telecomunicações e concorrência. Para o deputado relator, esta falta “tem alguma relevância pelo facto de a vogal cessante que visa substituir ter um longo percurso profissional na área das comunicações e telecomunicações, desde logo como quadro do ICP-Instituto das Comunicações de Portugal, que deu posteriormente origem à ANACOM.”

Apesar de reconhecer que a candidata estava bem preparada para a audição, “verificando-se um conhecimento e sintonia significativa com as posições públicas deste regulador”, o relatório assinala o contexto de grande conflitualidade entre o regulador e os regulados (sobretudo por causa do leilão do 5G).

“Num momento de particular litigância entre regulador e operadores que é aliás do conhecimento geral, e ainda que na suposição de que se possa encontrar ultrapassado um diferendo recente entre regulador e governo e que foi tornado público por este último, esperar-se-ia a indigitação de um candidato com um outro perfil nomeadamente de conhecimento ou experiência profissional no sector regulado ou formação específica na área da concorrência, e que pudesse constituir-se como elemento desbloqueador entre partes”.