A moção setorial “Em defesa da liberdade” dominou quase na totalidade o debate no primeiro dia da VI Convenção da Iniciativa Liberal. Com apenas uma moção estratégica que norteará a direção do partido nos próximos anos, o debate foi monopolizado pela “moção 1”, que partiu a IL. No púlpito alternavam os acérrimos defensores e os que eram totalmente contra a moção. As restrições impostas para tentar controlar a pandemia e a resistência de grande parte dos membros que subiram ao púlpito foram a faísca necessária à ignição de um debate sobre liberdade — individual e coletiva.
Mariana Mendes Nina Silvestre é a primeira subscritora da moção intitulada “Em defesa da liberdade”, que conta também com o apoio e defesa de Catarina Maia, da comissão executiva, na proposta mais polémica da Convenção e a segunda moção com mais subscritores.
Inevitável foi ver a discussão sobre a moção transformar-se numa espécie de afirmação ideológica do partido em torno da liberdade. Além dos membros do partido, o documento divide a própria comissão executiva. Catarina Maia é uma das subscritoras — e foi uma das vozes mais fortes a tomar da palavra –, mas a maioria da direção está contra a moção.
“O meio da estrada é um sítio perigoso. Somos atropelados dos dois lados. Se lerem cuidadosamente a moção 1 verão que o que é pedido é a definição de conceitos”, dizia Catarina Maia já na reta final, numa espécie de última hipótese de defesa da proposta submetida a referendo nesta Convenção. Como membro da comissão executiva, ainda atirou que não vê “grandes contradições no que é o fundamento da própria ação da comissão executiva”.
Na intervenção final, Catarina Maia respondia a outro membro da comissão executiva — Vicente Ferreira da Silva — que momentos antes tinha subido ao púlpito para apelar precisamente ao “voto contra a moção 1” e explicava os motivos para o apelo. “É preciso explicitar claramente porque defendemos valores como a liberdade e responsabilidade, a transparência e clareza não é um valor inferior que não possa ser defendido por nós”, disse. “Não somos contra o poder, somos contra os abusos de poder e a ausência de poder. A ausência de poder é a lei do mais forte e a lei do mais forte pode ser feita por um indivíduo contra outro”, alertava o membro da comissão executiva que mereceu a resposta final de Catarina Maia. E atirou, virando-se para trás na direção de Vicente Ferreira da Silva, que abanava a cabeça em sinal de discordância: “Vicente, estás errado. Se fosse qualquer outra pessoa, diria que é desonestidade intelectual. Só posso aceitar que tenhas lido mal a moção”.
Do “pânico moral” ao certificado “discriminatório”
O texto da moção sugere que a IL está a “desiludir profundamente” os liberais quando “compactua sem protesto com limitações impostas pelo poder político à liberdade individual a pretexto de um qualquer pânico moral”, sendo que os subscritores se referem a questões como “emergência climática”, o “discurso do ódio” e a pandemia.
À boleia da moção que considera o certificado de vacinação “discriminatório”, Carlos Melo deu o exemplo de um dos filhos: “O meu filho iria numa viagem de estudo. É um jovem adolescente, não vai poder ir porque o Estado determinou que não tinha condições sanitárias para o fazer”. Apelando à aprovação da moção 1, Carlos Melo disse que espera da IL “a defesa intransigente da liberdade, sem tibiezas”.
Sobre o texto da moção que diz que o certificado “serve apenas o medo, a dúvida, a ignorância e a insegurança”, Cotrim Figueiredo disse em entrevista ao Observador, na sexta-feira, ainda antes de a moção ter tomado conta da Convenção, que não concorda com os termos usados e que sempre se mostrou favorável à vacinação da população.
“Com 6% têm de olhar para nós como um partido que tem de estar no Governo”
Os princípios que têm lugar na moção e que foram colocados em causa são, em grande medida, referências ao estado pandémico, desde logo “o direito ao trabalho e ao sustento, impedindo-se que se encerrem empresas e se ponham em causa postos de trabalho, sem que quem impôs estas medidas sofra idêntico prejuízo”; mas também “o direito a recusar um ato médico (…) sem qualquer tipo de sanção ou discriminação” e a “capacidade de aceder e frequentar, livre de restrições, todos os espaços e transportes públicos e qualquer espaço comercial de natureza privada”.
No final da enumeração dos vários pontos, o próprio texto alerta: “Correndo o risco de sermos injuriados e [chamados de] egoístas, de não-anti-racistas, de negacionistas, de objetivistas, de conservadores, de tudo e de mais alguma coisa, é isto, em suma o que nós esperamos da Iniciativa Liberal: que defenda com unhas e dentes, contra tudo e contra todos, a vida, a liberdade e a busca pela felicidade de cada indivíduo.”
Catarina Maia ficou responsável por responder a todas as críticas ouvidas durante o dia e defendeu-se: “Não vejo grandes contradições no que é o fundamento da própria ação para a comissão executiva. Diria que há na IL membros que podem achar que este é um apelo à anarquia, não é. A lei pode ser usada para fins muito repressivos. As liberdades individuais não têm que ser restringidas”. A moção foi largamente rejeitada pelos convencionistas este domingo conquistando apenas 87 votos a favor contra os 418 liberais que votaram contra. Houve ainda 107 abstenções entre os liberais.
Artigo atualizado às 10h45 com o resultado da votação da moção, que foi chumbada