Sete minutos e 44 segundos, um desarme de lançamento na primeira ação como cartão de visita, um total de cinco ressaltos, uma assistência de artista, duas tentativas de visar o cesto sem sucesso (uma depois de um ressalto). Das Adidas Harden 5 que usou à forma quase tímida com que entrou no campo de cabeça baixa antes de se posicionar no garrafão, nenhum pormenor passou ao lado do histórico momento em que Neemias Queta se tornou o primeiro português a jogar na NBA, entrando ainda na primeira parte do jogo em casa dos Sacramento Kings frente aos Memphis Grizzlies e jogando mais na parte final. O resultado não foi o melhor (124-105) mas, numa ótica meramente nacional, o grande objetivo estava cumprido.

Dream Big, Neemias, Dream Big: jogador tornou-se o primeiro português de sempre a jogar na NBA

“É uma grande conquista só estar em campo, ter entrado e ter oportunidade de jogar. Há muito tempo que sonhava com este dia, desde que comecei a praticar basquetebol. Estou muito contente por ter acontecido hoje [madrugada de sexta para sábado em Lisboa]. Sinto que o nosso técnico torna o meu trabalho mais fácil. O Doug [Christie] é um treinador que se baseia nos fundamentos e deixa os jogadores fazerem o que têm de fazer. Esse é um tipo de treinador com os quais posso evoluir e ter oportunidades”, comentou no final da partida o poste português, que mereceu rasgado elogios do adjunto de Alvin Gentry (também ele isolamento, como vários jogadores, após o surto de Covid-19 que afetou os Kings).

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“Sou grande fã desde que vi este miúdo no training camp. Creio que o Monte [McNair, diretor geral da equipa] e o Wes [Wilcox, vice diretor geral] fizeram um grande trabalho ao garanti-lo. Acredito que pode ser muito bom. É fácil ver o potencial. Faz bem passes, não tem medo, protege a tabela, bloqueia lançamentos… Foi o timing perfeito ver o que vale aqui”, salientou Doug Christie após o encontro. “Estou contente por ele. Conversámos sobre isso antes do jogo, o quanto isto significava para ele, ter essa oportunidade de fazer história. Ele é uma lenda para o seu país e é muito bom que isto tenha acontecido com ele”, acrescentou ainda o atirador Tyrese Haliburton, uma das referências da equipa.

Este domingo, Neemias Queta voltava a ter oportunidade para somar mais minutos na NBA, algo que a certa altura parecia estar em risco perante a recuperação de Richaun Holmes que não se confirmou. Assim, e num dia onde a organização confirmou mais uma série de encontros cancelados nos próximos três dias (cinco, todos por surtos de Covid-19 que afetam não só algumas equipas mas também as suas filiais na G-League, o que impede depois a apresentação de pelo menos oito elementos efetivos), os Sacramento Kings voltavam a contar apenas com três postes entre Tristan Thompson, Damian Jones e o português, a que se juntava o extremo/poste Chimezie Metu, na tentativa de regresso aos triunfos frente a uns San Antonio Spurs muito longe daquilo que as equipas de Gregg Popovich conseguem fazer na NBA.

Depois de um início de jogo equilibrado e com vantagens de uma posse de bola, os Kings conseguiram um parcial de 11-0 para oito pontos de avanço (18-10) com Buddy Hield, Tyrese Haliburton e Harrison Barnes em destaque com muito tiro exterior à mistura. A 4.25 minutos do final do primeiro período surgiu mesmo a primeira diferença de dois dígitos do jogo (25-15), que levou Gregg Popovich a pedir de imediato um desconto de tempo, mas a recuperação dos Spurs acabou por ser “dizimada” com a grande entrada de Damian Jones, que acabou o primeiro quarto como melhor marcador (nove pontos) antes de mais um triplo em cima da buzina para fechar o período inicial com uma vantagem de dez pontos (37-27).

Tyrese Haliburton, que além de ser o primeiro a chegar aos dez pontos levava já sete assistências só nos 12 minutos iniciais, era a principal referência de uma equipa dos Kings que partia na teoria como outsider pelos resultados recentes e pelas muitas baixas mas que dava uma grande resposta em campo, a mesma que tentou com os Memphis Grizzlies antes de cair na segunda parte perante a maior valia do adversário. E a. tónica do início da partida manteve-se no segundo período, com essa particularidade de Neemias não ter entrado também pelos jogos muito consistentes de Chimezie Metu (nove pontos, cinco ressaltos e quatro roubos), Tristan Thompson (oito pontos e seis ressaltos) e sobretudo Damian Jones (14 pontos e três ressaltos). Os Kings chegavam ao intervalo na frente por sete e com 63 pontos marcados numa parte.

As coisas estavam a correr bem aos Kings. Em alguns momentos e para alguns jogadores, se calhar até demasiado bem. E os Spurs fizeram questão de mostrar isso mesmo, passando para a frente do marcador em menos de cinco minutos (69-67) com um parcial de 13-4 que voltou a equilibrar os pratos da balança e a abrir por completo o encontro ao ponto de Tyrese Haliburton ter ficado em campo mesmo com quatro faltas, sinal de que era o momento em que Doug Christie sentia que o jogo podia escapar. No entanto, até mesmo com a principal referência no tiro exterior de fora durante quatro minutos os Kings voltaram a encontrar-se no jogo, continuaram a ter um Damian Jones on fire até com triplos e entraram no quarto e último período com seis pontos de avanço (19-85) e um Buddy Hield a assumir mais no ataque.

Num sinal também importante em termos de equipa, Neemias ia aplaudindo de pé essa nova fase positiva dos Kings que se prolongou no arranque dos últimos 12 minutos que permitiram a formação da casa passar de novo para uma vantagem de dois dígitos (98-87). Não sendo decisivo, esse avanço permitiu que Jones “comemorasse” a monstruosa exibição que deu recorde de carreira e que a dupla Haliburton-Hield abrisse o livro de uma forma esmagadora, com uma série de ataques concretizados e lançamentos exteriores a caírem para uma vantagem máxima de 15 pontos que arrumou com o encontro (118-103) para o regresso dos Kings às vitórias com os números finais de 121-114. Só faltaram mesmo os minutos de Neemias, aqueles que tinham sido prometidos a todos mas que o português e Woodward não chegaram a ter…