Dois lados opostos do espetro político sentaram-se à mesa no penúltimo dia de debates e concentraram-se em discutir, principalmente, visões para o país. Os soundbites (ainda que poucos) marcam a história do frente a frente entra Catarina Martins e Francisco Rodrigues dos Santos, que deixaram que o Pai Natal se juntasse à conversa, em que houve acusações de radicalismo e um fantasma: André Ventura.
O minuto final usado por Francisco Rodrigues dos Santos foi o único momento em que entrou em modo ‘Chicão dos debates’ e Catarina Martins até estava à espera dessa atitude há mais tempo. O líder democrata-cristão trouxe para a mesa a proposta da liberalização das drogas leves ao sugerir que “o BE faz campanha com crianças de dez anos com t-shirts da canábis”. A reação de Catarina Martins foi imediata: “Está a fazer de André Ventura, agora?”
Rodrigues dos Santos garantia que não se tratava de usar a estratégia do líder do Chega em debate, mas ficaria “sem resposta” propositadamente, com Catarina Martins a referir-se ao adversário como “dr. Rodrigues dos Santos” pela uma única vez no debate e já depois de o ter comparado com Ventura. O que, tendo em conta o debate entre os dois líderes da direita, não é um elogio para Rodrigues dos Santos.
A “direita fanática” disse ‘mata’ e a “direita mariquinhas” respondeu ‘esfola’
Depois desse debate em que o líder do CDS-PP defrontou o presidente do Chega é difícil imaginar um ambiente mais hostil. Ainda assim, Catarina Martins e Francisco Rodrigues dos Santos conseguiram a proeza de manter uma discussão serena, em que foi possível ouvir uma troca de argumentos essencialmente na área da economia. Nas contas da coordenadora bloquista o plano de “desprivatizações” do Bloco de Esquerda (que incluiria EDP, CTT e REN) custaria 20 mil milhões.
Ainda antes da intervenção do adversário, atira-se contra PSD e PS para dar conta que o “jogo de bloco central assalta o país” e festeja vendas como a EDP a “beber champanhe com o comité central do partido comunista chinês”.
Francisco Rodrigues dos Santos estava preparado para a estratégia de colar a ideia de radicalização ao Bloco de Esquerda e tentou desconstruir a ideia de que o programa do partido “é radical” e “vai matar a economia com overdose de nacionalizações e criação de impostos”. E foi mais longe (até ao fundador do Bloco de Esquerda): “Ouvi Catarina Martins dizer que estava em linha com o Papa Francisco, está em linha com o Papa Francisco… mas é o Papa Francisco Louçã porque este programa é a reencarnação política de Francisco Louçã.”
As justificações do líder do CDS-PP estavam longe de agradar a Catarina Martins e, sobre os transportes públicos que os democratas-cristãos propõem privatizar, assegurou que a baixa de preços dos passes não teria sido possível se houvesse uma privatização. Foi o momento para atacar: “Há uma certa direita que acredita no Pai Natal.”
Da TAP aos impostos e à lei da nacionalidade, tudo entre Bloco e CDS foram posições extremadas. Catarina Martins acusou o CDS de querer “convencer quem tem menos” de que os vai ajudar reduzindo os impostos, Rodrigues dos Santos defendia-se dizendo que Portugal precisa de um “choque fiscal” e que os bloquistas só têm para oferecer um programa que é uma “fábrica de impostos”. E enquanto a coordenadora do BE considera que vender a TAP seria “deitar dinheiro ao lixo”, Rodrigues dos Santos insistiu que os “três mil milhões de euros fazem muita falta à economia real, às empresas e às famílias”.
Diálogo revelador
Francisco Rodrigues dos Santos (FRS): Há uma medida que nos separa radicalmente. O Bloco de Esquerda faz campanha com crianças de dez anos com t-shirts da canábis a favor da liberalização das drogas…
Catarina Martins (CM) : Está a fazer de André Ventura, agora?
FRS: Não estou a fazer de André Ventura, só lhe quero dizer isto: no programa do Bloco de Esquerda está a criação nacional de uma espécie de um guia Michelin de casas de chuto para todos os toxicodependentes. Eu encaro os toxicodependentes como pessoas doentes que precisam de ser ajudadas e acho fundamental que não apliquemos proposta política que visa criar uma grande irresponsabilidade, dificuldade para as famílias e uma escalada de consumo.
CM: Em relação às acusações registo apenas que o dr. Rodrigues dos Santos depois de debates e debates a usar o Bloco de Esquerda por mais variadas questões, comigo não levantou nenhuma dessas questões, aproveitou agora o minuto final. Não vou responder, é uma tática André Ventura.