Em grande parte de 2021, o regime do teletrabalho foi obrigatório para muitos trabalhadores devido à pandemia da Covid-19. Mas apesar disso, houve poucos contratos coletivos a abordar o tema: das 208 convenções publicadas nesse ano, apenas seis (2,8% do total) regulavam o teletrabalho — ainda assim, o dobro do ano anterior.

O relatório anual sobre a evolução da negociação coletiva em 2021, divulgado esta quinta-feira pelo Centro de Relações Laborais (CRL), conclui que apesar de o teletrabalho ter sido obrigatório, ou recomendado, em vários períodos de 2021, “a sua regulação em convenção continua a ser pouco frequente“.

“Embora recentemente a aplicação do trabalho à distância tenha assistido a uma expansão significativa, por imposição do legislador e em virtude da crise pandémica, a sua regulação em convenção continua a ser pouco frequente”, lê-se no sumário executivo do relatório, a que o Observador teve acesso.

Em 2021, foram publicadas 208 convenções (número que não inclui acordos de adesão), mais 23% face a 2020, depois de uma quebra de 30% nesse ano. Essas convenções regulam, essencialmente, a regulamentação das condições salariais e outras prestações pecuniárias, assim como o regime de vigência, o âmbito geográfico da convenção e as categorias profissionais.

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Já o teletrabalho é um dos “conteúdos menos encontrados”. Ainda assim, duplicou o número de convenções a versar sobre o tema face ao ano anterior, para seis (quatro acordos de empresa e dois contratos coletivos). “Há uma predominância do setor da banca e dos seguros. Este é por excelência o setor em que este tema vem tratado”, indicou Cláudia Madaleno, professora de Direito da Universidade de Lisboa, uma das autoras do estudo, durante a apresentação, esta quinta-feira.

São também menos frequentes temas como os meios de vigilância eletrónica, o tempo de trabalho e direito à desconexão, bem como o trabalho intermitente e o horário concentrado. Aliás, em relação ao direito à desconexão, o CRL encontrou cinco convenções a regular o tema. “De um modo geral, temos esta preocupação com as ferramentas digitais que são dadas aos trabalhador” para “não prejudicar o seu descanso”, acrescentou a responsável.

Na administração pública foram publicados menos acordos coletivos (52, um aumento de 8,3%), mas são mais os que abordam o teletrabalho: sete — segundo Cláudia Madaleno, todos em autarquias locais.

A lei que regula o teletrabalho, assim como o direito de abstenção do contacto do empregador fora de horas, só entrou em vigor em janeiro deste ano, mas 2021 foi já marcado por várias medidas de obrigatoriedade ou recomendação do regime de teletrabalho. O mesmo no primeiro ano da pandemia, 2020, onde apenas três convenções coletivas regularam o regime.

O relatório revela ainda que, em 2021, mais de meio milhão de pessoas (540.886) estiveram abrangidas por convenções coletivas , um crescimento de 36% face a 2020. O relatório sublinha, no entanto, que esse valor ainda está “longe dos resultados de anos anteriores”. Já o salário médio das convenções coletivas subiu, em média, 4% e, em termos reais, de 3,7%, “a mais alta do período entre 2010-2021”.

Há convenções que vão além dos 22 dias de férias

O relatório conclui ainda que há 22 convenções que definem períodos de férias superiores ao mínimo que a lei prevê (22 dias) sem qualquer condição: em três contratos estão previstos 23 dias de férias, num contrato 24 dias e em 18 estão 25 dias de férias. Há outras convenções que preveem mais dias de férias, mas com condições, como a assiduidade ou antiguidade.

Para o secretário de Estado do Trabalho, Miguel Fontes, as convenções coletivas, podendo incluir condições de trabalho mais favoráveis do que a lei, podem ser um instrumento para responder à falta de trabalhadores qualificados.

“Temos todos de nos habituar que a lei é só a lei. Acima da lei tudo é possível desde que haja o aprofundamento desse diálogo social”, defendeu. “Não há nenhuma razão para que se não for vontade das partes, e for possível“, em vez dos 22 dias de férias, este período não seja majorado. “As organizações hoje também competem por talento”, frisou. As empresas devem conseguir soluções “mais criativas”para fixar os trabalhadores, nomeadamente no que toca ao teletrabalho, acrescentou.

Em 2021, a regulação do período de férias constou em 36% das convenções. “Há várias modalidades dentro da matriz habitual. Cumpre assinalar o papel da negociação coletiva num conjunto de majorações atribuídas para além dos 22 dias úteis de férias concedidos pela lei”, lê-se no relatório.

Artigo atualizado com declarações do secretário de Estado do Trabalho