Houve duas coisas que o primeiro-ministro deixou passar nas declarações que fez esta terça-feira sobre a demissão da ministra Marta Temido: a governante estava no limite e terá posto uma “linha vermelha” para continuar no Governo. Entre as explicações seletivas que foi dando aos jornalistas, António Costa quis soltar, a dada altura, que esta não era a primeira vez que Temido vacilava na pasta, apresentando razões para sair do Governo. “Não me sentia em condições de não respeitar e aceitar o pedido desta vez”.

Em que outras vezes a ministra fez o mesmo pedido? Costa não quis responder. Durante as declarações disse apenas que Marta Temido apresentou razões que “desta vez” considerou atendíveis, afirmando perceber que “alguém estabeleça como linha vermelha a existência de falecimentos que decorrem em serviços que estão sob a sua tutela”. Deixou, assim a ideia, que a ministra que, no início da crise nas urgência na obstetrícia tinha já enfrentado a morte de um bebé nas Caldas da Rainha, em junho, já tivesse querido sair do Governo no passado. Esta segunda-feira foi noticiada, pela CNN Portugal, a morte de uma grávida no Hospital São Francisco Xavier e Costa admite que o caso “tenha sido a gota de água” para a ministra.

“Ser membro do Governo é muito exigente e há pastas onde é particularmente desgastante, do ponto de vista pessoal e emocional, o exercício dessas funções”. Sobretudo, disse Costa, “para quem foi ministro da Saúde” em pandemia.

Ainda assim, nas explicações que deu esta tarde, o primeiro-ministro garantiu que não estava à espera desta decisão de Temido agora e que precisa de tempo para encontrar alguém que a substitua nas funções. Mas neste compasso de espera pesam ainda outras razões, que explicou detalhadamente. A primeira é que vai estar fora do país, numa visita oficial a Moçambique para onde parte esta noite e de onde regressa no próximo sábado. A segunda são os trabalhos finais para a preparação do pacote de medidas de apoio ao rendimento das famílias que será aprovado no Conselho de Ministros extraordinário da próxima segunda-feira.

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Além disso, António Costa quer que ainda seja Marta Temido a finalizar a regulamentação da nova direção executiva do SNS, que diz ser “uma das peças fundamentais” da reforma na área— e aqui até lembrou que o próprio Presidente da República pediu que não fosse perdido tempo na implementação.”É melhor concluir este trabalho que está em curso e depois, naturalmente, seguirmos a nossa vida.” Admitiu, no entanto, que isso possa acontecer antes de 15 de setembro — data para que estava prevista a aprovação em Conselho de Ministros — tendo em conta a situação que envolve a ainda ministra.

Mas o líder do Governo diz que a condição demissionária de Temido não contamina a reforma pela qual dará a cara já depois de ter dito que quer sair do Executivo. “Os diplomas são do Governo e não do político A ou B”, disse Costa quando foi questionado pelos jornalistas sobre a fragilidade política da ministra nesta fase. E ainda atirou à oposição: “Quem quer mudanças de política tem que derrubar o Governo”.

Sobre a sucessão, jura ainda não ter pensado no assunto. A horas de embarcar para Moçambique e entre reuniões setoriais para ultimar o pacote de medidas que apresentará na semana que vem, Costa nem quer falar do perfil. E quando lhe pergunta que perfil de ministro pretende, atira apenas que na equação de quem poderá ser “não se deve ser limitativo quanto ao género”. “Logo se verá”, diz atirando a questão para “momento oportuno”.