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O dia 4 de março ficou marcado na memória de Oleksii Lytvyn. O aluno, de 13 anos, lembra-se bem do momento em que as forças russas bombardearam, por duas vezes, a sua escola, na localidade de Mykhailo-Kotsyubynske, região de Chernihiv. Estava refugiado com a família e dezenas de outras pessoas num abrigo. Dentro da normalidade possível, brincava com um amigo quando, minutos depois, uma explosão barulhenta fez tremer as paredes. Foi a última noite ali e no dia seguinte partiam. Regressam meses depois, quando quatro milhões de crianças voltam às aulas na Ucrânia.

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A localidade esteve ocupada pelas forças russas durante quase um mês. O ataque à escola, que deixou uma grande abertura na lateral do edifício, provocou a morte de uma funcionária. “Estávamos a dormir no corredor e havia um corpo do outro lado da parede”, recordou o estudante à Associated Press (AP). Voltou ao local com a turma do sétimo ano, mas só para receber os livros deste ano e instruções sobre como usar o abrigo. Por agora, as aulas não vão ser presenciais.

A cerca de 35 quilómetros da fronteira com a Bielorrússia, na localidade de Mykhailo-Kotsyubynske as aulas começam no formato online. Por motivos de segurança, este foi o método escolhido pelas instituições onde não existem abrigos ou que se situam perto de zonas de guerra ativas.

“Isto está a acontecer pela primeira vez”, destaca a professora Olena Serdiuk. “Eu quero dar o máximo possível às crianças, porque a guerra roubou-lhes muito“, explica, sublinhando a importância de que recebem uma educação.

É como aprender a nadar e ser atirado para o mar. Nada-se porque temos de sobreviver.”

Se em algumas regiões regressar às escolas não é possível, noutras os alunos são acolhidos por uma receção diferente dos anos anteriores. Num bairro em Irpin, a norte de Kiev, o dia começou com um exercício de evacuação. Ao som de um alarme de incêndio, as crianças alinharam-se para seguir para um abrigo ou para as áreas marcadas como mais seguras. Veronika, de seis anos, está entre eles.

Os pais da menina ponderaram a educação à distância, mas acabaram por decidir que era essencial a aprendizagem em sala de aula, estar em contacto com as outras crianças e com os professores.”Ela fica preocupada quando eu estou preocupada. Por isso é que estou a tentar ficar calma”, explica a mãe, Oleksandra Urban.

“Acredito que a escola vai salvar a vida da minha filha”, disse em entrevista à AP.

A escola de número 17 Irpin foi atingida por um míssil nos primeiros dias da invasão russa. Agora, os ataques em Kiev e nas zonas próximas são mais raros. A preocupação está presente, mas o estabelecimento de ensino foi arranjado e agora já tem um abrigo.

A realidade não é a mesma por toda a Ucrânia. Entre creches, escolas e universidades, apenas 41% têm abrigos anti-bomba ou outras estruturas de proteção, refere a Reuters. No final de agosto, uma avaliação do governo a cerca de 80% de todos os estabelecimentos de ensino revelou uma situação díspar em várias regiões. Se em Lviv, Chernivtsi ou Kiev, uma grande parte das escolas estão equipadas com estes espaços – 83%, 78% e 68% respetivamente – em Mykolaiv, Poltava ou Dnipro os números são bem diferentes, com as percentagens de 16%, 20% e 22%.

Além da falta destas estruturas, muitos edifícios educacionais foram alvos de bombardeamentos. Dados do Ministério da Educação e da Ciência da Ucrânia mostram que, desde 24 de fevereiro, 270 foram destruídos e 2.135 foram danificados.

Quanto às escolas em territórios ocupados pelas forças russas, pouco se sabe sobre como se vai processar o ano escolar. O Presidente russo, Vladimir Putin, ordenou o pagamento de 10.000 rublos, cerca de 167 euros, aos pais de crianças inscritas em escolas controladas pela Rússia nas regiões da Ucrânia dominadas por forças russas ou pró-Moscovo. O primeiro-ministro russo, Mikhail Mishustin, foi instruído aacoordenar com as administrações militares e civis dessas regiões o pagamento único do montante aos pais de crianças entre os 6 e os 18 anos “se começarem até 15 de setembro a estudar em instituições de ensino localizadas nestes territórios”.

Putin dá apoio económico a crianças inscritas em escolas controladas por russos na Ucrânia

No entanto, do Ocidente chegam alertas de que as famílias estão a ser forçadas a levar os seus filhos à escola, onde poderão ser “reprogramados” pelos professores trazidos pela Rússia. Uma investigação do The Washington Post, em julho, revela que Moscovo esteve a recrutar docentes russos para vários destinos, incluindo as regiões separatistas de Lugansk, Donetsk, Zaporíjia e Kherson. A estratégia, segundo o jornal norte-americano, teve bons resultados e teve pelo menos 250 inscrições.

Rússia recruta professores para territórios ocupados na Ucrânia

O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Oleh Nikolenko, disse recentemente que a Rússia está a “usar a educação como uma ferramenta de opressão”, notícia o Kyiv Independent. Nikolenko acusa a Rússia de estar a deixar uma ameaça às famílias em territórios ocupados: colocar os seus filhos em orfanatos caso estes não se inscrevam nas escolas, apelando a uma intervenção da Organização das Nações Unidas.