O diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações (OIM), o português António Vitorino, subscreve a proposta de um acordo global ente a Europa e África, que proteja a migração legal e puna os criminosos.

“Sou totalmente favorável a uma cooperação mais estreita e estável entre a União Europeia e os países africanos, incluindo, evidentemente, as instituições da União Africana (UA)”, afirmou António Vitorino, em entrevista à Agência Lusa, à margem da 36.ª Cimeira de chefes de Estado e de Governo da UA, que terminou domingo, em Adis Abeba.

Esta cooperação “requer a construção de confiança mútua e, ao mesmo tempo, a procura de soluções que impeçam a migração irregular e lutem contra as redes criminosas responsáveis pela morte de pessoas, particularmente na rota do Mediterrâneo central e na rota do Mediterrâneo ocidental”, afirmou António Vitorino.

Em contrapartida, há a “necessidade de encontrar as soluções para uma migração segura, ordenada e regular”, porque “existem carências de mão-de-obra na Europa” e “África pode ser um continente de origem de pessoas para preencher essas lacunas”.

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Mas para diminuir a procura da emigração em África é necessário “abordar as causas profundas da migração e isso exigirá investimentos no desenvolvimento económico dos países de origem”, considerou o diretor-geral da OIM, que tenta um novo mandato em junho deste ano.

Nessa estratégia, “os europeus têm estado na vanguarda dos investimentos para o desenvolvimento económico em África, em benefício das populações e não apenas dos potenciais migrantes”, uma opção “extremamente relevante para regular a pressão migratória” sobre a Europa.

“Investir em África é uma das formas de criar condições para as pessoas permanecerem e não serem forçadas a migrar”, disse Vitorino, recordando que o continente é próximo da Europa e pode acolher algumas indústrias a deslocalizar, diminuindo custos logísticos.

“A pandemia também perturbou os mecanismos da cadeia de abastecimento existentes no mundo e por isso penso que existem enormes oportunidades para a zona africana de comércio livre beneficiar desta remodelação da cadeia de abastecimento a nível mundial”, afirmou.

OIM disponível para ajudar África a construir zona de comércio livre

António Vitorino propôs, aliás, mecanismos que permitam às diásporas africanas investir no desenvolvimento do continente. “O potencial da diáspora é enorme, desde que seja estruturado, organizado com garantias de segurança do investimento, mas pode ser um contributo essencial para o desenvolvimento do continente”, afirmou.

“Nós consideramos que há uma oportunidade de mobilizar as diásporas africanas no mundo inteiro para mais ativamente contribuírem e investirem no desenvolvimento dos seus países de origem”, acrescentou

O responsável recordou que “750 mil milhões de dólares [mais de 700 mil milhões de euros] é o valor anual das remessas à escala global e que isso representa mais do que o investimento direto estrangeiro e a ajuda ao desenvolvimento juntos”.

Por outro lado, a sua presença na cimeira visou também acompanhar a criação da zona de livre-comércio continental.

A União Africana tem um projeto muito ambicioso de criação de uma zona de comércio livre no continente e, para esse efeito, há necessidade de proporcionar mobilidade humana”, explicou António Vitorino.
“Não se pode separar o comércio da mobilidade humana da migração”, recordou, salientando que essa foi também uma “lição da pandemia”. Então, “o mundo parou e havia um custo económico a pagar porque as pessoas não se podiam deslocar”.

Muitas vezes nós esquecemos que 70% dos imigrantes africanos vão de um país africano para outro país africano, apenas 16% dos emigrantes africanos se dirigem para a Europa, o que significa que é um enorme potencial dentro do continente africano em termos de mobilidade humana e de migrações intra-africanas para contribuir para o desenvolvimento da área de comércio livre”.
António Vitorino concorre à reeleição no cargo e mostrou-se confiante no apoio dos países africanos. “A OIM nestes quatro anos em que eu tive a liderança da organização fez um enorme investimento no continente africano” e África é “claramente a prioridade” de gestão.

E fizemo-lo não porque isso correspondesse a uma agenda da OIM, mas porque isso correspondia às necessidades das pessoas, particularmente dos refugiados e dos deslocados internos, seja por razões de conflito, seja por razões das alterações climáticas, que estão cada vez mais na base da mobilidade humana em África”, explicou.

Quanto à sua candidatura, António Vitorino não quis comentar declarações de apoio, limitando-se a dizer: “Estou confiante de que o bom trabalho é sempre reconhecido”.