Inspetores da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) encontraram partículas de urânio enriquecidas até 83,7% na instalação nuclear subterrânea de Fordo, no Irão, refere um relatório consultado esta terça-feira pela agência Associated Press (AP).

O relatório trimestral confidencial da AIEA, agência nuclear da ONU com sede em Viena, refere que durante uma inspeção a 22 de janeiro de 2023 foi detetada a presença de urânio a 83,7%, um nível que, como refere a AFP, é próximo dos 90% necessários para produzir uma bomba atómica. A proximidade a esse nível significa que qualquer reserva deste material pode ser usada rapidamente para produzir uma bomba atómica.

O documento já foi entregue aos Estados-membros da organização, o que pode renovar as tensões entre o Irão e o Ocidente sobre o programa nuclear iraniano.

O documento da AIEA apenas faz menção a partículas, sugerindo que o Irão não está a construir uma reserva de urânio enriquecido acima de 60%, o nível que tem vindo a enriquecer há já algum tempo.

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Um porta-voz do programa nuclear civil do Irão, Behrouz Kamalvandi, tentou na semana passada associar qualquer deteção de partículas de urânio enriquecidas a esse nível como um efeito colateral momentâneo da tentativa de alcançar um produto acabado com 60% de pureza. No entanto, especialistas dizem que uma variação tão grande na pureza, mesmo a nível atómico, pareceu suspeita aos inspetores.

O acordo nuclear do Irão de 2015 limitou o enriquecimento de urânio de Teerão a 3,67% — o suficiente para abastecer uma central nuclear. A retirada unilateral dos EUA do acordo, em 2018, desencadeou uma série de escaladas de tensões com Teerão sobre o seu programa.

O Irão tem produzido urânio enriquecido com 60% de pureza, um nível para o qual os especialistas em não-proliferação dizem que Teerão não tem uso civil.

Embora o diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, tenha alertado que o Irão tem agora urânio suficiente para produzir “várias” bombas nucleares, provavelmente levaria mais meses para construir uma arma e reduzir o seu tamanho para a colocar num míssil.

Rafael Grossi é esperado no Irão nos “próximos dias” para “criar a base para uma maior cooperação e um horizonte mais claro entre o Irão e a AIEA”, anunciou esta terça-feira um porta-voz da Organização Iraniana de Energia Atómica (OIEA), entidade que convidou o diplomata argentino.

Os serviços de informação dos EUA mantiveram, até ao passado fim de semana, a sua posição de que o Irão não está a tentar construir uma bomba atómica. Esta posição pode, no entanto, não ser suficiente para satisfazer Israel, inimigo regional do Irão.

O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, que lidera o governo de coligação mais à direita na história de Israel, já ameaçou ações militares contra Teerão.

Também o ministro dos Negócios Estrangeiros da Alemanha sublinhou esta terça-feira que, quer os alemães, quer os israelitas, estão preocupados com as alegações de que o Irão tem urânio enriquecido a 84%.

Em Berlim, o chefe da diplomacia israelita, Eli Cohen, apontou duas opções para lidar com o Irão, como o uso do chamado mecanismo “snapback” na resolução do Conselho de Segurança que consagrou o acordo nuclear de 2015, para reimpor as sanções da ONU e “ter uma opção militar credível sobre a mesa também.”

Desde a retirada unilateral dos Estados Unidos, em 2018, do acordo de 2015 entre as grandes potências e o Irão para limitar as atividades nucleares em troca do levantamento das sanções internacionais, a República Islâmica, que tem sempre negado pretender adquirir ou produzir uma bomba atómica, tem posto gradualmente cobro aos compromissos exigidos pelo pacto.

As negociações para retomar o acordo, que recomeçaram em abril de 2021, pararam na sequência das crescentes tensões entre o Irão e as principais potências ocidentais.

O relatório trimestral confidencial da AIEA, agência nuclear da ONU com sede em Viena, que foi entregue aos Estados-membros, pode renovar as tensões entre o Irão e o Ocidente sobre o programa nuclear iraniano, dado que o urânio a 84% está quase nos níveis de 90% para armas nucleares, o que significa que qualquer reserva deste material pode ser usada rapidamente para produzir uma bomba atómica.