O Novo Banco está a renegociar cerca de 5.500 créditos à habitação, num universo próximo dos 175.000, segundo o presidente do banco, Mark Bourke, que considerou que “não representa um aumento absurdo” face ao habitual.

Em relação ao crédito à habitação, temos cerca de 5.500 contratos a serem renegociados, o que em si não representa um número anormalmente alto num caderno com 175.000 contratos”, disse Bourke em entrevista à Lusa após a apresentação dos resultados em que anunciou lucros de 560,8 milhões de euros.

Na opinião do presidente do conselho executivo da instituição, se se analisar a taxa de contratos em renegociação, esta está em cerca do dobro de um período normal, o que “não representa um aumento absurdo”.

Para o responsável do Novo Banco, as atuais taxas de juro, que têm aumentado regularmente desde 2021, estão num território de “normalização”.

Do ponto de vista geral, de modo abrangente, o território em que estamos é da normalização das taxas de juro, e se ficar nestes níveis, então isso seria um resultado muito razoável”, defendeu.

Por outro lado, se aumentar de forma significativa, então poder-se-ão ver consequências em todos os bancos na Europa.

Bourke fez um balanço positivo da atividade recente do Novo Banco, assinalando que a instituição se tem mostrado lucrativa nos últimos oito trimestres.

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Agora estamos saudáveis, estamos sustentáveis, e podemos competir e fortalecer num terreno equilibrado”, congratulou-se o presidente do conselho executivo, que assumiu funções em meados do ano passado, em substituição de António Ramalho.

Pela primeira vez, somos um banco normal e totalmente capitalizado. Temos sido lucrativos desde há um tempo para cá”, vincou.

Para o futuro, o presidente do banco estima que, com o fim do período de reestruturação, em dezembro de 2022, o Novo Banco passe a ser “mestre do seu destino enquanto banco”.

Podemos investir em portefólios, podemos expandir os nossos negócios, podemos controlar o nosso capital como entendermos”, disse, sublinhando que era algo que a administração sabia que iria acontecer, mas que julgava que “iria demorar muito mais tempo”.

A carteira de títulos do Novo Banco, que constitui a principal fonte de ativos elegíveis para operações de financiamento junto do Banco Central Europeu (BCE), representava 10.864 milhões de euros no final de 2022, mais 3,8% em termos homólogos.

Deste total, a dívida pública portuguesa na carteira de títulos do Novo Banco representava 9,16%, contra 29,19% no final de 2021.

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Esta quebra relativa de 67,5% face a 2021, para 995 milhões de euros, foi algo que o presidente do banco considerou ser uma manobra para alcançar um portefólio diversificado.

Se recuarmos 10 anos, a maioria tinha enormes participações em dívida soberana, pelo que o sistema bancário enfrentava esta ligação que causou alguns problemas”, constatou Mark Bourke.

“Precisamos de ter um portefólio diversificado. Isso não significa que não participemos, deixemos de comprar ou ser um agente da dívida pública portuguesa”, garantiu.

Questionado sobre a diminuição do número de agências do Novo Banco em Portugal, Bourke remeteu para o foco “que está sempre nos custos”, algo que, defendeu, “ser necessário se se quer ser sustentável a longo prazo“.

Mas agora completamos o nosso programa de reestruturação. Reduzimos em cerca de 4.000 [o número de trabalhadores], mas agora creio que é algo relativamente estável”, afiançou o gestor.

No final de 2022, o Novo Banco tinha 4.090 colaboradores, menos 103 do que os 4.193 que tinha em final de 2021. Já o número de balcões era de 292 em dezembro passado, menos 19 do que em dezembro de 2021. Em 2022, o Novo Banco vendeu o seu edifício-sede em Lisboa, tendo dito Mark Bourke que o objetivo é os serviços centrais irem para o Tagus Park, em Oeiras, em meados de 2024.

Novo Banco não está em processo de venda

O presidente do Novo Banco garantiu ainda que este “não está em processo de venda” atualmente e que o objetivo da sua gestão é reforçar o banco, antevendo como “muito viável” uma operação de abertura de capital em bolsa.

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O responsável citou uma declaração recente do maior acionista, a Lone Star, em que recusou ter iniciado contactos para vender a sua posição, e que não pretende iniciar este ano, isto após notícias em Espanha de que a Lone Star estava a sondar os grandes bancos do país para vender o Novo Banco com uma avaliação de cerca de dois mil milhões de euros.

Os jornais espanhóis começaram a falar sobre uma avaliação e conversações. A Lone Star fez então uma declaração a dizer que não havia qualquer processo”, vincou Bourke à Lusa, repetindo a declaração do acionista.

Já quanto a ser o Novo Banco o comprador, o gestor irlandês disse que o “mais provável é que venha a comprar atividades ou portfolios” que sejam complementares ao seu negócio – como de pagamentos, gestão de ativos, ‘apps’ – “do que a comprar bancos”.

Contudo, admitiu, como é costume no setor financeiro, que olharão sempre para eventuais oportunidades. “Não há muitos bancos. Mas há oportunidades que surgem e olhamos para todas as oportunidades que surgem”, disse.

Para Bourke, a “opção melhor e mais viável” para o Novo Banco passa por avançar para a abertura de capital em bolsa, ainda que essa decisão pertença aos acionistas, pelo que para isso quer fortalecer o banco.

Não temos um processo de IPO [sigla em inglês para Oferta Pública Inicial] em curso, mas vemos como uma opção muito viável”, adiantou.

A conclusão do processo de reestruturação do Novo Banco faz com que se comece cada vez mais a falar de consolidação de bancos em Portugal. Por um lado, era conhecido que a Lone Star ficou com o Novo Banco para o tornar rentável e vender, ganhando aí dinheiro. Por outro lado, no setor também se fala que outros bancos poderão ter acionistas menos fortes e que poderá agora ser a Lone Star a ter iniciativa.

Em final de fevereiro, os responsáveis do BCP voltaram a repetir que este se mantém focado em crescer de forma orgânica, apenas pelo seu negócio, mas que obviamente terão de olhar para o Novo Banco se este for posto à venda.

Em dezembro, em entrevista ao Jornal de Negócios, o governador do Banco de Portugal (BdP), Mário Centeno, considerou que uma fusão entre o Novo Banco e o BCP seria benéfica, mas sublinhando que estava apenas a “ser pedagógico em relação ao mercado e à forma como” vê a banca pois qualquer frase do banco central pode “mover o mercado” e esse não é o seu papel.

Do lado da Caixa Geral de Depósitos, o presidente executivo, Paulo Macedo, disse já este mês que o banco público está focado em devolver capital ao Estado, mas também admitiu que possa vir a fazer aquisições, sejam grandes ou pequenas.

Já em janeiro, em audição no parlamento, Paulo Macedo tinha dito que, com a CGD reforçada, “não aconteceria um banco estrangeiro comprar o Banif e o Banco Popular por um euro”.

O Novo Banco foi criado em agosto de 2014, aquando da resolução do Banco Espírito Santo (BES). De momento, é detido em 75% pelo fundo de investimento norte-americano Lone Star, sendo o restante capital detido pelo Fundo de Resolução bancário (entidade da esfera pública) e diretamente pelo Estado português.

Novo Banco vai pôr na Justiça decisão do fisco de lhe agravar IMI

À Lusa, Bourke revelou também que o Novo Banco vai litigar na Justiça contra a decisão da Autoridade Tributária de lhe agravar o IMI por ter na sua estrutura acionista entidades sediadas em ‘offshore’, disse o presidente executivo.

O Orçamento do Estado de 2021 agravou o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) de empresas que tenham na sua estrutura acionista entidades sediadas em territórios com regime fiscal mais favorável (os chamados paraísos fiscais ou ‘offshore’), tendo então o auditor do Novo Banco considerado que o banco é abrangido pela lei.

Assim, em 2021, o Novo Banco fez uma provisão de 116 milhões de euros para este agravamento fiscal e pediu esclarecimentos à Autoridade Tributária para saber o que tem de pagar. Já as contas de 2022, esta quinta-feira conhecidas, incluem uma provisão de 57 milhões de euros para o mesmo fim.

O presidente executivo do Novo Banco disse que o fisco respondeu recentemente e que o entendimento é que o Novo Banco é abrangido pelo agravamento do imposto pelo que irão contestar. “Iremos efetivamente contestar e levar a tribunal”, disse Mark Bourke. Ainda assim, o banco assume o pior cenário possível pelo que já fez a provisão.

Com o Orçamento do Estado para 2021, o Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis (IMI) prevê no número 4 do seu artigo 112.º uma taxa agravada de imposto (que atualmente é de 7,5%) sobre os imóveis detidos por sujeitos passivos que “tenham domicílio fiscal em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças”.

Esta taxa de 7,5% compara com a taxa ‘geral’ do IMI sobre os prédios urbanos e terrenos para construção e que está balizada entre os 0,3% e 0,45%, cabendo aos municípios onde os imóveis estão localizados definir, dentro deste intervalo, o valor da taxa que querem aplicar em cada ano.

Foi esta lei que levou o auditor do Novo Banco a considerar que o grupo bancário poderia ter de pagar taxa de IMI agravada por ser detido por sociedades com sede em territórios chamados paraísos fiscais ou ‘offshore’.

Texto de Irina Melo e Jorge Faria de Oliveira, da agência Lusa