É de bronze, pesa 400 quilos e tem dois metros de altura. A Câmara Municipal de Vizela inaugurou no domingo uma escultura do atual secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e ex-primeiro-ministro, António Guterres, tendo gastado 89.980 euros, valor adjudicado através de ajuste direto pela autarquia, como mostra o portal Base.

A escultura, localizada no jardim Manuel Faria, foi realizada no âmbito da comemoração dos 25 anos da elevação de Vizela a concelho. A construção da estátua de António Guterres foi uma forma de prestar homenagem ao ex-primeiro-ministro, que prometera, ainda como secretário-geral do Partido Socialista, que desvincularia Vizela da autarquia de Guimarães.

“Em 1998, [Guterres] cumpriu esta promessa e, por isso, esta homenagem é mais do que justa”, disse o autarca socialista Victor Hugo Salgado citado pelo Jornal de Notícias, durante a inauguração da estátua a 19 de março. A cerimónia também contou com a presença do ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro.

No entanto, apesar dos elogios do autarca, a população não está toda de acordo com a construção da escultura. Ao jornal Público, um comerciante de Vizela, que preferiu manter o anonimato, confessou que foi “apanhado de surpresa” pela escultura, vincando que o valor é “ridículo, tendo em conta a conjuntura do país”.”A situação é ainda mais ridícula se tivermos em conta o cargo que ocupa na ONU: angaria dinheiro para ajudar pessoas com necessidades e acha bem gastar-se 90 mil euros numa estátua?”

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Victor Hugo Salgado rebate as críticas, dizendo ao Público que a estátua serve como um “museu vivo” e que homenageia “quem mais fez pela autonomia do concelho”. Sobre o valor, o autarca clarifica que a decisão partiu dos “serviços municipais”.

Por seu turno, o gabinete de assessoria de António Guterres confirmou ao Público que o atual secretário-geral foi “informado” da estátua, mas diz não ter “nenhuma ligação à cidade”, para além da decisão de elevar Vizela a concelho. Adicionalmente, o ex-primeiro-ministro assinalou não ter “quaisquer informações acerca do modo como a estátua foi desenvolvida ou financiada”.

Escultor já trabalhou 15 vezes com a Câmara de Vizela

Mas há uma outra polémica a envolver a estátua de António Guterres. A escultura foi adjudicada a Artecanter, detida por Dinis Ribeiro, que tem ligações aos socialistas, tendo sido eleito membro da Assembleia Municipal de Guimarães pelo PS em 2009.

Conforme se vê no Portal Base, a Artecanter fez 19 contratos públicos, 15 dos quais com a autarquia de Vizela (e dez foram mesmo por ajuste direto). Entre a colocação de placas comemorativas à construção de monumentos e até à reconstrução de uma rede viária, o valor dos contratos entre o concelho vizelense e a empresa — só em ajustes diretos — chega aos 128 mil euros.

Ao Público, o vereador da coligação do PSD e CDS, Jorge Pedrosa, discorda com a construção estátua. Os quase 90 mil euros são “descabidos” e são uma “falta de respeito, nos tempos que correm, com as dificuldades que as famílias atravessam”. Questionado sobre os contratos celebrados com a Artecanter, o social-democrata considera que é uma “evidência de que tudo isto é muito estranho” e “caberá à justiça tomar medidas se assim o entender”.