Quem pensava que depois da saga Nissan versus Carlos Ghosn, em que o ex-chairman se evadiu depois de estar preso acusado de receber prémios não declarados, entre outros alegados crimes, as polémicas relacionadas com funcionários do construtor japonês tinham terminado, enganou-se redondamente. Já depois da prisão (e fuga) de Ghosn, o homem que convenceu a Renault (de que era CEO) a salvar a Nissan, na altura à beira da falência, as polémicas continuam, desta vez envolvendo o CEO e o COO, respectivamente o nº 1 e nº 2 da empresa.

De acordo com a Reuters, uma investigação solicitada pela Nissan a uma entidade independente, liderada pelo escritório de advogados Davis Polk & Wardwell, determinou que o actual CEO da empresa, Makoto Uchida, espiou o COO da Nissan, Ashwani Gupta. O relatório preliminar confirmou que Uchida mandou instalar na casa particular do nº 2 da marca, em Tóquio, dois conjuntos de câmaras de segurança para vigiar Gupta, um que era utilizado por uma firma de segurança privada e um segundo pelo serviço de segurança interno do fabricante nipónico.

Tal como aconteceu com Ghosn, também Gupta é um estrangeiro no Japão com ligações à Renault e o facto de ser apontado como um possível futuro nº 1, podendo assumir a prazo o lugar de CEO que agora pertence a Uchida, é visto como uma explicação para esta “vigilância”. Tudo indica que foi a possibilidade de Gupta poder substituir Uchida e a ideia de um estrangeiro voltar a mandar na Nissan que levaram às câmaras de vigilância e a uma série de outras acusações, desde uma alegada queixa de assédio de uma funcionária japonesa em relação ao quadro indiano até à acusação deste querer atrasar a negociações com a Renault – em que os japoneses queriam adquirir 15% da divisão de veículos eléctricos dos franceses. Tudo isto colocou Gupta numa posição impossível que o levou a abandonar a Nissan.

Nissan. Chairman preso por abuso, mas CEO perdoado

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

É impossível não realizar aqui um paralelismo entre Gupta e Ghosn, pois também este foi soterrado em acusações, como aquela em que praticou desvios e recebeu prémios não declarados, que depois se revelaram ser similares aos que recebiam os outros quadros japoneses, uma vez que era política da Nissan para fugir a impostos – tendo sido a empresa punida pelo tribunal. Mas os outros membros da administração que (também) recebiam por fora apenas tiveram de pedir desculpa.

Na batalha judicial da Nissan contra Ghosn, tribunal penaliza japoneses

De recordar ainda que o ajudante de Ghosn, o norte-americano Greg Kelly, depois de estar dois anos a aguardar julgamento por conspiração criminosa, entre outras alegações, viu as provas da Nissan contra ele serem desmontadas pela defesa, apesar de não poder contar com testemunhas abonatórias, pois a desconfiança em relação à justiça japonesa levou-as a ter receio de serem presas como retaliação. Ainda assim, foi condenado a apenas seis meses de prisão com pena suspensa por ter escondido os tais pagamentos não declarados a Ghosn, que o tribunal concluiu serem prática regular entre os quadros da empresa.