A PJ fez buscas nas casas de Rui Rio, ex-líder do PSD, de Hugo Carneiro, ex-secretário-geral do partido e atual deputado, de Florbela Guedes, ex-assessora de Rio, e de outros ex-dirigentes do PSD. As buscas efetuadas na manhã desta quarta-feira estão relacionadas com a gestão do PSD, com suspeitas de peculato e abuso de poder que nasceram já em 2020 com um conjunto de denúncias internas, tendo a notícia sido avançada pela CNN e confirmada pelo Observador.

Além das buscas domiciliárias, que já terminaram, foram igualmente realizadas buscas às sedes nacionais do PSD e da Juventude Social Democrata (JSD), bem como à distrital do partido no Porto. A investigação da PJ concentra-se na alegada utilização indevida de dinheiros públicos na anterior gestão do partido. Está em causa um alegado esquema para pagar ordenados a funcionários do PSD com recurso a verbas da Assembleia da República que são destinados a cargos de assessoria dos grupos parlamentares.

Rui Rio, à varanda, usa o humor para comentar buscas da PJ. “Vão descobrir os crimes todos que eu cometi, estou lixado”

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Isto é, tais funcionários seriam pagos pelo orçamento do Parlamento mas trabalhariam efetivamente na distrital do Porto do PSD, no qual se dedicavam a questões internas do PSD e ao apoio à juventude social-democrata.

Costa sobre o PSD: "Deixemos a Justiça fazer o seu trabalho"

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António Costa, à margem da cimeira da NATO em Vilnius, Lituânia, foi questionado sobre as notícias das buscas a Rui Rio e ao PSD. “Deixemos a Justiça fazer o seu trabalho“, referiu o primeiro-ministro.

Começando por dizer que tem a “a regra” de não falar de política nacional quando está em cimeiras internacionais, Costa acabou por dizer que “o que há a dizer” é “exatamente o mesmo que disse no passado sábado” sobre as suspeitas de corrupção no Ministério da Defesa:

Deixemos a Justiça fazer o seu trabalho“, afirmou o primeiro-ministro. “Acho que os portugueses têm motivos diversos para poderem confiar no sistema de justiça, primeiro porque não há nenhum país que eu conheça onde o grau de independência dos tribunais e ministério público seja tão elevada como em Portugal”.

“Ninguém está acima de suspeitas, ninguém está acima da lei, seja o cidadão comum, seja o primeiro-ministro”, continuou, recordando que sempre teve “concordância com Rui Rio quando disse que não se deve fazer julgamentos de tabacaria“.

Em comunicado, a PJ confirma a realização de 20 buscas, 14 delas domiciliárias, cinco a instalações do partido e uma em instalações de Revisor Oficial de Contas, na zona da Grande Lisboa e no norte do país. A PJ também fala em “apreensões”, sem especificar que material foi apreendido. E também confirma que em causa estão suspeitas da “eventual prática de crimes de peculato e abuso de poderes (crimes da responsabilidade de titulares de cargos políticos), a factos cujo início relevante da atuação se reporta a 2018”.

A investigação está a ser conduzida pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção, que foi acompanhada por seis magistrados do Ministério Público, um Juiz de Instrução Criminal, com a colaboração do DIC de Setúbal, da ULIC de Évora, da UPFC e UPTI da Polícia Judiciária. Nas buscas participaram “cerca de 100 inspetores e diversos peritos informáticos e financeiros“. A PJ indica que está a ser investigada a utilização de fundos de natureza pública, “em contexto político-partidário”.

“A investigação prosseguirá com o exame integral aos elementos probatórios alcançados, visando o cabal esclarecimento dos factos que integram o objeto do inquérito”, avança ainda a PJ.

O PSD confirmou que também ocorreram buscas na sede nacional do partido e na distrital do Porto e que a investigação se refere a factos “que remontam ao período de 2018 a 2021”. Ao que o Observador apurou, as suspeitas incidem sobre o ex-presidente do PSD, o ex-secretário-geral e atual deputado Hugo Carneiro e outros dirigentes social-democratas.

Enquanto as buscas decorriam no seu apartamento, na Boavista, no Porto, Rui Rio foi algumas vezes à varanda, visivelmente bem disposto e a acenar e a falar aos jornalistas. “Vão descobrir todos os crimes que cometi ” e “estou cheio de medo”, ironizou,  citado pela SIC Notícias, um dos canais que transmitiu as imagens. Anteriormente já tinha dito, numa outra vez em que surgiu na varanda a dizer que estava “muito calmo e sereno”. O ex-líder do PSD garantiu ainda que estava a colaborar com as autoridades e a acompanhar as buscas. No mesmo sentido vai o partido na nota enviada aos órgãos de comunicação social.

Rui Rio diz que buscas foram para “afetar” a sua imagem e que em causa está uma prática “dos partidos todos”

Em declarações aos jornalistas, no carro, de regresso a casa, Rui Rio reafirmou que está tranquilo e disse que a investigação foi feita para “afetar” a sua imagem, uma vez que as práticas de que a sua gestão é suspeita — de financiamento partidário indevido — são feitas por “todos os partidos”.

Está em causa uma prática na Assembleia, dos partidos todos, as pessoas podem considerar bem ou mal”, indicou, aos jornalistas. “Tudo isto é para afetar a minha imagem, se afeta ou não, não sei”, acrescentou. Rio acredita que se trata de uma investigação “para produzir uma notícia”. “Isto é para produzir notícias, estou fora da política, não conto voltar a política de certeza, estou farto disto”, afirmou. “Nem percebo do que é que andam à procura”.

Rui Rio diz que as autoridades apreenderam o seu telemóvel, pelo que ainda não falou com a atual liderança do partido. O social-democrata adianta que não foi constituído arguido e garante que, aquando da sua liderança, fez uma “reforma para moralizar” as práticas do partido.

Hugo Carneiro está “sereno” e não ficou surpreendido

Hugo Carneiro, ex-secretário-geral do partido e atual deputado, prestou declarações no Parlamento para confirmar que foi alvo de buscas na residência arrendada em Lisboa e na residência no Porto e assegurar que colaborou “totalmente” com Ministério Público e Polícia Judiciária, nomeadamente com passwords e pins de telemóveis e computadores — “Fiquei sem telemóvel.”

Tendo em conta o auto a que teve acesso, o deputado social-democrata explicou que o processo está relacionado com “queixas anónimas” sobre colaboradores do grupo parlamentar ou PSD e não foi surpreendido: “Já esperava há muito tempo que isto pudesse acontecer porque praticamente todos os colaboradores quer do grupo parlamentar, quer do PSD há muitos meses foram chamados ao MP e à PJ para prestar declarações.”

Hugo Carneiro garantiu que não falou com Rui Rio e que soube das buscas em casa do ex-presidente do PSD pelas notícias, espera que o processo avance o mais depressa possível e disse estar de consciência tranquila: “Obviamente, sabendo eu que a minha atuação foi pela defesa do interesse público, não podia estar de outra forma que não fosse sereno.”

O social-democrata assegurou ainda que não lhe foi “indiciado que ia ser constituído arguido”, ainda que se mostre disponível para “prestar contas” caso o Ministério Público peça o levantamento da imunidade que tem por ser deputado.

Ventura: “Não é matéria para brincar”

André Ventura, líder do Chega, considera que os “factos noticiados” esta quarta-feira são “graves” e que não deveriam ser desvalorizados pelo ex-líder do PSD. “Acho que Rui Rio não os deve desvalorizar. Sei que este é o estilo próprio de Rui Rio, que é muito diferente do meu. Tem este estilo calmo, tranquilo, até de um certo humor, mas penso que sabe bem, como a maior parte do PSD sabe bem, que não é matéria para brincar“, defendeu, questionado pelos jornalistas, no Parlamento.

Ventura disse ainda que os partidos devem ter a “noção clara” de que o dinheiro parlamentar “é para ser usado na atividade parlamentar” e não na partidária — para isso servem as subvenções nacionais que, admite, podem nem sempre ser suficientes para a atividade do partido.

Não deixa de ser grave, é grave efetivamente“, acrescentou, pedindo que Rui Rio esclareça os factos, “para bem do sistema político”. “Deve ser investigado e as conclusões devem ser tiradas”, frisou.

Ventura garante que, no Chega, tem feito um “esforço rigoroso” de separação de contas entre a atividade parlamentar e a partidária.