Um quarto lugar na etapa (ou seja, mais um top 10 em tiradas de grandes voltas), a subida à sexta posição da classificação geral, um sem número de pequenas-grandes conquistas como o facto de ter ficado à frente do companheiro Juan Ayuso, de deixar também para trás Enric Mas e de encurtar as distâncias para os muito improváveis líderes da Vuelta nesta fase, Sepp Kuss e Marc Soler. Se a chegada a Collado de la Cruz de Caravaca tinha deixado bons sinais em relação a João Almeida, que ganhou alguns segundos à concorrência mais direta, o contrarrelógio de Valladolid voltou a ser um momento de afirmação para o português quando as atenções da UAE Team Emirates pareciam estar mais viradas para o espanhol que foi terceiro na edição de 2022. No entanto, e como tinha destacado no primeiro dia de descanso, não havia fases “calmas”.

O Bota Lume veio mesmo para ficar: João Almeida termina contrarrelógio em 4.º e passa Ayuso, Landa, Mas e Vingegaard

“Tem sido uma Vuelta muito difícil. No papel, a primeira semana não seria assim tão difícil, mas na prática foi. Todos os candidatos estão muito fortes, eu próprio sinto-me melhor do que esperava. O mau tempo tem tornado tudo muito difícil, especialmente nas estradas espanholas e num contexto de alta pressão para todos. A segunda semana da Volta a Espanha será bastante dura mas sinto-me fisicamente bem para o desafio. Sempre que tiver oportunidade, vou tentar atacar, para ganhar algum tempo. No domingo foi o que fiz, e mesmo que não tenha ganho muito tempo, grão a grão enche a galinha o papo. Tivemos alguns percalços e má sorte, com um furo no contrarrelógio por equipas mas temos ultrapassado esses problemas. Encontro-me bastante bem e espero continuar. As minhas expectativas para o resto da Vuelta serão as mesmas, estão aqui muitos candidatos e estar perto deles diz muito”, tinha referido antes do contrarrelógio.

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Ignorou as dores, atacou e deixou a concorrência para trás: João Almeida fez pela vida na Vuelta e aproximou-se dos rivais

“Foi bom. Consegui fazer um bom esforço, por isso estou satisfeito por ter conseguido ganhar tempo aos outros candidatos. Amanhã [Quarta-feira] vamos enfrentar outra etapa dura, não super dura, mas será necessário estar na frente e ser vigilante. Vamos focar as nossas atenções nas próximas etapas até à 13, com a chegada ao Tourmalet. É importante conservar energias até lá”, destacou após a quarta posição que fez em Valladolid, onde só tempo (e não muito, acrescente-se) para Remco Evenepoel e Primoz Roglic.

Agora, ninguém sabia ao certo o que poderia sair da 11.ª etapa entre Lerma e Laguna Negra, uma tirada para andar a rolar em terreno praticamente plano durante muitos quilómetros antes de uma chegada a subir. Não se sabia como, quando e com quem poderia a Jumbo atacar tendo Sepp Kuss como líder, Jonas Vingegaard no top 10 e um Primoz Roglic que entrava em terreno predileto para brilhar. Não se sabia até que ponto podia havia um Remco Evenepoel tendo em conta as características da subida final. Não se sabia que colocação teriam Marc Soler e Juan Ayuso entre a formação da UAE Team Emirates olhando para a atual classificação. Aquilo que se sabia certamente é que todos os conjuntos teriam algo preparado para a etapa.

Havia, em paralelo, outro ponto curioso. Nas análises ao contrarrelógio, todos se consideravam vencedores ou pelo menos protagonistas de um dia positivo. Foi assim com Sepp Kuss. Com Marc Soler. Com Primoz Roglic. Com Remco Evenepoel. Com João Almeida. Com Juan Ayuso (este sem que se percebesse ao certo porquê). Agora, as perspetivas seriam diferentes e os segundos ganhos ou perdidos teriam outro peso.

O dia começou com uma má notícia para a UAE Team Emirates, com Juan Ayuso a ter uma queda sem que se visse um motivo real para isso ainda na zona neutralizada, ainda que sem grande velocidade – o que poderia também atenuar a gravidade da mesma (Felix Engelhardt também foi ao asfalto). Depois, Sean Quinn, da EF Education, ainda tentou sair em fuga, foi anulado mas parecia inevitável por tudo o que se tem passado um grupo rumar para a frente e ganhar vantagem sobre o pelotão. Foi isso que aconteceu, já com mais de 50 quilómetros de etapa e após outras tentativas frustrada como a de Larry Warbasse, com um grupo em força com vários nomes fortes mas onde o mais próximo do líder era Geraint Thomas, a mais de 13 minutos.

Além do inglês, que terminou em segundo no último Giro mas está a ter uma Vuelta para esquecer, iam entre os 26 corredores Filippo Ganna (Ineos), Rudy Molard, Lewis Askey, Romain Grégoire (Groupama), Jacopo Mosca, Otto Vergaerde (Lidl-Trek), Andreas Kron (Lotto), Jan Maas (Jayco), Jonathan Caicedo, Andrea Piccolo (EF Education), Jorge Arcas (Movistar), Dorian Godon, Damien Touzé, Nicolas Prodhomme (AG2R), Julius Johansen (Intermarché-Wanty), Jesús Herrada (Cofidis), Sean Flynn (DSM), Lukasz Owsian (Arkéa), Alan Jousseaume, Paul Ourselin (Total Energies), Luis León Sánchez (Astana), José Manuel Díaz Gallego, Eric Fagúndez, Pelayo Sánchez (Burgos-BH) e Joel Nicolau (Caja Rural). E muito rapidamente a vantagem escalou para os mais de três minutos de vantagem sobre o pelotão onde rodavam os primeiros.

Chegado a esse ponto, e tendo em conta que o avanço do grupo da frente ia aumentando à vontade sem que ninguém quisesse agarrar no ritmo do pelotão, era sobretudo tempo para fazer apostas meramente teóricas sobre o que poderia acontecer numa chegada que começava a um ritmo mais normal mas que terminava nos três quilómetros no final de explosão com pendentes bem mais duras. Mais: após o “passeio” entre Ólvega e Saragoça esta quinta-feira, seguia-se o grande monstro do Col du Tourmalet na etapa rainha da Vuelta na sexta-feira mas logo a seguir uma também complicada subida com chegada a Larra-Belagua. Ou seja, além da questão do ganhar ou perder tempo nesta 11.ª tirada, todos tinham em mente que La Laguna Negra podia distribuir alguns segundos entre ganhos e perdas mas a seguir chegam as diferenças a sério.

Entre todas as teorias, os 20 quilómetros finais chegavam com uma vantagem a rondar os seis minutos da fuga, o que poderia permitir uma aproximação de Geraint Thomas ao top 10 da classificação geral. Só mesmo nos últimos dez quilómetros começaram a surgir os ataques iniciais entre os 26 fugitivos, numa fase em que as pendentes estavam ainda a 3%/4% antes de uma descida e nova ascensão mais leve até chegar a “parede”. Lá atrás, as principais equipas começavam a tentar chegar-se à frente para liderar no início da subida, com Rui Oliveira a trazer a UAE Team Emirates e Dylan van Baarle a liderar o super esquadrão da Jumbo. Paul Ourselin foi o primeiro a tentar a sua sorte, com uma vantagem máxima que nunca passou dos 30 segundos tendo um grupo liderado por Filippo Ganna que ia controlando essa diferença para a liderança.

Os primeiros corredores começavam a ceder de forma natural na frente, sendo que o ritmo de Filippo Ganna ia fazendo mossa nos perseguidores e em Paul Ourselin, que cedo “encostou”. Geraint Thomas ficou depois com a deixa do companheiro de equipa, que reduziu a fuga a menos de dez corredores mas acabou por ter de ceder a partir dos últimos 2.5000 metros, onde começavam as verdadeiras mexidas pela vitória na etapa com tudo em aberto perante os ataques que poderiam ou não aparecer. Caicedo foi o primeiro a atacar, com a resposta imediata de Thomas e Andreas Kron também a espreitar a oportunidade, mas o equatoriano voltou a disparar mas Jesús Herrada conseguiu ser mais forte, à frente de Gregoire, Kron, Caicedo e Thomas.

As atenções centravam-se agora no pelotão e nos corredores da frente, com a Bora a ser a primeira a mexer com Cian Uijtdebroeks a descolar para encurtar a distância para o top 10 enquanto Remco Evenepoel pedia aos companheiros da Soudal Quick-Step para “bloquearem” a estrada e evitarem possíveis ataques por fora, uma manobra que a Jumbo viu com bons olhos naquilo que se começava a afigurar como um período de tréguas entre os principais conjuntos que seria quebrado nos metros finais. Hugh Carthy também tentou descolar, com Wilco Kelderman a sair na sua roda, mas tudo ficaria mesmo “anulado” sem cortes. 

Com isso, e quando se esperava inicialmente numa etapa que podia trazer mais algumas mexidas nos tempos entre o top 10, a geral manteve-se sem mudanças: Sepp Kuss na frente com Marc Soler a 26 segundos, Remco Evenepoel a 1.09 e Primoz Roglic a 1.36. Seguem-se Lenny Martínez (2.02), João Almeida (2.16), Jonas Vingegaard (2.22), Juan Ayuso (2.25), Enric Mas (2.50) e Aleksandr Vlasov (3.14), sendo que fora dos dez primeiros nem Cian Uijtdebroeks nem Hugh Carthy, que tentaram sair, ganharam qualquer segundo.