Apesar do veto do Presidente da República ao Pacote Mais Habitação, o Governo e o PS já anunciaram que que a proposta original voltará a ser discutida e aprovada no Parlamento no final de setembro. O que significa que as fortes restrições ao Alojamento Local (AL)) em zonas de pressão urbanística vão mesmo para a frente. E agora? Será que o arrendamento de curta duração é um alternativa ao AL?

Corrupção. É possível ter Tribunal Internacional?

Foi a esta pergunta que o advogado José Silva Nunes, do escritório CMS Rui Pena & Arnaut, respondeu na segunda parte do programa “Justiça Cega” (ouvir a partir dos 18m23s).

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E a resposta é positiva. “O arrendamento de curta duração é uma figura que já existe na nossa lei há muitos anos. É um arrendamento que se pode destinar a um trabalhador que vai ser deslocado dois meses para um local mais longe da sua residência permanente, para finalidades de formação” mas “também para turismo”, entre outros possíveis usos.

É certo que há diferenças legais entre o AL e o arrendamento de curta duração mas são “duas realidades que hoje em dia, antes do programa Mais Habitação, já convivem e existem.”

Sem registo, pode não ter contrato escrito e com comunicação eletrónica às Finanças

Em termos práticos, como podem os proprietários de AL passar a trabalhar num modelo de arrendamento de curta duração?

Desde logo, não é necessária nenhuma autorização de qualquer entidade pública, como acontece com o AL. “O regime AL tem uma regulação que não tem qualquer comparativo com o arrendamento curta duração”,  explica José Silva Nunes.

Por outro lado, a lei não impõe nenhum prazo para se fazer um aluguer de curta duração. “Pode ser de poucos dias, como uma semana, 15 dias, 20 dias ou 30 dias. E porquê? Porque o Código Civil, no artigo que regulamenta e que prevê o arrendamento de curta duração, não contém nenhum tipo de limite mínimo ou máximo para estes arrendamentos de fins especiais transitórios. Portanto, no direito civil, que é o direito privado, aquilo que não é proibido pode ser feito“, fundamente o advogado especialista em imobiliário.

E os contratos têm de ser escritos? Ou seja, de cada vez que se faça um aluguer a um turista, tem de ser assinado um contrato?

Apesar dos “contratos de arrendamento, nos termos do Código Civil, estarem sujeitos a forma escrita”, isso não impede o proprietário de fazer um “contrato verbal” — a forma verbal não determina a “invalidade do contrato”. Porquê? Porque “o requisito de forma escrita é um requisito de prova, não é um requisito de validade”, diz o associado coordenador da CMS Rui Pena & Arnaut.

Contudo, coloca-se outra questão: se os contratos escritos têm de ser comunicados às Finanças para o pagamento do respetivo imposto de selo (além das obrigações em sede de IRS ou de IRC), como é que tal comunicação pode ser feita para os contratos verbais?

“De acordo com a lei, os contratos verbais também têm de ser registados nas Finanças para pagar o respetivo imposto de selo. Qualquer um de nós, se for senhorio, pode ir ao seu Portal das Finanças e fazer uma comunicação de um contrato sem fazer um upload do documento nessa plataforma. Portanto, mesmo que não haja documento escrito, conseguimos cumprir o formalismo da comunicação e pagar o imposto do selo”, explica.

Pacote Mais Habitação não mata já o Alojamento Local

De uma coisa José Silva Nunes não tem qualquer dúvida: o fim do regime do alojamento local vai significar um setor muito menos regulado, logo menos seguro.

“Os alojamentos locais estão certificados. E o que é que eu quero dizer com estão certificados? Têm um registo, uma autorização” de uma entidade pública para operar. “E, portanto, nós conseguimos ter uma certificação de que aquele imóvel está bom, reúne as qualidades necessárias para ser utilizado para aquele fim e, em princípio, terá um seguro. Enquanto que um arrendamento de curta duração não tem esse nível de certificação”, afirma.

Acabar com o alojamento local significa terminar com uma garantia de que temos um mercado a funcionar dentro de determinadas regras pré-estabelecidas conhecidas de todos, enfatiza José Silva Nunes.

Contudo, esse fim não será automático. “A nova legislação do Pacote Mais Habitação não terminará de imediato com o alojamento local. Não é necessariamente uma morte anunciada, mas é o início de um período em que esse regime será muito menos utilizado e, ficando mais restrito, vai ter menos interesse para os investidores”, conclui o jurista.

Oiça as explicações de José Silva Nunes na íntegra aqui (a partir dos  18m23s)