Um grupo de empresários da região norte de Portugal juntou-se para tentar comprar o Jornal de Notícias, O Jogo e outros títulos do grupo Global Media, que atualmente enfrenta uma crise que coloca em risco a subsistência de um dos maiores grupos de comunicação social do país. Os empresários dizem que fazem a proposta “com o objetivo de manter a voz do Norte”.

A notícia, inicialmente, avançada pelo Eco e pela RTP, foi entretanto confirmada pelo Observador, que teve acesso à proposta de intenção. O grupo é liderado pelo empresário Diogo Freitas, da Officetotal Food Brands, empresa de distribuição de Ponte de Lima que é responsável, por exemplo, pela produção e distribuição das conhecidas bolachas “Belgas” — que assina o documento em nome do consórcio.

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A proposta, que não avança com nenhum valor para a compra, tem como principais destinatários os acionistas Marco Galinha, Kevin Ho e José Pedro Soeiro, que, no seu conjunto, são donos de 74,45% do Global Media Group.

Segundo o presidente da comissão executiva, José Paulo Fafe, a Global Media tinha rejeitado uma proposta de compra do também acionista Marco Galinha para adquirir O Jogo e o Jornal de Notícias por 12 milhões de euros. Uma das condições era o pagamento imediato da dívida do grupo ao Estado (Fisco e Segurança Social). Esta oferta, segundo informação recolhida pelo Observador, era apoiada por vários empresários do Norte.

Os empresários têm a intenção de comprar o Jornal de Notícias, O Jogo e as revistas JN História, Notícias Magazine, Evasões e Volta ao Mundo. A proposta de compra não inclui o Diário de Notícias.

Quanto à TSF, rádio da Global Media, também não está diretamente incluída nesta proposta, mas o grupo de empresários diz-se “disponível para ser a solução” e sublinha o “valor informativo e relevância editorial” da rádio, que é “único no panorama nacional”.

Os empresários que avançam com a proposta dizem que têm “observado com preocupação os recentes acontecimentos, que colocam em causa a estabilidade do Grupo Global Media, a reputação das suas marcas, o emprego dos seus profissionais e o valor das vossas participações”. Os empresários classificam a Global Media como “um pilar estrutural na defesa da nossa democracia e a defesa de uma economia de mercado, de cariz social, através da reputada informação isenta e plural que é hoje o cimento da nossa Democracia”.

“Perante os riscos evidentes, agregámos vontades e recursos e apresentamo-nos perante vós, com vista a sermos parte de uma solução para o grupo”, lê-se no documento.

“Somos e vimos pelo bem; defendemos a pluralidade de opiniões e o respeito pela independência editorial. Somos por um jornalismo de acesso de e a todos e onde todos possam participar ativamente. Somos por um jornalismo moderno, que chega a todas as gerações e se adapta às novas tendências de distribuição da informação, bem como às novas formas de remuneração dos serviços de media. Somos por um jornalismo que investe na análise dos temas estruturais que enfrentam as sociedades modernas, promovendo o debate e o diálogo, rumo às soluções”, lê-se ainda. “Somos por Portugal dinâmico, positivo, criador de valor. Somos pela Global Media.”

A proposta de compra dos jornais passaria pela “criação de uma nova sociedade para onde seriam transferidas as marcas, assim como os profissionais e os seus direitos”. Ao mesmo tempo, o grupo de empresários equaciona “ceder parte do capital a uma cooperativa de jornalistas e demais trabalhadores”. O grupo compromete-se a transferir para esta nova sociedade todos os profissionais “que se comprove que estão mais de 50 por cento do seu tempo afetos” à Global Media — o que deverá, provavelmente, incluir colaboradores a recibos verdes.

“Asseguraremos a manutenção da antiguidade e direitos dos trabalhadores, na transferência dos contratos”, diz ainda a proposta. Os empresários estimam que em causa estará um “universo de 200 a 250 profissionais”.

“A nova sociedade será gerida no dia-a-dia por uma pequena equipa executiva, focada nas funções financeira, jurídica, tecnológica, recursos humanos e comercial”, diz ainda a proposta, que termina com a sugestão da assinatura de um memorando de entendimento nos próximos cinco dias úteis e da concretização da operação no prazo máximo de seis meses.

“O nosso objetivo é que a voz do Norte não se perca”

O empresário Diogo Freitas, líder do grupo que quer avançar com a compra dos títulos, explicou em declarações à Rádio Observador que os empresários pretendem ser “uma solução para manter os títulos a Norte”.

“Os media são essencialmente e têm tudo que ver com a credibilidade. O que está a acontecer é uma perda de credibilidade total destes números, destas marcas, que nós entendemos que não pode acontecer. O nosso objetivo é esse. Se alguém arranjar uma solução melhor, pois que a faça. O nosso objetivo é arranjar uma solução para as marcas e para os trabalhadores”, sustentou.

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Diogo Freitas explicou que, para já, não foi feita uma proposta concreta. “Nós não fizemos uma proposta clara, porque não conhecemos as contas do grupo. Quando as conhecermos — quando for feita a due diligence, que nós esperamos que seja feita, porque o objetivo desta carta de intenções é que o grupo se manifeste e esteja disponível a fazer uma negociação —, nesse momento, as formas de aquisição das marcas podem ser variadas. Pode ter a ver com assumir a dívida, pode ter a ver com dinheiro fresco, injeção imediata de capital na compra das marcas. O que não estamos disponíveis é entrar no capital da Global Media, isso não. Agora, a forma como o negócio poderá ser feito, são variadas formas. Não está neste momento esclarecido.”

O empresário explicou também as razões pelas quais a proposta não incide sobre o Diário de Notícias nem diretamente sobre a TSF.

“A TSF é um caso que pode ser de difícil explicação. O que nos move aqui essencialmente são os trabalhadores e as marcas que representam o Norte do país. Nós entendemos que o Norte do país tem de manter uma posição forte em termos de voz, de media. Neste caso, são estes dois jornais — concretamente, o Jornal de Notícias e O Jogo — que permitem isso. A TSF é um ativo muito interessante, muito importante. Nós poderemos ser a solução, e dissemo-lo na carta de intenções, mas não é o nosso primeiro objetivo”, explicou.

“Tal como não será o DN. O DN há boas razões para isso. A primeira razão é esta que lhe estou a explicar. Somos pessoas do Norte com o objetivo de manter a voz do Norte. E há outra razão: pelas declarações que temos ouvir, nomeadamente do novo Conselho de Administração, eles entendem que as marcas Jornal de Notícias e O Jogo não têm muito valor, e valorizam muito o Diário de Notícias. O que entendemos é que aqui há um benefício para ambos. Eles ficam os títulos que entendem que valem mais e nós ficamos com os títulos que entendemos que valem mais. Quando digo valem mais, no nosso caso concreto, não tem que ver com rentabilidade, atingir lucros no negócio. O nosso objetivo é ser uma solução para os trabalhadores e para que a voz do Norte não se perca”, acrescentou.

Diogo Freitas argumenta também que o grupo que lidera não tem objetivos políticos nem ambições de fama.

“Uma das propostas que nós fazemos é criar uma cooperativa de trabalhadores e essa cooperativa de trabalhadores ser uma parte no capital da empresa, para ter uma voz nas decisões da empresa. Creio que ninguém fez essa proposta. Se calhar, toda a gente está a fazer propostas com objetivos puramente financeiros ou outros interesses. Nós não temos qualquer tipo de ambições políticas, não temos qualquer tipo de ambição de nos tornarmos conhecidos ou sermos pessoas famosas, aumentar egos. O nosso objetivo é pelo bem da região”, disse.

O empresário acrescentou ainda que acredita que os trabalhadores estarão “felizes” com a proposta, que é “a melhor proposta para o grupo e para os trabalhadores”.