O ministro da Cultura recusou esta terça-feira contribuir para a polémica sobre o processo que levou à saída do país do quadro “Descida da Cruz”, de Domingos Sequeira, remetendo o assunto da possível compra para a comissão de aquisições.

“Toda esta especulação não é, certamente, interessante para ninguém, desde logo para os próprios proprietários do quadro”, considerou o titular da pasta da Cultura, Pedro Adão e Silva, em declarações aos jornalistas em Évora.

Admitindo que a aquisição de obras de artes pelo Estado são procedimentos que “demoram tempo até se encontrarem soluções”, o responsável defendeu que se deve “direcionar este processo para onde deve estar”, referindo-se à Comissão para Aquisição de Obras de Arte para os Museus e Palácios Nacionais.

“É no âmbito da comissão para aquisição de bens culturais e é no presidente da comissão, que é também o presidente da Museus e Monumentos de Portugal, que desenvolverá contactos com os proprietários”, adiantou.

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Questionado pela agência Lusa sobre se a saída do país do quadro e a sua eventual circulação por galerias e feiras faz subir o preço e aumentar a especulação, Adão e Silva limitou-se a dizer que desconhece o valor pedido pela obra de arte.

A secção portuguesa do Conselho Internacional de Museus (ICOM-Portugal) já manifestou a sua indignação com a condução do processo que levou à saída do país do quadro e exigiu respostas ao Governo, através de uma carta tornada pública, na segunda-feira, 19 de fevereiro.

Na missiva, o presidente do ICOM-Portugal, David Felismino, pergunta quais os esforços que estão a ser realizados no sentido da compra do quadro, assim como das obras “Ascensão” e “Juízo Final”, do mesmo autor e ainda na posse de privados.

O responsável traça a sequência de acontecimentos desde o pedido, em 2 de novembro, à então Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) para que o quadro saísse do país para explorar uma “possibilidade de venda na Galeria Colnaghi, em Madrid”, questionando se os trâmites legais foram cumpridos.

Como lembra o relato do ICOM-Portugal, o diretor do Museu Nacional de Arte Antiga, Joaquim Caetano, subdiretor do Património Cultural por inerência, deu um parecer negativo ao pedido e propôs o começo da classificação da obra como Bem de Interesse Nacional, a par das outras duas obras da mesma série ainda na posse dos mesmos privados, e a análise da compra de “Descida da Cruz”.

A “manta de retalhos” legal que permitiu a saída de um Domingos Sequeira (e as mudanças que os especialistas desejam)

Dentro da própria DGPC, surge dias depois uma proposta de classificação da obra, que veio a ser rejeitada pelo diretor-geral, João Carlos dos Santos (hoje dirigente do instituto público Património Cultural), por não ser “oportuna” a abertura do processo.

A Lusa também questionou o ministro da Cultura sobre se entende que João Carlos dos Santos tem condições para continuar no cargo atual, e Pedro Adão e Silva escusou-se a responder.

Não vou especular sobre demissões de dirigentes da administração pública, muito menos nesta fase em que o Governo está em gestão”, frisou.

Na segunda-feira, o semanário Expresso, que noticiou em primeiro lugar a história em janeiro, deu conta de que “Descida da Cruz” estaria a caminho da feira TEFAF, em Maastricht, que acontece em março, pela Galeria Colnaghi.

A agência Lusa contactou esta galeria em Madrid, que não confirmou a presença do quadro em Maastricht.

A saída da “Descida da Cruz” do país foi avançada a 26 de janeiro pelo semanário Expresso, indicando que estaria à venda em Madrid, “apesar dos pareceres negativos sobre a sua saída de Portugal”, após uma autorização de saída, justificada pela “inexistência de qualquer ónus jurídico”.

O requerimento para “exportação temporária” e “eventual venda” da obra “Descida da Cruz”, de Domingos Sequeira, na posse do descendente do duque de Palmela Alexandre de Souza e Holstein, tinha como destino a Galeria Colnaghi, de Madrid, pelo prazo de um ano, a contar do dia 2 de novembro de 2023, sendo o valor atribuído de 1,2 milhões de euros, segundo o semanário.