Os deputados polacos votaram, esta sexta-feira, quatro projetos de lei para acabar com a proibição quase total do aborto. O país que detém das leis mais restritivas da Europa sobre o aborto espera conseguir alguma flexibilização, depois de uma legislação mais apertada imposta em 2020 pelo anterior governo de direita.

A legalização do aborto até à 12ª semana de gravidez está incluída em dois dos projetos de lei que tiveram o aval dos deputados da câmara baixa do parlamento. Como explica o The Guardian, os projetos de lei serão enviados para uma comissão parlamentar que os irá estudar.  Mesmo que sejam aprovados pelo parlamento, o avanço é incerto, ficando nas mãos do Presidente polaco, Andrzej Duda, a decisão de transpor os projetos de lei para legislação. Chefe de Estado esse que vetou, no mês passado, uma lei que permitiria a mulheres e adolescentes com 15 anos ou mais obterem contracepção de emergência sem receita médica.

O consenso foi possível pois a Coligação Cívica centrista de Donald Tusk, a Esquerda e a conservadora Terceira Via concordaram em reverter a decisão do governo anterior. Em 2020, o governo proibiu o aborto em caso de anomalias fetais, o que resultou na morte de pelo menos seis mulheres, segundo dados da Human Rights Watch. As fatalidades ocorreram, segundo a ONG, porque alguns médicos deram prioridade ao salvamento dos fetos em detrimento das mães, fosse por razões ideológicas ou como o objetivo de evitar consequências legais ou motivados por razões ideológicas.

Após seis horas de debate esta quinta-feira, a decisão da Esquerda e do partido de Tusk foi pelo avanço da legalização do aborto até à 12ª semana de gravidez. A despenalização da assistência ao aborto foi outro projeto de lei também movido pela Esquerda. A Terceira Via, apesar de ter apoiado os quatro projetos de lei, insistiu num referendo e no regresso às leis rigorosas de 1993, acordadas entre a Igreja Católica e líderes políticos. O presidente do parlamento polaco e membro da Terceira Via disse que deixou passar os projetos de lei por “respeito à democracia e por preocupação com a sustentabilidade da coligação” e que colocava agora “destino destes projetos de lei nas mãos dos membros da comissão”.

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Há “muito trabalho a fazer no futuro”

Apesar das dúvidas, a votação desta sexta-feira foi considerada “um momento histórico”. “Pela primeira vez desde 1996, os projectos que liberalizam e despenalizam o aborto foram enviados para segunda leitura na comissão parlamentar”, referiu disse Kamila Ferenc, da Federação para as Mulheres e o Planeamento Familiar, citada pelo The Guardian, frisando que ainda há “muito trabalho a fazer no futuro”.

“É uma oportunidade para o Estado deixar de processar parceiros, ativistas e mães e irmãs de quem precisa de aborto”, considerou, por seu turno, Wiktoria Jędroszkowiak, da Iniciativa WSCHÓD. “Ninguém deve ser perseguido quando ajuda quem precisa”. Para a ativista, a aprovação da legislação deveria ser feita até junho, pois é necessário apenas que se remova uma linha do código penal do país.

A Amnistia Internacional descreveu o acontecimento como um “passo significativo para acabar com as restrições cruéis e draconianas”, estando o país mais próximo do cumprimento das normas internacionais de direitos humanos.

A votação do parlamento polaco ocorreu um dia depois do Parlamento Europeu ter adotado a decisão histórica de incluir todos os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, incluindo o direito ao aborto, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Eurodeputados aprovam decisão histórica de incluir aborto nos direitos fundamentais da UE

Texto editado por Cátia Andrea Costa