A eventual candidatura do atual presidente da Câmara Municipal como cabeça de lista às próximas eleições europeias de 9 de junho está a ganhar tração junto do aparelho social-democrata, ainda que que faltem acertar detalhes. À data de hoje, Luís Montenegro e Rui Moreira ainda não fecharam o acordo, mas o conforto de uma parte do partido pode precipitar tudo – Montenegro apresentará a sua equipa na segunda-feira, a 22 de abril, no Conselho Nacional do PSD.

Montenegro nunca escondeu a estima que tem por Rui Moreira (que é mútua) e a vontade teórica, pelo menos, de o ter como cabeça de lista numas eleições que ganharam uma enorme importância política – será o primeiro barómetro à popularidade do Governo. De resto, logo em outubro de 2023, o líder social-democrata referiu-se ao autarca como alguém que, “em abstrato”, reunia todas as condições para ser o candidato do PSD às europeias – entretanto, sociais-democratas e democratas-cristãos firmaram um acordo para as legislativas e para as europeias, mas não será o CDS, que apoia o executivo de Moreira na Câmara Municipal do Porto, a levantar entraves.

Aliás, o CDS terá este fim de semana um Congresso onde não é de excluir que sejam avançadas algumas novidades nesse sentido. De resto, num raríssimo momento, Moreira aceitou participar numa ação partidária e juntou-se à campanha eleitoral da Aliança Democrática, num almoço-comício na Trofa, onde, além de ter posado ao lado de Luís Montenegro e Nuno Melo, declarou o apoio ao agora primeiro-ministro. “A independência não é neutralidade. Fiz a minha escolha. Não nos proíbam de sonhar. Não nos tentem meter medo. Não temos medo e o país não vai votar por medo. Vou votar AD e espero que votem AD”, pediu o autarca do Porto.

A posição de Rui Moreira também terá evoluído ao longo do tempo. Em muitos momentos, entrevistas e declarações, o autarca mostrou algumas reservas em relação a uma eventual candidatura a Bruxelas. Por um lado, Moreira nunca escondeu a vontade de se dedicar à vida pessoal e às várias coisas que deixou de fazer (“Depois da Câmara, vou dedicar-me aos meus interesses, que são muitos e variados. Escrever, tirar fotografias, estar com os meus netos, viajar…”, chegou a dizer ao Observador, ainda em 2017). Ao mesmo tempo, o vaivém semanal entre o Porto e o Parlamento Europeu e o facto de o cargo de eurodeputado não ter o perfil executivo que o fez aproximar-se da política também o fizeram muitas vezes torcer o nariz à ideia.

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Em contrapartida, a verdade é que o desafio europeu prolongaria o percurso político de Rui Moreira e garantir-lhe-ia um espaço privilegiado para continuar a intervir publicamente. Tendo atingido a limitação de mandatos na cidade do Porto, e afastada (para já, pelo menos) a hipótese de vir a liderar o FC Porto, a Europa é uma forma de continuar a influenciar e a defender a cidade, a região e o país.

Depois, resta saber que outros voos lhe estarão reservados. Depois de Luís Marques Mendes ter aproveitado o seu habitual espaço de comentário na SIC para apontar Rui Moreira como o inevitável cabeça de lista da Aliança Democrática, o jornal Público avançou que o autarca teria como exigência para abraçar esse desafio o lugar de comissário europeu.

A notícia não foi desmentida formalmente (nem seria normal que assim fosse), mas fontes próximas de Rui Moreira garantem ao Observador que o autarca nunca fez esse tipo de exigências junto de Luís Montenegro. O que não invalida, ainda assim, que o presidente da Câmara Municipal do Porto venha a recusar esse desafio caso ele venha a surgir – compete sempre ao primeiro-ministro em funções indicar um comissário europeu, mas em permanente negociação com a própria presidência da Comissão Europeia.

No passado, já houve alguns amargos de boca – nos dois sentidos. Tal como Pedro Passos Coelho chegou a revelar publicamente, Jean-Claude Juncker tentou convencer o então primeiro-ministro a libertar Maria Luís Albuquerque do cargo de ministra das Finanças para se mudar para a Comissão Europeia. Pedido que Passos recusou, indicando o nome de Carlos Moedas. Mais recentemente, Pedro Marques aceitou deixar o governo de António Costa para encabeçar a lista do PS às europeias com a vontade indisfarçável de ser indicado como comissário europeu. Bateu na trave: Ursula von der Leyen preferiu Elisa Ferreira, que ficou com a pasta da Coesão e Reformas.

*Artigo clarificado às 21h40 sobre a posição de alguns setores do PSD e do CDS em relação à possível candidatura de Moreira