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Alfredo Casimiro, da Groundforce. O casapiano que se fez "capitalista" e nunca desiste

Começou a "vender" livros e aos 30 era milionário. Diz-se capitalista, mas só com garantias de retorno. E, agora, está no olho do furacão por causa da Groundforce. Quem é Alfredo Casimiro.

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“Um empresário resiliente. Eu nunca desisto. Aliás, o meu modo de vida é ‘never give up’ — e em inglês fica sempre mais chique.” É assim que Alfredo Casimiro, o fundador da Urbanos e maior acionista da Groundforce se auto-retrata em poucas palavras, em conversa com o Observador.

Quem fez negócios com ele, descreve-o como um lutador. Elogiam-lhe o caráter empreendedor, mas também lhe apontam o ser muito centralizador. Gosta de controlar tudo, o que eventualmente explica a obsessão pelas gravações das conversas. Foi este episódio que complicou as relações com o ministro que manda na aviação. Pedro Nuno Santos ficou furioso com a divulgação, não autorizada, de uma conversa que teve com o empresário, e em que aparece a dizer que a participação do acionista privado na TAP, Humberto Pedrosa, seria diluída em “pó” por causa da ajuda de Estado. E avançou com uma queixa-crime contra Alfredo Casimiro.

Se o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, tem a fama de falar grosso, Alfredo Casimiro diz ao Observador que também não é pessoa para se agachar quando lhe falam alto. “Quando me levantam o tom de voz, eu também levanto, seja quem for que esteja a falar. Há uma coisa que eu não sou: forte com os fracos e fraco com os fortes. Isso eu não faço, isso eu não faço. Tenho meu código de honra, tenho o meu código de ética e isso não faço”.

Quando foi ouvido pelo Parlamento, o empresário fez-se acompanhar por um advogado criminal reputado, Paulo Saragoça da Matta, só para responder (sem responder) à pergunta sobre a gravação. O objetivo da conversa seria o de comparar os tratamentos dados à TAP e à Groundforce que Casimiro classifica de tremenda desigualdade. Na primeira, o Governo meteu 1.500 milhões de euros e pagou para se livrar do acionista privado. Na segunda, nem um tostão apesar do pedido para um aval a um empréstimo de 30 milhões de euros feito há oito meses, mas que parece perdido entre as Infraestruturas, as Finanças e a Economia. Apesar das conversas que foi tendo com Pedro Nuno Santos, disse nunca ter encontrado interlocutor no Estado para resolver o problema da Groundforce.

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Para Alfredo Casimiro, a proposta de aumento de capital feita pela TAP era quase uma “nacionalização selvagem”, a fazer lembrar as de 1975. Um cenário que, assegurou o ministro das Infraestruturas (conhecido por estar à esquerda dentro do executivo socialista), o Governo não quer, mas que não está totalmente afastado, apesar do acordo que deu um balão de oxigénio de dois meses à empresa.

epa08877549 The Minister of Infrastructure and Housing Pedro Nuno Santos attends to a press conference to explain the details of TAP's Restructuring Plan, in Lisbon, Portugal, 11 December 2020. The government presented on  11 December the restructuring plan of TAP which sent to Brussels on 10 December and which contemplates a maximum of 2,000 redundancies and salary cuts of 25% for salaries above 900 euros.  EPA/NUNO FOX

Pedro Nuno Santos passou a intervir na TAP; e por essa via, na Groundforce

NUNO FOX/EPA

A lição do pai: deixar de estudar está fora de questão

Alfredo Casimiro lembra-se do olhar do pai quando lhe disse que iria deixar de estudar — e da assertividade com este lhe ordenou: “Nem penses nisso, está fora de questão”. Tinha acabado de chumbar de ano depois de um período familiar conturbado, em que a mãe passou “seis, sete” meses no hospital, o pai trabalhava 20 horas por dia e era ele quem ajudava a aguentar a casa. “O meu pai olhou-me profundamente; não me lembro onde foi a conversa, mas lembro-me do olhar dele”. O episódio contou-o a Anabela Mota Ribeiro, numa entrevista publicada na revista Pública em 2010.

Alfredo seguiu-lhe a ordem. Formou-se na Casa Pia, em eletrónica, na primeira “fornada” de técnicos em vários anos. Aceitou um trabalho onde ganhava três vezes mais do que o pai, motorista da Carris. Fez formações cá dentro e no estrangeiro, foi aumentando o salário. Sem licenciatura — “formalmente”, as suas habilitações literárias são o nono ano de escolaridade, disse numa conferência da TEDx —, com “formação complementar” feita “à medida” do que precisava, criou o próprio negócio a partir de uma falha que encontrou no mercado: a falta de empresas que soubessem transportar grandes equipamentos informáticos. Fez-se self-made man e enriqueceu. Aos 30 anos, já era milionário.

"Não sou frio, não sou insensível, mas sou duro nas negociações, não admito faltas de respeito".
Alfredo Casimiro ao Observador sobre reparos à sua forma de gerir

Agora com 55 anos, tem aparecido todos os dias nas notícias por causa de uma empresa com salários em atraso, a Groundforce. No parlamento, Alfredo Casimiro disse aos deputados: “É com profunda tristeza que me vejo pela primeira vez, em 30 anos de empresário, numa situação de não pagamento de salários quando sinto que não tenho responsabilidade”. No entanto, os que convivem mais de perto com a gestão que tem feito desta crise consideram que esta situação não aflige por aí além o empresário. É descrito como um homem duro, frio e que não hesitará em ir até onde for preciso para salvaguardar os seus interesses económicos — incluindo “fazer política de terra queimada” na Groundforce se tiver mesmo de sair.

Alfredo Casimiro garante que não. “Não sou frio, não sou insensível, mas sou duro nas negociações, não admito faltas de respeito”, diz ao Observador.

Numa resposta ao deputado comunista Bruno Dias, Casimiro assumiu-se capitalista. “Ter capital significa ser capitalista e eu sou um capitalista. Mas só farei o investimento [que diz ter capacidade para realizar na Groundforce] se tiver condições para o recuperar num certo número de anos”.

Para compreender melhor esta postura, será útil recuperar o percurso empresarial de Casimiro. Em 2010, a Urbanos foi considerada a melhor PME para trabalhar e Alfredo Casimiro distinguido como a Personalidade do Ano nos prémios RH 2010. A compra da Groundforce em 2012 foi um negócio que o pôs nas boas graças do poder político e até apareceu como candidato à privatização dos CTT que o Governo de Passos Coelho decidiu depois vender em Bolsa. No pior momento da crise económica e financeira de Portugal, na era da troika, o grupo de Urbanos vivia os seus dias mais prósperos. A ascensão empresarial é relatada num documentário da série de “Construtores de Impérios”, da RTP.

Nesta entrevista de vida, Alfredo Casimiro afirmava, a partir da casa onde vivia em 2010 no Clube de Belas: “Nunca tive raiva aos ricos. Sempre disse que um dia seria como eles”. Numa das suas festas dadas no Algarve durante o verão chegou a contratar a fadista Ana Moura para entreter os convidados.

Mas, quando o país estava a sair da crise económica, o grupo Urbanos estava a entrar na sua própria crise. Em 2016, e na sequência de “anos de maus resultados”, segundo afirmou, o grupo entrou em Processo Especial de Recuperação (PER) com dívidas de mais de 40 milhões de euros ao Estado, fornecedores e bancos (Novo Banco à cabeça). Nestes últimos anos, e à boleia do crescimento do turismo e do movimento aeroportuário, a Groundforce parecia ser o negócio mais sólido do dono do grupo Urbanos — que recebia dividendos e comissões de gestão da empresa de handling — até que chegou a pandemia.

O olho para o negócio e o orgulho casapiano

António Alfredo Casimiro nasceu em 1966. Deixou cair o António em homenagem ao avô Alfredo, quando começou a estudar na Casa Pia. O avô, que não sabia ler nem escrever, deu-lhe 500 escudos com um destino: comprar livros. A partir daí, sempre que lhe perguntavam, dizia que se chamava Alfredo, o “nome com o qual me identificava”, disse na mesma entrevista à Pública.

O olho para o negócio abriu-se cedo: começou na pequena horta do pai, onde cultivavam feijão verde, tomate, cebola, alho. Quando tinham em excesso era ele quem ia vender aos vizinhos. Mas “o dinheiro era muito esticado” e por isso um “luxo absoluto” foi, para Alfredo, quando a mãe lhe levou um pacote de batatas fritas no primeiro dia da primeira classe. Sabia das dificuldades da família — “antes de o último tomar banho, desligava-se o gás para se gastar a água quente que estava ainda nos canos” — e, quando pôde, começou a ganhar dinheiro. Tinha 11 anos e o local de trabalho era uma paragem de autocarros, em Odivelas, onde cresceu.

“Um casapiano é um casapiano para sempre”
Resposta de Alfredo Casimiro em entrevista de vida ao Público

Pegou no que mais gostava — os seus livros —, numa valise de carton típica “cinzenta às bolinhas, velha” que tinha em casa e montou um negócio de troca de livros. O modelo era replicado de um “velhote” que fazia o mesmo numa “barraca-armário”. “Deixávamos um livro, trazíamos outro. Um livro custava 25 tostões, pagávamos 10 tostões e trazíamos outro que ainda não tivéssemos lido. Na minha zona não havia nada igual.” Começou a cobrar o mesmo que o seu concorrente, com a vantagem da “proximidade”. Sempre que lhe caía nas mãos um livro novo, só permitia que alguém o levasse depois de o ler. “Foi um pequeno negócio que serviu para comprar mais livros e ter acesso a mais coisas que não podia ter”. Durou até começar, aos 14 anos, a estudar na Casa Pia.

É casapiano orgulhoso — “Um casapiano é um casapiano para sempre”. Mas a experiência não lhe correu bem ao início, quando um precetor lhe disse que não tinha jeito “para nada”. Saltitou de oficina em oficina em busca da vocação e encontrou-a na eletrónica: o curso “mais limpo, mais intelectual, onde estavam os melhores, e aquilo para que tinha mais jeito”. Os anos seguintes foram passados entre Odivelas, onde acordava às cinco da manhã e para onde voltava só à noite, o autocarro até Belém e a Casa Pia. Era altura do pós-revolução, em que os cursos profissionais escasseavam. Quando sai, faz parte da “primeira fornada de técnicos de eletrónica” e recebe três ofertas de emprego.

"Deixe-me dizer de uma forma muito categórica: não sou maçon, não sou da Opus Dei, não pertenço a nenhuma filiação, secreta ou parasecreta ou aquilo que lhe quiserem chamar”
Alfredo Casimiro, em conversa com o Observador

Da logística da tropa à logística das mudanças

Foram os computadores, que não sabia bem o que eram mas desconfiava que seriam “o futuro”, que o fizeram escolher a Control Data, uma fábrica de discos de Palmela.  Foi ganhar como base 75 contos mensais (374 euros), o triplo do que recebia o pai. Só que, entretanto, veio a tropa.

“É uma coisa surreal, que acontece muito neste país. Eu, que era um técnico altamente especializado, sou obrigado a ir fazer a tropa num batalhão de transportes, que não tem nada a ver [com o que fazia]”, contou na TEDx. Alfredo Casimiro resignou-se e aproveitou esse tempo para aprender sobre transportes e logística. Quando saiu, perante uma falha de mercado que já antes tinha identificado na Control Data, decide pôr uma ideia em prática. “[Na Control Data], sempre que tínhamos necessidade de transportar um grande equipamento era uma dor de cabeça. Era o despachante que organizava, ia ao Campo das Cebolas buscar uns carros e uns homens e aquilo era muito complexo”. Teve a ideia de criar uma empresa dedicada ao transporte de tecnologia.

Ainda tentou candidatar-se a um programa de apoios a jovens empresários, mas quando apresentou o projeto perante um júri, caiu “nas malhas da teia burocrática e política”, assim que lhe perguntaram se era filiado no PSD, o partido do Governo da altura (1990). Desde então até tem sido mais associado ao PS, devido a ligações com outros casapianos que passaram por governos socialistas. Desistiu da ajuda estatal e, em 1991, decidiu avançar com o pai e o tio — a cada um prometeu 20% da empresa, em troca de um ano de trabalho de borla.

Empresa Urbanos nasce nos anos 90 do século passado

“Ao fim de um ano tínhamos cinco carros, sete ou oito empregados”, ele próprio carregava e descarregava os carros, conduzia. Despediu-se da Control Data quando ganhava na Urbanos o necessário para “pagar a prestação da casa, para vivermos com alguma qualidade”. Deixou um salário de 500 contos por outro de 167. Não demorou a multiplicá-lo.

A construção de um império

A Urbanos cresceu rapidamente, primeiro como uma empresa de transporte de tecnologia, depois de mudanças de escritórios, um outro “nicho” que Alfredo Casimiro encontrou. No início dos anos 90, uma mudança numa empresa com 70 a 80 postos de trabalho demorava três a quatro dias. “Percebi que, se conseguisse fazê-la num curto espaço de tempo, em 24 ou 48 horas, se conseguisse criar uma metodologia para o fazer, poderia eventualmente estar sempre mais caro do que os meus concorrentes porque não roubava nenhum dia útil”. Foi à Europa buscar esses conhecimentos: mais concretamente, a França e à Alemanha. Saiu de lá com “algumas ideias” e trouxe para Portugal uma tecnologia inovadora: os elevadores exteriores. Com eles passa a conseguir, a partir de “1996, 1997”, que uma mudança de 1.000 postos de trabalho possa ser feita em apenas 24 horas. Essa rapidez dá-lhe uma vantagem competitiva.

Mas Alfredo Casimiro quis que a Urbanos fosse mais do que uma empresa de mudanças. Ao longo dos anos foi alargando o negócio, comprando concorrentes, como em 2012, quando adquire dois operadores — a McLane, dedicada à logística alimentar, química e mobiliário, e a RNTrans, especializada no transporte de obras de arte. “Eram empresas que, por si só, não conseguiriam continuar a viver porque o mercado está a desaparecer e a encolher. Agregadas connosco conseguimos reestruturá-las, reorganizá-las e voltar a pô-las rentáveis”, explicou numa entrevista à RTP Internacional. Foi ao grupo Brisa buscar um presidente executivo profissional e de fora do grupo, João Pecegueiro.

O grupo foi-se ramificando em empresas. Em 2013, entra no negócio da distribuição de jornais, ao co-criar uma sociedade, a Distrinews, para comprar a espanhola Logista, que se preparava para sair do mercado português. Se isso acontecesse, a distribuição do Público, da Bola e do extinto Diário Económico seria deixada à Vasp, controlada por grupos da concorrência, como a Cofina, a Impresa e a Global Media. O consórcio de clientes da Logista procurou um parceiro com experiência na distribuição e a escolha foi a Urbanos: o grupo de Alfredo Casimiro ficou com 70% da sociedade, os três diários com 30% repartidos.

Mas a distribuidora do grupo Urbanos não teria um final feliz e acabaria por cessar atividade, em 2017, por se ter tornado “economicamente inviável e insustentável manter na Distrinews Publicações a atividade de distribuição de publicações que vem sendo desenvolvida”, segundo uma comunicação aos clientes citada pelo Negócios. Por essa altura, já tinha deixado de distribuir jornais diários, como o Público e a Bola.

Uma ascensão a dois ritmos dentro das empresas

Várias fontes que trabalharam de perto com Alfredo Casimiro, e que pedem o anonimato, gabam-lhe o sistema de meritocracia que criou no grupo Urbanos — e que permitia o crescimento dos quadros da empresa, mesmo os que começavam do zero, com pouca experiência e qualificações. À SIC, em 2011, chegou a dizer que 100% dos gestores operacionais “são pessoas que vieram da área das operações, evoluíram na carreira”. Esta ascensão criava, porém, “duas culturas muito distintas” dentro do grupo, aponta uma fonte. Sobretudo quando Alfredo Casimiro começou a profissionalizar a equipa de gestores.

As mesmas fontes apontam-lhe, por outro lado, a “personalidade nada fácil” — “ou estão com ele ou contra ele” — e a “falta de background académico” — “uma coisa é ser gestor, outra coisa é ser empresário e outra coisa é ser empreendedor” —, que se evidenciou com a compra da Groundforce. “A logística de fazer mudanças não é a logística da aviação. São coisas completamente diferentes. A logística da aviação implica grandes conhecimentos de matemática, de investigação operacional, de logística de operações”, refere uma fonte.

Na conferência da TEDx, Alfredo Casimiro gaba-se de ter conseguido ir “buscar os melhores gestores”. “Em 1996 quando foi buscar, à PWC, o primeiro gestor, que foi o primeiro CEO do grupo Urbanos, na altura tive de aumentar o salário três vezes para não ficar a ganhar menos do que ele. Tive sempre essa caraterística, de tentar escolher as melhores pessoas. Já cometi alguns erros. Já contratei pessoas com menos energia do que aquela que diziam e sobretudo com pouca integridade”.

Alfredo Casimiro tem três filhas, duas do primeiro casamento. E não lhes quer deixar dinheiro. Em 2010, contava a Anabela Mota Ribeiro que estava a constituir uma fundação onde iria deixar “parte considerável” dos seus bens e “onde, naturalmente, se alguma coisa lhes acontecer, em termos de saúde ou incapacidade, tenham um apoio”. “Têm a noção de que o pai não lhes vai deixar nada. Se as deixar bem financeiramente, vou tirar-lhes o prazer de vencer, de construir. Se amanhã se alavancarem no dinheiro do pai, não vão ter esse prazer. Vão ter o complexo de fazer mais ou melhor que o pai; ou então entregam-se à morte: ‘Vamos lá torrar o dinheiro que o pai nos deixa’.”

A morte súbita do irmão, um “ataque cardíaco fulminante”, fê-lo “pensar e repensar” a vida. E teve outro condão: fez com que se tornasse, ao mesmo tempo, sócio do Sporting e do Benfica, o maior rival.

Sócio do Sporting e do rival Benfica (em memória do irmão)

“Ganso”, ou seja, casapiano, “dos sete costados”, Alfredo Casimiro chegou a presidir o clube da antiga escola: o Casa Pia Atlético Clube, com estádio perto de Monsanto. Foi entre 1994 e 1995, com Guilhermino Rodrigues – com quem coincidiu em miúdo na Casa Pia – a vice-presidente. Haveria de o convidar, já depois de este ter deixado a liderança da ANA, para ser o primeiro CEO da SPdH (Groundforce), após a compra em 2012. E ao pô-lo à frente de uma empresa participada da TAP, então totalmente pública, acabou por desafiar o Governo que tinha acabado de dispensar o gestor socialista da presidência da gestora aeroportuária.

Mas quando a bola rola, torce pelo Sporting. “Sou sócio há 20 anos. E, por honra e memória ao meu irmão, que morreu há 11 anos – que era um ferrenho benfiquista – tornei-me sócio do Benfica nessa altura. Fiz-me sócio do Benfica com a data da morte do meu irmão, 15 de janeiro de 2010, para dar continuidade. Mas se me perguntar por quem é que torço no final do dia, torço mais pelo Sporting”, conta ao Observador.

Ainda assim, não se considera um adepto ferrenho. Se o Sporting ganhar este ano o campeonato sai à rua para festejar? “Não, não sou um grande fanático do futebol. Gosto de ver, mas não sou um grande fanático. Não me encontrarão com certeza no Marquês de Pombal nessa data”.

E outras afiliações? Alfredo Casimiro fica mais defensivo quando o Observador lhe pergunta se é maçon. “Não! Maçon? Por que razão é que pergunta?” E depois é mais assertivo. “Deixe-me dizer de uma forma muito categórica: não sou maçon, não sou da Opus Dei, não pertenço a nenhuma filiação, secreta ou parasecreta ou aquilo que lhe quiserem chamar”.

Como Casimiro “salvou” pela primeira vez a Groundforce

A TAP estava desesperada para encontrar um investidor que assumisse o controlo da Groundforce quando o dono da Urbanos entra em cena. E o facto de ser português, uma raridade nas privatizações feitas na era da troika, deu-lhe força.

Em 2009, e depois de uma privatização que correu mal, a TAP teve de recomprar a SPdH (Serviços Portugueses de Handling) aos espanhóis da Globalia, que não investiam e cuja gestão estava a deixar a TAP à beira de um ataque de nervos com atrasos sucessivos na operação. A compra foi autorizada com a condição de voltar a ceder a maioria do capital, devido a regras comunitárias que impedem companhias aéreas de controlar operadores de handling. Mas o prazo para revender estava a esgotar-se. Fontes do setor dizem que não havia interessados. E a SPdH, controlada pela TAP, não podia voltar a concorrer aos serviços de handling da transportadora.

Alfredo Casimiro revelou no Parlamento que foi um ministro que lhe ligou a pedir para analisar a operação, que tinha de estar fechada no final de 2011. Nos bastidores desta operação há quem aponte o envolvimento de Miguel Relvas, o então todo-poderoso ministro de Passos Coelho cujo nome aparecia ligado a vários negócios. Mas, em conversa com o Observador a propósito deste perfil, Alfredo Casimiro nega: “De forma nenhuma. Não há aqui uma relação de amizade, não há nada. Vou-lhe contar a história”.

Foi Álvaro Santos Pereira, ministro da Economia de Passos Coelho, que tentou encontrar investidor para a SPdH

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

E conta. “Nós concorremos à compra da participação [da TAP na SPdH] e fomos excluídos. A empresa  que foi escolhida foi a Aviapartner, fez o negócio e a due dilligence, fez tudo. Nós fomos avisados em junho de 2011 de que estávamos fora do negócio, que tínhamos sido preteridos e que iam fazer o negócio com a Aviapartner”, recorda.

Em finais de outubro, conta Alfredo Casimiro, “quando já estava o negócio fechado e tudo OK”, o CEO da Aviapartners veio a Portugal. E disse que só fazia o negócio se o Estado português, além de repor os capitais negativos que a empresa tinha na altura (123 milhões de euros), deixasse a empresa capitalizada, à partida, com 25 milhões de euros. “O ministro Álvaro Santos Pereira e o governo recusaram e quebraram as negociações. É na sequência disso que Álvaro Santos Pereira me telefona e me pergunta se posso reunir-me com ele urgentemente. E a partir daí foi um negócio muito rápido.”

Em 2012, a compra concretizou-se. A Urbanos pagou 3 milhões de euros à TAP por 50,1%, financiados pelo Montepio, mais os resultados brutos dos anos anteriores, num total de 3,7 milhões de euros — e mais tarde criou a Pasogal, empresa para a qual transferiu a posição na SPdH, que ficou assim de fora do universo empresarial do grupo Urbanos.

Quando a adquiriu, a empresa estava em condições “deploráveis”, com prejuízos anuais de 30 milhões de euros, afirmou aos deputados, assumindo todos os louros pela recuperação da Groundforce, que já em 2014 era a única empresa do grupo TAP que dava lucros. O crescimento do turismo e da própria TAP e algum investimento realizado foram importantes, mas fundamental foi um congelamento do acordo de empresa que permitiu cortar seis milhões de euros em custos com pessoal. Com esta operação, Alfredo Casimiro quintuplica o número de trabalhadores, dos 500 da Urbanos até aos 2.200 da Groundforce. e entra na empresa com o compromisso de manter postos de trabalho.

Manifestação de trabalhadores da SPdH/Groundforce, convocada pelo movimento SOS handling, em protesto pelo não pagamento de salários e os despedimentos anunciados, que decorreu junto à torre de controlo / zona ViP do Aeroporto Francisco Sá Carneiro. Maia, 09 de março de 2021. FERNANDO VELUDO/LUSA

Trabalhadores da Groundforce responsabilizam acionista privado pela situação da empresa

Fernando Veludo/LUSA

“Tive mais dificuldade em entender-me com os trabalhadores do que com a TAP, mas conseguimos”, afirma ao Observador, acrescentando que esta negociação permitiu também cortar custos assumidos pela transportadora com o handling. O que terá de voltar a acontecer com a reestruturação da companhia aérea, avisou o presidente da administração da TAP, Miguel Frasquilho, no Parlamento.

Numa entrevista à RTP Internacional, o empresário explicou que a SPdH tinha sido tratada como uma empresa subsidiária e que a sua missão foi “recuperar o orgulho daquelas pessoas, dos excelente profissionais que são e fazer desta empresa um caso de estudo”. Hoje, estas palavras seriam mal recebidas junto dos 2.400 trabalhadores, para quem o acionista maioritário, e os obstáculos que foi colocando às propostas de adiantamento da TAP, é o principal culpado por ter faltado dinheiro para pagar salários.

"Tenho vontade e tenho condições para me manter à frente na Groundforce. Já salvei uma vez a empresa e tenho condições para a salvar uma segunda vez”
Alfredo Casimiro no Parlamento

Mas houve outra condição para o sucesso da SPdH, e que foi condição para entrar na corrida em 2011. A revisão (prolongamento) dos contratos de prestação de serviços à TAP. “Santos Pereira perguntou-me se eu tinha interesse em agarrar no negócio nas mesmas condições que a Aviapartners tinha previamente aceite. Pedi-lhe 48 horas. Depois disse-lhe que sim, que era possível mediante determinadas condições, incluindo uma revisão prévia do Acordo de Empresa, assim como uma revisão prévia de uma série de contratos leoninos que existiam entre a Groundforce e a TAP em que a Groundforce pagava uns valores completamente obscenos à TAP”, conta ao Observador.

A assinatura de um acordo estável de serviços com a TAP só veio a acontecer em 2017, devido a atrasos no concurso. E é a renovação desse acordo, que termina em 2022, ou um bom ponto de partida para ganhar o novo concurso, que Casimiro estabelece como condição para voltar a investir na Groundforce. Admitiu participar num aumento de capital até 10 milhões de euros, mas pelas suas contas seriam necessários dez anos para recuperar

“Tenho vontade e tenho condições para me manter à frente na Groundforce. Já salvei uma vez a empresa e tenho condições para a salvar uma segunda vez”, contando naturalmente com os apoios financeiros previstos pela União Europeia para a Covid. O empresário diz que consegue capital para investir, mas com os problemas no resto do grupo e as ações na Groundforce penhoradas duas vezes à banca, ao Montepio e ao Novo Banco, há muita desconfiança. Por outro lado, se em 2018 a Grounforce foi avaliada entre 160 e 200 milhões de euros, hoje valerá uma fração desse montante.

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