O imobiliário está barato em Portugal? Muitos leitores serão tentados, de acordo com a sua perceção, a responder “sim”. Mas a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) inclui o país no grupo de nações “onde as casas parecem subavaliadas e os preços estão em queda ou praticamente inalterados”.

São poucos os mercados imobiliários baratos. Além de Portugal, a OCDE destaca apenas quatro: Alemanha, Coreia do Sul, Grécia e Japão. Os analistas da organização usaram vários indicadores — como a relação dos preços com os rendimentos das famílias e a rentabilidade do arrendamento — para decidirem quais os países onde se podem fazer os melhores negócios.

O mercado imobiliário português pode estar subavaliado, mas quais as cidades e vilas portuguesas que têm as casas mais baratas para os orçamentos familiares? Seguindo os raciocínios da equipa da OCDE, procurámos os municípios onde é mais fácil comprar casa.

Uma coisa é certa: 2017 será um ano de resultados notáveis neste mercado. O preço das habitações aumentou 7,93% nos 12 meses que terminaram em março passado, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE). Transacionaram-se mais de 35 mil alojamentos familiares no primeiro trimestre de 2017, um recorde histórico na base de dados do INE, que começa em 2009. Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal, calcula que se venderam 80 mil casas no primeiro semestre, um aumento de 30% face ao ano passado.

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Qual a taxa de esforço no seu município?

Entre os concelhos mais populosos do país, é mais fácil comprar casa com recurso ao crédito no Seixal: os apartamentos estão entre os mais baratos de Portugal e os rendimentos dos residentes estão entre os mais elevados.

Metade dos apartamentos T2 à venda no Seixal custam menos de 67.100 euros. Quem tenha 20% desse montante (13.420 euros) e recorra a um crédito à habitação a 30 anos para o restante, fica a pagar uma prestação mensal de cerca de 208 euros, assumindo a taxa Euribor a 12 meses mais recente (-0,16%) acrescida de um spread de 2,5%, a margem média proposta na última ronda do Observador pela banca.

Uma prestação de 208 euros está dentro da capacidade dos seixalenses, porque representa 18% do ganho médio mensal no município, que, em 2014, era de 1.138,50 euros.

Foi este o cálculo que conduzimos nos 32 concelhos mais populosos, que, conjuntamente, reúnem mais de metade dos residentes em Portugal. Além do Seixal, é mais fácil comprar casa com recurso ao crédito bancário em Setúbal, Paredes, Vila Franca de Xira e Santa Maria da Feira.

Em que municípios é mais fácil comprar casa?
O Observador analisou o peso da prestação mensal mediana no rendimento mensal médio nos 32 municípios mais populosos de Portugal, que somam metade da população nacional.
Município Preço mediano de venda
T2
Capital necessário para a compra
20% do preço
Prestação mensal
crédito a 30 anos com spread de 2,5%
Ganho médio mensal
2014
Peso da prestação no ganho médio mensal
Seixal 67.100€ 13.420€ 208€ 1.139€ 18%
Setúbal 71.575€ 14.315€ 222€ 1.197€ 19%
Paredes 55.000€ 11.000€ 170€ 798€ 21%
Vila Franca de Xira 79.500€ 15.900€ 246€ 1.113€ 22%
Santa Maria da Feira 69.500€ 13.900€ 215€ 965€ 22%
Amadora 95.000€ 19.000€ 294€ 1.289€ 23%
Sintra 89.500€ 17.900€ 277€ 1.188€ 23%
Gondomar 69.800€ 13.960€ 216€ 907€ 24%
Valongo 78.500€ 15.700€ 243€ 978€ 25%
Vila Nova de Famalicão 79.250€ 15.850€ 245€ 944€ 26%
Vila Nova de Gaia 89.000€ 17.800€ 275€ 1.050€ 26%
Leiria 85.000€ 17.000€ 263€ 1.003€ 26%
Braga 87.500€ 17.500€ 271€ 986€ 27%
Barcelos 75.000€ 15.000€ 232€ 815€ 28%
Loures 107.250€ 21.450€ 332€ 1.128€ 29%
Viana do Castelo 92.500€ 18.500€ 286€ 950€ 30%
Maia 115.000€ 23.000€ 356€ 1.174€ 30%
Almada 100.900€ 20.180€ 312€ 1.025€ 30%
Torres Vedras 95.000€ 19.000€ 294€ 954€ 31%
Oeiras 172.000€ 34.400€ 532€ 1.674€ 32%
Vila do Conde 103.000€ 20.600€ 319€ 994€ 32%
Aveiro 117.500€ 23.500€ 364€ 1.122€ 32%
Matosinhos 125.000€ 25.000€ 387€ 1.124€ 34%
Odivelas 105.000€ 21.000€ 325€ 916€ 35%
Guimarães 103.500€ 20.700€ 320€ 844€ 38%
Viseu 113.750€ 22.750€ 352€ 925€ 38%
Coimbra 130.500€ 26.100€ 404€ 1.053€ 38%
Porto 177.000€ 35.400€ 548€ 1.307€ 42%
Mafra 125.500€ 25.100€ 388€ 897€ 43%
Lisboa 279.900€ 55.980€ 866€ 1.561€ 56%
Funchal 212.500€ 42.500€ 658€ 1.092€ 60%
Cascais 270.000€ 54.000€ 836€ 1.157€ 72%
Fonte: Observador. Dados: Imovirtual e Instituto Nacional de Estatística, recolhidos entre 25 e 28 de agosto de 2017. Nota: Prestação mensal de um empréstimo a 30 anos no valor de 80% do preço mediano de venda, assumindo uma taxa de juro de Euribor a 12 meses (-0,16%) acrescida dum spread de 2,5%; exclui despesas com seguros e comissões bancárias. Valores arredondados.

Encontrámos o preço mediano dos T2, a tipologia mais numerosa, no Imovirtual, que, segundo os dados de tráfego compilados pela SimilarWeb, é o portal imobiliário mais popular em Portugal. Contabilizámos os 100 anúncios mais recentes no Imovirtual para os T2 em cada munícipio, embora tenhamos considerado os concelhos com menos de uma centena de anúncios. No mínimo, contámos com 42 preços de venda num município (Barcelos).

Cálculamos a prestação mensal assumindo que o comprador tem 20% do valor do imóvel. A maioria das instituições financeiras empresta um máximo de 80% do valor da casa à maioria das pessoas. As exceções são o Eurobic (antigo Banco BIC), que financia até 90%, e o Banco BPI, cujo máximo é de 85%, segundo os seus preçários.

Ao cruzar essa prestação com a remuneração média dos residentes, revelámos uma taxa de esforço indicativa para cada conselho. Usámos o ganho médio mensal de 2014 divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística. Embora não haja informação municipal mais recente, as remunerações subiram pouco desde então: cresceram 0,5% entre outubro de 2014 e outubro de 2016 em Portugal continental.

A taxa de esforço calculada para Cascais, Funchal, Lisboa, Mafra e Porto ultrapassa 40%, o máximo que a banca aceita na concessão de crédito à habitação. “A maioria das instituições financeiras não concede empréstimos a clientes com uma taxa de esforço superior a 30% ou 40%”, indica o Millennium bcp. Todavia, estes cálculos são simplificados: não incluem todos os outros custos envolvidos na compra de uma casa, como impostos e comissões bancárias. Também não preveem que o agregado familiar possa ter mais do que uma pessoa com rendimentos mensais, nem que tenha outros créditos que influenciem a taxa de esforço.

Arrendar é alternativa? Nem por isso

No Funchal, ao preço mediano de venda dos T2, a compra traduz-se numa prestação de 658 euros por mês. Não será melhor arrendar? É pouco provável: metade dos T2 disponíveis para arrendamento nesse município exige rendas de 1.500 euros ou superiores.

O nível das rendas não é a única razão para o arrendamento não ser uma boa opção. Na maioria das localidades, há poucos imóveis para arrendar. Quando o Observador fez a pesquisa, havia apenas 20 apartamentos T2 disponíveis no concelho do Funchal. Extendemos a análise comparativa entre prestações e rendas aos 32 municípios mais populosos, mas exigimos um mínimo de 20 anúncios de arrendamento no cálculo da renda mediana. Apenas nove concelhos chegaram ou ultrapassaram esse mínimo. Em Guimarães, por exemplo, o Imovirtual não listava nenhum T2 para arrendamento.

Onde é mais atrativo comprar em vez de arrendar?
Quanto mais ampla é a diferença entre a prestação mensal e o valor da renda, mais interessante é a aquisição em detrimento do arrendamento.
Município Prestação mensal mediana
T2
Renda mensal mediana
T2
Diferença
Vila Nova de Gaia 275€ 650€ -58%
Funchal 658€ 1.500€ -56%
Matosinhos 387€ 850€ -54%
Sintra 277€ 583€ -52%
Almada 312€ 640€ -51%
Amadora 294€ 550€ -47%
Cascais 836€ 1.350€ -38%
Oeiras 532€ 850€ -37%
Lisboa 866€ 1.200€ -28%
Porto 548€ 750€ -27%
Coimbra 404€ 450€ -10%
Fonte: Observador. Dados: Imovirtual, recolhidos entre 25 e 28 de agosto de 2017. Nota: Prestação mensal de um empréstimo a 30 anos no valor de 80% do preço mediano de venda, assumindo uma taxa de juro de Euribor a 12 meses (-0,16%) acrescida dum spread de 2,5%; exclui despesas com seguros e comissões bancárias. Valores arredondados.

A conclusão obtida no Funchal é extensível aos outros municípios: a prestação é mais baixa do que a renda. Em Coimbra é onde fica mais próxima: uma prestação de 404 euros contra uma renda de 450 euros.

Estes conclusões assumem a manutenção da situação atual, em particular as rendas e os preços pedidos e o nível mínimo da Euribor a 12 meses. Se a Euribor a 12 meses subir cerca de 2,5 pontos percentuais (para um valor próximo de 2,3%, um nível que não se regista há mais de oito anos), a prestação do crédito ficaria alinhada com a renda em Lisboa e no Porto. Em Coimbra, bastaria uma escalada de 0,8 pontos percentuais na taxa de referência, para uma cotação próxima de 0,6%.

Esta análise apenas compara a prestação com a renda. Não tem em conta que, no final dos 30 anos do empréstimo potencial, o devedor terá um património livre de ónus, enquanto o arrendatário não.