Discurso de vitória

de Emmanuel Macron na eleição presidencial de 2022

Ao fim de cinco anos de transformação difícil e também de crises excecionais, neste dia de 24 de abril de 2022, uma maioria entre nós decidiu ter confiança em mim e eleger-me Presidente durante os próximos cinco anos.

Não foi um caminho fácil, mas foi bem sucedido. A abrir o seu discurso de vitória, acompanhado do Hino da Alegria, que é também o hino oficial da União Europeia, Emmanuel Macron evitou reclamar demasiados créditos, tentando afastar de si a imagem de arrogância e prepotência que a oposição promoveu durante a campanha. Foi o primeiro sinal de que este seria um discurso mais de reconciliação e menos de regozijo, mesmo tendo conseguido o feito histórico de ser reeleito para um segundo mandato, algo que já não acontecia há 20 anos, desde a vitória de Jacques Chirac sobre Jean-Marie Le Pen, em 2o02.

Gostaria de agradecer ao conjunto de todos os franceses e francesas que, na primeira e segunda volta, confiaram no nosso projeto para uma França mais independente, uma França mais forte. Pelos investimentos e mudanças, para continuar a garantir o progresso para cada um, a todos nós. Garantindo a criatividade e a inovação no nosso país, fazendo da França uma grande nação ecológica.

Macron segue com discretas respostas a mais críticas que lhe foram sendo feitas pela oposição: as de que representa o passado e o ‘status quo’. O homem que, durante o debate, acusou Le Pen de ser “cética climática” (e foi acusado, de volta, de ser um “hipócrita climático”), piscou o olho ao eleitorado mais jovem e mais esquerdista, numa primeira referência ao ambiente.

Sei também que muitos dos nossos compatriotas votaram em mim hoje, não para apoiar as minhas ideias, mas para criar um obstáculo à extrema-direita. Gostaria também de agradecer e dizer-vos que tenho consciência deste voto e que sou depositário do sentido de dever nos anos futuros, desta ligação à República e do respeito pela diferença que foi expresso nesta última semana.

O Presidente reeleito reconheceu que uma parte significativa dos votos que lhe deram a vitória não chegaram por convicção. Já quando venceu a primeira volta, admitiu que tal poderia acontecer, mas tanto no início do mês como agora, a mensagem foi clara: a cavalo dado não se olha o dente. Agradeceu a estes eleitores menos convictos, até porque as legislativas estão a menos de dois meses de distância.

Penso, por fim, naqueles que votaram na senhora Le Pen e tenho noção da sua deceção esta noite. Desde o início que pedi que nunca tivessem este tipo de reação. Porque já não sou o candidato de alguns, mas sou o Presidente de todos. Para muitos dos nossos compatriotas que optaram hoje pela extrema-direita, a raiva que os levou a votar neste projeto terá também uma resposta. Será minha responsabilidade e de todos aqueles que me rodeiam, pois o voto de hoje faz com que tenhamos de considerar todas as dificuldades de todas as vidas e responder com eficácia a todos os que votaram e àquilo que expressaram.

Depois de agradecer aos que votaram nele por ser um mal menor, estendeu também um ramo de oliveira aos eleitores de Marine Le Pen. É aqui que ganha gás a mensagem conciliadora e apaziguadora, que marca o tom deste discurso. Macron interrompe os próprios apoiantes para os impedir de vaiar, perante uma referência nos votos conseguidos pela sua adversária. Nunca a extrema-direita conseguiu tanto apoio numas eleições presidenciais francesas: com todos os votos contados, sabe-se que Le Pen conseguiu mais de 13 milhões de votos, quase mais três milhões que em 2017. E Macron compreende que não pode viver de costas voltadas para tantos franceses. Repetiu assim uma mensagem que veio a promover durante a campanha e no debate presidencial: a de que compreende a revolta destes franceses e sabe das suas dificuldades. O poder de compra foi definido como o grande tema destas eleições, e Macron, tantas vezes acusado de apenas representar os mais ricos, promete maior sensibilidade e promete ser o Presidente de todos os franceses.

Hoje, optaram por um projeto humanista, que ambiciona a independência do nosso país, da nossa Europa. Um projeto republicano, um projeto social e um projeto ecológico. Um projeto alicerçado no trabalho e na criação. Um projeto de libertação das nossas forças culturais e empresariais. Este projeto, quero aplicá-lo nos próximos anos, sendo também eu depositário das divisões que foram expressas e das diferenças.

Pela segunda vez, refere o”projeto ecológico”, e a insistência pode reforçar a possibilidade de vir a escolher mais figuras da esquerda progressista para um futuro governo. Além de prometer tornar França na “primeira grande nação a abandonar o gás, petróleo e carvão”, durante a campanha, Macron comprometeu-se a escolher um primeiro-ministro que seria formalmente incumbido de levar a cabo um “planeamento ecológico”. Neste resumo do seu programa político, Macron definiu-se também como o contrário de Le Pen, que acusou por diversas vezes que ser anti-humanista, pelas suas posições contra imigração, e anti-Europa. E volta à ideia de que não é indiferente às “divisões” na sociedade francesa e que se espelharam no resultado desta segunda volta.

Assim sendo, temos de ser exigentes e ambiciosos. Há muito a ser feito e a guerra na Ucrânia continua, relembrando-nos que atravessamos tempos trágicos e França deve elevar a sua voz e mostrar a clareza das suas escolhas e a sua força em todos os domínios. É isso mesmo que faremos.

Aqui, o europeísta Macron permite-se um auto-elogio mais declarado, afirmando-se como um estadista que, pela sua liderança, conseguirá “elevar França” e torná-la relevante no contexto internacional. A referência à Ucrânia — a grande questão geopolítica do momento — serve não só para evidenciar a sua grandeza, mas para lembrar as fragilidades de Marine Le Pen, dada a sua proximidade ao Kremlin.

Caros amigos, também temos de velar e respeitar o facto de o nosso país estar repleto de dúvidas e divisões. Temos de ser fortes, mas ninguém ficará para trás. Juntos devemos promover esta unidade, para que possamos viver com mais alegria em França, para enfrentarmos os anos que temos pela França — que não serão tranquilos, mas serão anos históricos. Em conjunto, vamos, de facto, transformá-los.

Macron volta ao tom de celebração comedida. Apesar de ter vencido por cerca de 17 pontos, reconhece que a sociedade francesa nunca esteve tão polarizada, com 13 milhões de cidadãos a votarem em Le Pen. Esta é uma divisão que a candidata da União Nacional também reconhece, mas durante campanha a representante da extrema-direita insistiu que foi Macron que criou essa desunião, ao ser sobranceiro e arrogante, ao desrespeitar os franceses. A chegar à reta final do discurso de vitória, o chefe de Estado reeleito faz por contrariar essa ideia e garante que não quer deixar ninguém para trás, numa altura em que os franceses atingem picos de “râleur”, mau-humor, e desânimo com a política — a abstenção recorde assim o prova.

É com ambição e com boas intenções para o nosso país, para todos nós, que espero, ao vosso lado, enfrentar os próximos cinco anos. Que não são a continuidade dos últimos cinco, mas sim um método refundado para mais cinco anos ao serviço do nosso país, da nossa juventude.

O candidato da continuidade, que apesar de ser jovem vai terminar o mandato com dez anos de presidência centrista, contraria a ideia de um governação morna e promete um “método refundado” para alimentar a “força única” dos franceses. Nos últimos momentos do discurso, Macron pede, em suma, entusiasmo aos cidadãos para mais cinco anos de um Presidente moderado.