Discurso de André Ventura

Encerramento da convenção do Chega

Podem contar comigo, com esta direção nacional, Conselho Nacional, Mesa do Conselho, Conselho de Jurisdição e Conselho de Auditoria. Todos vamos levar o partido a ser o maior de Portugal. Mostraram que mesmo um partido muito grande, com dezenas de milhares de militantes e com estruturas em todas as regiões, consegue eleger o seu presidente com mais de 98% dos votos. Um agradecimento a todos os militantes, delegados e não delegados. Aos muitos milhares que não podem estar aqui, mas são a base da nossa forma e do nosso crescimento. Muitos dizem que é um partido de um homem só, mas que tem sido capaz, sondagem até sondagem, de meter medo aos dois maiores partidos deste país.

André Ventura começou por agradecer a todos os militantes que cessam funções e aos que foram eleitos para os novos órgãos do Chega, com o intuito de garantir que a equipa está preparada para levar o partido a ultrapassar PSD e PS e para se tornar na primeira força política nacional. Mas não se ficou por aqui e fez questão de mostrar que todos contam ao apontar e agradecer às bases que permitem consolidar e crescer — depois de uma convenção onde não se ouviram críticos, convém não abrir brechas desnecessárias. Tudo para dizer que o Chega “mete medo” aos maiores partidos de Portugal e para recordar, em frente de todos (nomeadamente dos convidados de partidos e Governo), que as sondagens mostram o partido a crescer.

Eles não são só a prova da enorme relevância que o Chega tem em termos europeus, são a prova real de que esta Europa, antes de se tornar numa máquina corrupta de Bruxelas, vai ter de enfrentar imensos partidos na Europa inteira, antes de se tornar numa máquina corrupta que tem destruído o nosso continente.

Seguiram-se os convidados internacionais e a necessidade de enaltecer a presença de alguns dos maiores nomes da direita populista europeia, um reconhecimento importante para o partido que se pretende afirmar também no estrangeiro — e uma porta aberta às próximas eleições europeias. Pelo caminho, duras críticas a Bruxelas e ao que diz ser uma “máquina corrupta” que tenta destruir o velho continente. São expressões que deveremos ouvir muito durante a campanha das eleições para o Parlamento Europeu, que terão lugar daqui a pouco mais de um ano, em maio de 2024.

A votação de ontem e de hoje deixa claro que o partido está mais unido do que nunca, deixa claro que saímos com um mandato renovado, mas também com uma ambição renovada. O Chega mostrou amadurecimento, capacidade de enraizamento e sobretudo uma enorme ambição para transformar Portugal. A nossa ambição mede-se para os desafios eleitorais: vamos lutar com o que temos e com o que não temos para sermos governo na Madeira já ao longo de 2023.

São resultados esmagadores (votações que rondam os 90% em toda a linha e um presidente eleito com 98,3%) e suficientes para que Ventura sinta que tem o partido “mais unido do que nunca” — uma realidade que à partida para esta Convenção parecia abalada, mas que acabou por dar razão à linha da direção, com a oposição interna a ficar em casa, sem conseguir eleger delegados numa escolha que foi feita por uma fórmula maioritária e não pelo método de Hondt. Quem estava presente até pode ter sido escolhido a dedo, mas o Chega fez passar a mensagem de que os problemas internos estão arrumados e que é hora de o partido se focar no futuro. Como? Com o “amadurecimento” que notou no partido e com a Madeira como o primeiro objetivo. Aqui, o líder do Chega não faz a coisa por menos: vai fazer de tudo para entrar num executivo na região autónoma. Acordos com o dos Açores estão totalmente afastados.

Vamos percorrer cada rua deste país, não nos encerramos em São Bento nem na sede nacional, vamos denunciar a crescente imigração ilegal que destrói esta Europa, denunciar a destruição da família europeia, destruída sob os escombros de Bruxelas, denunciar a nossa luta de civilizações por uma Europa Cristã. Vamos ter nas eleições europeias o melhor resultado da nossa história eleitoral.

Os objetivos alinhavaram-se durante o fim de semana e André Ventura não quis deixar dúvidas. As promessas de que não fará política de secretária mantêm-se e serão repetidas mais à frente, mas há dois temas que tocou com esta frase: o Chega continuará a insistir no controlo das fronteiras nacionais e as eleições europeias não são uma brincadeira: o partido quer o melhor resultado da sua curta história. Tem uma coisa a seu favor: ao contrário do que acontece nas eleições legislativas, nas europeias há um círculo eleitoral único, o que quer dizer que todos os votos contam para eleger mandatos. Além disso, o Chega parte do zero porque não tem ninguém no Parlamento Europeu: qualquer eurodeputado eleito será uma vitória.

Vamos continuar a ser a única voz possível daqueles que perderam a voz. Durante todos estes anos, o PS no Governo, apoiado pela extrema-esquerda… Não queria dizer isto porque está a senhora ministra ali sentada, mas é verdade… Mas não permitiremos que reescrevam a nossa história e aqueles que hoje querem destruir uma nação que deu mundos ao mundo, que se orgulha de todos os territórios e daqueles onde levou a fé, cultura e literatura. A todos os que nos querem tornar numa história criminosa, dizemos que seremos os principais muros e baluartes contra reescritas da História. Aos ex-combatentes, aos centenas de milhares de retornados, dizemos que podem contar connosco, nós seremos a vossa voz no Parlamento português. Nunca deixaremos que tornem os homens e mulheres que vestiram e vestem a farda em criminosos ou bandidos da nação.

A esquerda foi um alvo a abater durante o discurso e André Ventura não poupou nas críticas e até parou para fazer notar a presença da ministra Ana Catarina Mendes como representante do Executivo. Porém, quis atacar a esquerda e a narrativa sobre determinados momentos da História para assegurar que o Chega não deixará que haja uma “reescrita” dessa mesma História. Aproveitou a passagem pelo tema para recordar um eleitorado-alvo, que era muito lembrado pelo CDS: os ex-combatentes e os retornados.

Seremos a voz daquele que, vítimas da corrupção, reclamam por uma justiça capaz, um país enredado da junta de freguesia à cúpula do Estado, enredado em escândalos de corrupção, na apropriação do dinheiro que é dos contribuintes e pela distribuição por décadas de clientelas, com o povo passivo e incapaz de se revoltar. Essa corrupção que nos memoriza e destrói será a nossa principal batalha para este mandato que agora começa.

O regresso ao tema da corrupção marcou o discurso de André Ventura, com o líder do Chega a atacar o país por ser incapaz de ter uma justiça que funcione para os cidadãos e pela presença da corrupção que diz estar enraizada desde as estruturas mais pequenas às maiores. A ideia do presidente do Chega é clara: se ninguém o faz, esta será a “principal batalha” do partido. As polémicas dos últimos meses, com várias demissões no governo, dão força a este discurso.

Lutaremos onde for preciso para que não continuemos a ter este país em que para quem trabalhou toda uma vida lhe deram migalhas e para quem trabalhou na TAP durante um ano lhe deram milhões. É esse país que vamos destruir, custe o que custar. Este país pertence aos portugueses de bem.

André Ventura usou o exemplo da TAP e das “portas giratórias” para distanciar os “portugueses de bem” dos que recebem “milhões” por indemnizações, uma referência clara ao caso de Alexandra Reis. É o “país de migalhas e milhões” contra o qual o Chega quer lutar. O culpado? “A esquerda bafienta e antiga, a esquerda estalinista, que se achava dona dos sindicatos e da rua e que agora tem agora um inimigo brutal”.

Dos professores desalentados com o Estado que os abandonou aos profissionais de saúde que há anos, entre governos do PSD e PS, pedem o mínimo de condições parar viver. Como é que um político que vem dos Açores para Lisboa tem direito a subsídio de deslocação e um professor e médico não?

Ventura seguiu a falar para as classes profissionais que quer seduzir e ao lado das quais se tem colocado sempre que tem oportunidade. Primeiro, os “professores desalentados”, depois os profissionais de saúde “abandonados” e por fim os culpados: governos do PSD e do PS, mas também a “classe política”, que, segundo disse o presidente do Chega, cria fossos entre políticos e os restantes cidadãos — e até exemplificou com os subsídios de deslocação.

É este país de uma classe política privilegiada que reclamou para si todos os subsídios, apoios, proteções legais e judiciais, mas não quer dar o mesmo aos seus. Hoje vemos a extrema-esquerda indignada no Parlamento a dizer que a banca não paga IMI, que as empresas não pagam IMI, que os mais ricos ou a classe média não pagam IMI, mas o PCP nunca pagou um cêntimo de IMI e pedem a nós que paguemos. É esta hipocrisia que mata o sistema político.

Aproveitou o embalo para descrever a “classe política privilegiada” que, realçou, só pensa nos protagonistas e atirou-se à extrema-esquerda e ao PCP pela “hipocrisia” de falar sobre o não pagamento de impostos por parte de “empresas e mais ricos”, mas não que não paga IMI.

Quando falamos dos portugueses de bem não queríamos criar escalas, guetos ou divisões, queríamos dizer que há milhões que toda a vida só quiseram um país um bocadinho mais justo. Há um filme que diz que este país não é para velhos, o nosso [Portugal] não é para quem trabalha, é para quem prefere não fazer nada e para outros que preferem viver à custa de quem trabalha. (…) Mas o pior é uma classe de subsidiodependentes que perceberam que é melhor viver do Estado do que do trabalho e pouco a pouco começámos a crescer e hoje há metade de um país a trabalhar e a outra metade a viver de quem trabalha.

Foi o momento da explicação de uma das frases mais badaladas de André Ventura, de uma das expressões que virou bandeira no Chega: os portugueses de bem. O presidente do partido aproveitou o momento para argumentar que nunca quis guetizar cidadãos, mas não precisou de muito tempo para reiterar a ideia de sempre: há portugueses que trabalham e há portugueses que vivem à custa desses mesmos trabalhadores. Isto deixa claro que o Chega não vai deixar cair uma das suas bandeiras mais conhecidas.

Quando ontem vos dizia que agora que superámos esta fase ninguém ganha nada em olharmos para dentro, em resolver o problema da fantasiosa oposição que não existe, o que temos de olhar é para o que nos pedem, que o Chega seja a voz de quem trabalhou a vida toda.

A curta frase que dedicou aos problemas da vida interna demonstra bem a importância que André Ventura lhe dá: pouca ou nenhuma. Resolveu a questão com uma referência à “fantasiosa oposição que não existe” e arrumou o assunto ao dizer que os portugueses não se preocupam com o que se passa dentro do Chega, mas com o que o partido tem para oferecer ao país.

Agradeço-vos o mandato, prometo-vos, com todas as dificuldades, as armadilhas do partido, as falsas insinuações e todas as mentiras, continuaremos a seguir o nosso caminho porque sabemos que no fim do caminho está o prémio que merecemos. Este partido não nasceu para protestar, não só para conquistar ruas, para ter 15 ou 20% nas sondagens, para ter o terceiro maior grupo parlamentar ou o segundo, nasceu com o único objetivo que era honrar esta bandeira e governar Portugal.

Tratadas as questões internas, focou-se no “prémio” final. André Ventura reiterou que o Chega não é um partido de protesto e que está preparado para governar — contando que o partido conquiste as ruas (que quer provar que não são da esquerda) para consolidar os resultados das sondagens, porque ser a terceira força política e ter 15 ou 20% nas sondagens não é um fim para Ventura — é uma passagem. Mas, ao longo desta convenção, não se falou uma única vez do anúncio, feito há tempos por Ventura, de criar um sindicato ligado ao Chega.

Podem estabelecer as linhas vermelhas que quiserem, podem fazê-las vermelhas, roxas, amarelas, lilases ou da cor que quiserem, até podem fazer da cor LGBTQI qualquer coisa… Falam em linhas vermelhas, mas nunca vi linhas vermelhas para a corrupção. Há linhas vermelhas para governar com o Chega porque exige uma justiça forte, quer punir pedófilos, quer uma carga fiscal mais baixa, porque vai para a rua e defende professores, profissionais de saúde, prisão perpetua… aí há linhas vermelhas, mas governar com um partido que tem um ex-primeiro-ministro a ser julgado por corrupção nunca houve linhas vermelhas. O único que pode estabelecer linhas vermelhas chama-se povo, os outros podem escrevê-las num papel, pô-las num guardanapo e atirá-las pelo carro porque valem o mesmo que um cinzeiro mal lavado, valem zero.

Se governar é um objetivo e se André Ventura assumiu que não sairá vencedor nas próximas eleições legislativas, há um alvo a abater e chama-se “linhas vermelhas”. Aquelas que vão sendo traçadas pela esquerda (PS incluído, que nem marcou presença na sessão de encerramento) e pela Iniciativa Liberal e que deixam o PSD em maus lençóis pelos constantes pedidos de esclarecimentos sobre o que pretende fazer no futuro. Mas, para Ventura, as linhas vermelhas são apenas decididas pelos eleitores. Pelo caminho, ainda uma referência a José Sócrates, que agita sempre os militantes do Chega.

Um grande homem do distrito de Santarém dizia: quando todos nos atacam e as espadas caem sobre nós, aqui é que se revela o melhor do nosso espírito. E quero prometer-vos que, à medida que atacam mais, que espezinham mais, que dizem que somos racistas, xenófobos ou fascistas, é nessa forma que nos tornaremos mais fortes. Vamos lutar terra a terra, rua a rua deste país até sermos governo de Portugal e venceremos o Governo de António Costa neste país, porque António Costa já chegou ao fim.

Um discurso de André Ventura sem citações nem é discurso. Desta vez, com uma reunião magna em Santarém, recorreu a alguém da terra para dizer que o melhor do homem aparece nas mais difíceis circunstâncias. E garantiu que, independentemente daquilo que se diga (“racistas, xenófobos ou fascistas”), o partido ficará mais forte e vai lutar para chegar ao Governo, vaticinando que o Executivo de António Costa “já chegou ao fim”, e que o Chega caminhará até às eleições para fazer parte de um novo governo.