“Para um melhor começo de vida, inicie a Cola mais cedo!”, pode ler-se em letras grandes no anúncio, a preto e branco, em que uma mãe olha embevecida para o seu bebé de meses, também ele sorridente, com uma garrafa de Coca-Cola a assomar no canto inferior esquerdo do cartaz.

Se a imagem parece pouco verossímil, o texto piora: “Quão cedo é cedo demais? ​​Nunca é suficientemente cedo. Testes laboratoriais feitos nos últimos anos provaram que os bebés que começam a beber refrigerantes durante o período formativo precoce têm uma probabilidade muito maior de serem aceites e de se ‘encaixarem’ durante aqueles anos esquisitos da pré-adolescência e adolescência”, continua a pretensa publicidade, assinada pelo “Conselho de Refrigerantes da América”, que tem sido partilhada nas redes sociais em todo o mundo.

“Portanto, faça um favor a si próprio. Faça um favor ao seu filho. Inicie-o agora mesmo num regime rigoroso de refrigerantes e outras bebidas carbonatadas açucaradas, para uma vida inteira de felicidade garantida”, conclui o cartaz, que já motivou até crónicas enraivecidas, como a de Mike Adams, aka “Ranger da Saúde”, publicada em 2010 no site americano Natural News.

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“Parece bizarro? Era a mensagem que o Conselho dos Refrigerantes da América promovia nos anos 50”, escreveu o colunista, para depois estabelecer um paralelismo entre a indústria dos refrigerantes, em meados do século XX, e a dos fármacos psiquiátricos no início do século seguinte. “Este marketing de produtos nocivos para bebés e crianças de tenra idade soa estranhamente familiar às táticas de marketing hoje exploradas pelas grandes farmacêuticas com os seus medicamentos psiquiátricos. As palavras são quase exatamente as mesmas: ‘Uma vida inteira de felicidade garantida’ ecoa a comercialização de qualquer número de medicamentos como a Ritalina, Concerta ou outros psicotrópicos.”

Ora, acontece que não só não existe qualquer organismo, agremiação ou associação chamado “Conselho dos Refrigerantes da América”, como nem sequer a rua da sua pretensa sede faz parte da toponímia de Chicago. Uma breve investigação permite concluir que tudo neste cartaz é falso, uma brincadeira que, mais de duas décadas depois de ter sido feita, continua a ser partilhada como se fosse real.

No dia 4 de março de 2002, há mais de 20 anos, o ator, escritor e realizador americano J. D. Ryznar deixou um pedido no LiveJournal, rede social na altura muito em voga no Estados Unidos: precisava que alguém — um “tipo esperto com o Photoshop ou algo do género, aborrecido no trabalho” —, lhe fizesse um favor.

A saber: “Criar um anúncio do ‘Conselho de Refrigerantes da América’ a anunciar os benefícios de dar refrigerantes aos bebés”, escreveu, para depois deixar um briefing mais detalhado aos potenciais interessados. “Quero pelo menos uma fotografia de um bebé com uma lata de refrigerante e uma frase. Algumas ideias para a escrita: ‘Promove um estilo de vida ativo’; ‘Impulsiona a Personalidade’, ‘Vai perder dentes de bebé de qualquer maneira’, ‘Dá açúcares essenciais ao corpo’.”

No final, explicou o porquê de tão estranho pedido: “Há um gajo no trabalho que tem um bebé, e eu passo a vida a dizer-lhe que ele tem de dar-lhe refrigerantes, mas o cabrão não me ouve, por isso preciso de uma ‘recomendação oficial’ do Conselho dos Refrigerantes”.

Assim que leu a descrição, o também artista americano R.J. White pôs mãos à obra — aborrecido, era mesmo esse o seu estado, por isso em menos de nada acabou o cartaz, publicou a imagem na internet e achava que era o “fim da brincadeira”, escreveu em 2010 no Tumblr, outra rede social que na época também era muito usada, a explicar a origem do “anúncio falso” que entretanto tinha começado a ser partilhado online como se fosse real.

“É muito falso. Nunca existiu um Conselho de Refrigerantes da América. Nunca existiu uma organização que defendesse o consumo de refrigerantes para bebés”, acrescentou entretanto noutro texto, publicado no site The City Desk — porque desde então a imagem não parou de ser partilhada, como se fosse verdadeira. “Apesar disso, é reencaminhada e reencaminhada e reencaminhada novamente. Esta coisa vai sobreviver-me durante várias décadas”, exasperou-se então o autor.

Não terá servido de muito: em 2022, o anúncio continua a ser partilhado como se fosse verdadeiro.

Conclusão

O Conselho de Refrigerantes da América nunca existiu e, como tal, nunca fez publicidade à Coca-Cola nem recomendou o consumo deste ou de outros refrigerantes por bebés ou crianças. O anúncio que continua a ser partilhado nas redes sociais foi criado há mais de 20 anos, em 2002, por mera brincadeira.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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