A proteção animal esteve em destaque no debate deste domingo entre Inês Sousa Real e Luís Montenegro, com a porta-voz do PAN a assinalar a “incoerência” dos parceiros que o líder do PSD escolheu para integrar a Aliança Democrática.

“Senta-se ao lado de pessoas que defendem regressões anacrónicas, como a defesa das touradas”, acusou a deputada única. E acusou, referindo-se à proposta de integração da proteção animal na Constituição: “O PSD votou contra a proposta de revisão extraordinária da Constituição que o PAN apresentou.”

Montenegro tomou a palavra à representante do PAN, num momento tenso em que foi acusado de “silenciar” as mulheres: “A Inês sabe que essa preocupação constava do projeto de revisão constitucional do PSD e o que a Inês queria era enxertar no processo regular da revisão da Constituição um processo extraordinário circunscrito à matéria e nós tínhamos e temos nas nossas pretensões de mudança constitucional poder desenvolver a proteção animal”. O social-democrata acrescentou ainda que o Tribunal Constitucional já se pronunciou “no sentido de ser possível levar a cabo a produção dos efeitos que a lei da criminalização dos maus tratos a animais preconiza”.

Mas será que Sousa Real tem razão quando menciona o voto contra do PSD na matéria de revisão constitucional?

Em dezembro de 2022, foi criada uma Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Foram apresentados oito projetos de revisão constitucional que no seu conjunto compreendem 393 propostas de alteração, revogação e aditamento de artigos da Constituição. Todos ficaram por terra após a demissão do Governo de António Costa e a consequente dissolução da Assembleia da República.

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Ora, a proposta que Inês Sousa Real diz ter sido chumbada pelos sociais-democratas refere-se à “assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária pela Assembleia da República para assegurar a consagração da proteção de animais na Constituição”. Contou com os votos a favor do PAN, Bloco de Esquerda e Chega e com a abstenção da Iniciativa Liberal. Os restantes partidos — PS, PSD, PCP e Livre — votaram contra.

Ou seja, é factualmente verdadeiro que o PSD tenha votado contra este projeto de revisão constitucional extraordinária. No entanto, não é de somenos lembrar o contexto da votação, já depois da demissão do Governo que precipitou as eleições de 10 de março e a dissolução do Parlamento e, também, o processo de revisão constitucional em curso, que caiu na totalidade, incluindo todas as propostas de todas as forças partidárias.

Inês Sousa Real já tinha feito a mesma acusação a Rui Tavares, porta-voz do Livre, que também votou contra o processo de revisão constitucional extraordinária apresentado pelo PAN. Em declarações ao Observador, o deputado único justificou o voto com o facto de o PAN querer que a Assembleia da República “assumisse poderes extraordinários de revisão constitucional já após a demissão do Governo e num momento em que já estávamos em crise política”. Rui Tavares entende que se estaria a dar um livre passe ao PS e ao PSD, que juntos perfazem dois terços do Parlamento e “a capacidade de mudar a Constituição a poucas semanas das eleições”.

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“Por muito que gostemos de um determinado tema, não devemos normalizar esse tipo de metodologia”, apontou o político e admite que o Livre deixou cair propostas como a “defesa da língua mirandesa”, pelas quais tinha grande apreço, tal como o PAN tinha pela proteção constitucional dos animais. Para o líder partidário, “se amamos verdadeiramente uma causa, mais obrigação temos de a proteger e não deixar que ela seja colocada sobre a sombra de uma suspeição de que as coisas não estão a ser bem feitas”.

Do lado de Inês Sousa Real, o entendimento é outro. Diz que o Livre apresenta uma “desculpa de mau pagador” e considera que a AR perdeu uma oportunidade de acautelar constitucionalmente a proteção animal. “Voltámos a apresentar esta proposta, antes da dissolução, para garantir que conseguíamos aproveitar o trabalho que já tinha sido feito, porque já tinha havido toda a auscultação que era aproveitável”, afirmou e teme que  depois de 10 de março “não volte a ser atingida” a meta para esta aprovação.

Conclusão

É verdade que o PSD votou contra a proposta do PAN que visava a assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária pela Assembleia da República para assegurar a consagração da proteção de animais na Constituição. Há que destacar, no entanto, o contexto da votação, já depois da demissão de António Costa e perante a dissolução da Assembleia da República.

Nota Editorial: Artigo atualizado às 13:01 com a alteração da classificação de “Enganador” para “Esticado”. A afirmação de Inês Sousa Real é factualmente verdadeira, ainda que tenho deixado de fora o contexto em que a votação da integração da proteção animal na Constituição decorreu.

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