O Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), constante da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, alterou profundamente, entre outras inovações, o sistema de governo das instituições universitárias e politécnicas. O modelo até então vigente ainda incorporava a herança do período que se seguiu ao 25 de abril, designadamente na distribuição dos eleitos para os diversos órgãos, à exceção, obviamente dos conselhos científicos, entre docentes e discentes, estes em igualdade de número e de funcionários não docentes, em proporção menor.

A ideia subjacente ao novo modelo foi a de reservar para membros exteriores às instituições personalidades exteriores às mesmas, aparentemente para que a sociedade tivesse uma participação ativa no seu governo.

Com esse objetivo, procedeu-se genericamente à substituição de um modelo de eleição direta dos órgãos universitários, quer a nível das escolas, quer das universidades ou institutos politécnicos, por eleições indiretas de parte dos seus membros, escolhendo estes, por cooptação, os referidos elementos exteriores às Instituições.

Infelizmente, a prática não demonstrou a adequação do modelo. Os elementos exteriores cooptados, usualmente personalidades conhecidas e de prestígio profissional ou empresarial, não demonstraram genericamente, salvo muito raras e honrosas exceções, qualquer empenho no conhecimento dos problemas das instituições, sendo frequentes as faltas a reuniões, e tendendo a considerar que o seu dever é apoiar em tudo as maiorias que os designavam.

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Muito mais grave que isto foi a total alienação dos docentes em relação ao governo das escolas. Ao restringir-se a números muito reduzidos os eleitos para os órgãos oriundos do corpo docente, produziu-se um afastamento deste corpo eleitoral da vida das instituições, a quem passou a ser suprimida qualquer informação sobre o que se passa nas escolas, criando-se condições para a perpetuação no poder de pequenos grupos.

O RJIES contemplou ainda soluções incompreensíveis, como a paridade de alunos e professores nos conselhos pedagógicos, passando, por exemplo, os critérios de avaliação de quaisquer graus, incluindo mestrados e doutoramentos a ser estabelecidos por alunos de cursos de licenciatura.

A eleição direta dos reitores das universidades e dos presidentes dos institutos politécnicos, que foi sempre o momento mais relevante da vida democrática das escolas, foi substituída por uma eleição indireta e mesmo esta parcial, tendo em vista a cooptação de parte dos membros dos órgãos a quem passou a caber a eleição.

Os conselhos científicos a quem cabe a abertura de concursos, a escolha de membros de júris e a estruturação do ensino e da investigação, foram reduzidos a números mínimos de membros, tendo-se verificado uma tendência para a sua sujeição aos órgãos diretivos unipessoais.

Os senados universitários foram esvaziados de quaisquer funções relevantes e as assembleias de representantes suprimidas.

Sem pôr em causa a bondade das intenções dos autores do projeto que esteve na base da lei, é altura de voltar a refletir nos seus efeitos e de abrir o debate sobre a sua revisão.

É, aliás, o próprio RJIES que prevê que a sua avaliação deveria ser feita cinco anos após a sua entrada em vigor, ou seja, há oito anos.

Manuel de Almeida Ribeiro é Professor do ISCSP (Universidade de Lisboa)