Quatro anos de instabilidade sob a administração de Donald Trump culminaram, em 2020, numa vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais. A política de ódio racial, de género, de religião teve o seu término dentro da Casa Branca. Destas eleições saiu um Partido Republicano que, ao invés de aprender com os seus erros, manteve o discurso da radicalização e do dogma, nomeadamente em áreas como as armas e o aborto.

Nasceu a esperança de que a nova liderança americana restabelecesse pactos com a Europa, reentrando nos Acordos de Paris e revitalizando alianças defensivas que, para muitos, já haviam perdido o seu propósito fundacional. Todas as esperanças se concretizaram. O presidente incumbente lidera agora a agenda climática mais ambiciosa que o seu país já viu, comprometendo-se com as energias renováveis e com a redução do consumo de combustíveis fósseis em 40% até 2030, num investimento de 369 mil milhões de euros por via do Inflation Reduction Act (Lei da Redução da Inflação).

Coordena também um conjunto de políticas económicas marcadamente progressista, ineficiente para o nosso país, mas altamente necessária numa nação cuja regulação corporativa, nomeadamente no âmbito da sua taxação, foi gradualmente fazendo caminho para a inexistência desde o neoliberalismo da denominada “Reaganomics”, a economia de Reagan. Tudo isto enquanto sucede em reduzir o défice, uma preocupação que descredibiliza os argumentos dos Republicanos de que qualquer política democrata leva à destruição económica, especialmente do saldo despesa/receitas. O resultado das suas políticas é claro; poucos meses de uma inflação de 9%, esta reduziu-se para menos de 5% em Maio, abaixo das previsões de mercado e da nossa taxa nacional inclusive.

Deu-se um claro abrandamento dos preços da alimentação (1%), assim como até a redução do preço dos combustíveis em 12.2% num mês, na gasolina, e, no mesmo período, em 20%, no gasóleo, assim como de 6.4% nos custos energéticos generalizados. Biden garantiu resultados e previsibilidade e foi bem-sucedido no combate à crise derivada da Guerra da Ucrânia, não a usando como justificação para a inação.

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Para além disso, as corporações são agora obrigadas a pagar uma taxa, o equivalente ao nosso IRC, de 15%, ainda 6% abaixo da portuguesa, o que, de acordo com todos os relatórios, não afugentou nenhuma grande sociedade gestora nem levou à falência de negócios e à perda de emprego. Aliás, desde Janeiro de 2021, mês e ano em que a nova administração tomou posse, foram adicionados mais de 12 milhões de postos de trabalho à economia, poucos deles precários e muitos na área da indústria, agora em crescimento depois de duas décadas de declínio.

Um Presidente de facto idoso provou, nestes dois anos, que não perdeu o contacto com a realidade e que conhece as idiossincrasias do sistema em várias matérias, apresentando múltiplas soluções estruturais. Dessas destaco a Lei dos Chips e da Ciência (Chips and Science Act), que atribuiu 52.7 mil milhões de dólares à pesquisa, manufatura e desenvolvimento de semicondutores. Desses, 39 mil milhões consistirão em incentivos ao fabrico de modo a reduzir significativamente a dependência externa de países asiáticos que detêm, atualmente, o monopólio destes instrumentos utilizados em todos os aparelhos do nosso quotidiano, desde logo automóveis, frigoríficos, telemóveis entre tantos outros igualmente necessários. É também um plano com indícios de executar benefícios gigantes para o emprego, com uma empresa só, a Micron, a anunciar 40.000 novos postos de trabalho num só projeto. Os chips e sua produção, assim como a sua distribuição produtiva pelos vários países, vai ser , com os EUA agora responsável por 10% da comercialização mundial, uma subida de 8 p.p.

Falta-me agora abordar talvez o seu maior feito legislativo bipartidário, a lei de Infraestruturas, que inclui provisões para dar água limpa a todos os americanos, especialmente nas comunidades rurais esquecidas, substituindo os canos cada vez mais ferrugentos, consequência da sua antiguidade. A urgência ligada à resolução deste tópico relaciona-se com o facto de serem mais de 10 milhões de casas e 400.000 escolas cujo estado da canalização estava a afetar diretamente a potabilidade da água. 55 mil milhões de dólares foi o investimento realizado.

Em segundo lugar, garantiu o acesso de todos os americanos à internet de alta velocidade, sendo que até à sua aprovação seriam 30 milhões os agregados familiares sem acesso a serviços de rede minimamente aceitáveis. Aqui, a alocação de fundos excedeu os 65 mil milhões de dólares, uma quantia sem precedentes que vai afetar, não só o acesso, como a acessibilidade financeira a estes serviços.

Em terceiro lugar, investimento recorde na reparação de estradas e pontes, necessidades fundamentadas no facto de 1/5 das estradas e 45.000 pontes serem consideradas, num relatório do Gabinete de Infraestruturas, pobres no sentido da sua manutenção. Na perspetiva do Presidente, 110 mil milhões de dólares é suficiente e vários senadores do partido de Trump concordam. E mesmo aqueles que votaram contra o projeto aproveitaram-se das melhorias para fazer campanha para as eleições intermédias do ano passado. A lei também inclui artigos e financiamento aos transportes públicos, às estações de carregamento de veículos elétricos, à modernização aeroportuária e aos meios de deslocação amigos do meio ambiente. Com Biden, não é para falar, é para executar.

Por fim, resta-me apenas dizer que o ressurgimento da NATO, assim como da sua importância geoestratégica, legitima a política norte-americana de relações com o estrangeiro. É uma administração empenhada no fortalecimento das relações com a Europa e no combate contra a agressão da Rússia à Ucrânia, tendo dado ao país o equivalente a 75 mil milhões de dólares em ajuda humanitária, financeira e militar.

“Há muito para fazer”, dizia John F. Kennedy no seu discurso inaugural em 1961, “mas vamos começar”. Aquando da sua morte, Lyndon B. Johnson, o seu vice-presidente, reforçou “Há dois anos prometemos começar, agora, deixem-nos continuar”. Ao povo americano digo, agora: “Espero que consigam”. Espero que Joe Biden consiga perdoar as dívidas universitárias dos estudantes em valores até 20.000 dólares e espero que adotem a política de expansão da sustentabilidade da Segurança Social por 50 anos que o vosso Presidente está a propor. “Espero que consigam” orientar-se pela missão incumbida ao mundo do Ocidente por uma democracia forte e global, um mundo em que os direitos de todos são respeitados independentemente de qualquer condição. Foi essa a promessa que fizemos quando derrotámos o totalitarismo nazi. Joe Biden está a segui-la. Porque não deixá-lo cumpri-la?

Para garantir a estabilidade, os EUA devem permanecer no caminho da tolerância e da diversidade, da ajuda internacional, da cooperação, da paz. Um bully pode sempre desincentivar desobediência, mas é também sempre uma questão de tempo até que os outros não gostem de ser encostados à parede, e a América vai pagar a fatura de uma nova administração Trump, uma administração liderada por um bully.

Por isso é que, se fosse americano: Joe Biden 2024.