Desde que o Hamas iniciou a guerra, os meios de comunicação não largam o assunto e as opiniões são quase tantas como as cabeças que as emitem, com as diferentes clientelas ideológicas a defenderem as suas diferentes posições. Todavia a verdadeira questão é o que resultará desta guerra: (a) alguma clarificação que possa abrir o caminho a novas iniciativas de paz dos “Dois Estados”; (b) a continuação da paz podre dos últimos quarenta anos com as mortes e os custos inerentes.

Para já suspeito que se o exército de Israel invadir em força o Norte de Gaza para, como prometeram, exterminar os militantes do Hamas, a tarefa não será fácil. Será uma batalha urbana em que os tanques do exército israelita poderão ser com relativa facilidade destruídos nas ruas e vielas e do alto dos edifícios já destruídos ou em fase de destruição durante a batalha. Posso supor que haverá muitas baixas de ambos os lados e, entre todos, muitos inocentes palestinianos e certamente os reféns.

Em qualquer caso, resultará essencialmente o enfraquecimento das duas partes que, com diferentes armas, têm impedido há muitos anos uma solução pacífica para o conflito: o governo de Israel e a sua política expansionista feita à custa das populações de Gaza e da Cisjordânia e os grupos extremistas como o Hamas que não aceitam a sobrevivência do Estado de Israel. Ou seja, salvo melhor opinião, qualquer que seja o fim do conflito, com o enfraquecimento destes dois contentores, abrir-se-ão novas oportunidades para a paz.

Desde logo, porque sem um Hamas forte e bem armado será mais fácil a uma qualquer entidade palestiniana liderar uma evolução democrática e pacífica em Gaza e na Cisjordânia. E, com alguma sorte e com alguma ajuda da opinião pública, será mais provável que o primeiro-ministro Benjamim Netanyahu e seu o governo sejam julgados pelos crimes que cometeram ao longo dos anos e, nomeadamente, pela morte recente de mais de um milhar de israelitas inocentes às mãos dos fanáticos do Hamas, porque uma parte do seu exército estava a proteger os colonatos na Cisjordânia e a matar palestinianos.

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Ou seja, no cenário que descrevo, com o provável enfraquecimento dos participantes nesta guerra, pode ser o tempo ideal para uma intervenção internacional decisiva para durante alguns anos   governar a região, com o objectivo de criar as verdadeiras condições para a solução dos dois Estados sonhados em Oslo. Para que esta visão possa ser realidade será desejável uma intervenção das Nações Unidas, pouco provável, mas principalmente dos Estados Unidos e da União Europeia. Uma intervenção desejavelmente dirigida por estadistas, se os houver, nomeadamente de quem esteja nas melhores condições de influenciar o enfraquecido governo de Israel, neste caso os Estados Unidos. Ainda porque pode manter na região os porta-aviões e demais material militar que, suponho, será suficiente para manter calmos – já que não será possível manter calados – os países da região.

Este plano tem três problemas: (1) não estou certo de que os fanáticos do Governo de Israel avancem mesmo com os tanques sobre Gaza; (2) o que fará Putin, que penso se manterá a tentar resolver o seu problema na Ucrânia; (3) finalmente a China, que poderia aproveitar a concentração de meios norte americanos no Mediterrâneo para resolver o seu diferendo em Taiwan, o que, para já, não creio.

Em resumo, na história dos povos não existem muitas oportunidades dos maus se destruírem uns aos outros, porque normalmente tentam primeiro destruir os bons, como aconteceu na Segunda Grande Guerra Mundial e noutras guerras. Por isso, se o cenário em equação em Gaza se realizar, envolvendo as duas partes que mais se têm oposto a uma solução pacifica da questão palestiniana, é o tempo certo para uma intervenção internacional das democracias.

Notas: 1. Já depois de ter escrito estas linhas acabo de ver na televisão a tragédia de um ataque a um hospital de Gaza com uma centena de mortos. Não se sabe ainda de quem é o ataque, mas seria demasiada estupidez se a origem estivesse em Israel. Mas não interessa, naquela região, como em grande parte do planeta em que vivemos, cada um acredita naquilo que lhe dá jeito. 2. Se nos próximos dois dias — quarta e quinta-feira – a fronteira de Gaza não for aberta para a entrada de ajuda humanitária destinada aos palestinianos, isso representará uma pesada derrota para o presidente Joe Biden e para os Estados Unidos.