O Estado sou eu”, a máxima em que Luís XIV, o Rei Sol, baseava a teoria da monarquia absoluta, aplica-se Mutatis mutandis a António Costa. Com efeito, Costa, com algum mérito, mas também muito demérito dos adversários, principalmente de Rui Rio, conseguiu contra todas as expetativas e sondagens alcançar uma maioria absoluta, apesar do desastre que foi a sua governação, em que Portugal se atrasou ainda mais em relação aos seus concorrentes diretos na UE. Mas, na política, como às vezes no futebol, ganha quem não merece, uma vez que a estratégia e a tática sobrepõem-se ao conteúdo. Contudo, o que conta é a vitória.

António Costa tornou-se o senhor absoluto de Portugal. Tem o país mais à esquerda e mais socialista da Europa Ocidental a seus pés. Até se deu ao luxo de estabelecer linhas vermelhas, pois falou com todos os partidos depois das eleições, menos com o Chega, que foi a terceira força política, com quase meio milhão de votos e doze deputados. Mas falou com partidos que apoiam ditaduras cruéis e desumanas e que, em nome de alegadas fidelidades ideológicas, são condescendentes com a guerra na Ucrânia e aquela barbárie. Estes são normalizados pelo sistema, tiveram e podem ter vice-presidentes da Assembleia da República. O que Costa faz é o jogo de cintura da chamada ditadura do politicamente correto: “ L´État c´est moi”.

Mas a verdade é que muita gente, a começar pelo ex-presidente da AR e pelo atual, ainda não percebeu que essa tática não tem resultado. O PAN e o LIVRE, com apenas 1 deputado, tiveram um tratamento que o Chega não teve na legislatura anterior.

Com a maioria absoluta alcançada, a nomeação de boys e girls do PS já começou no governo, com os ministros e secretários de Estado. Os putativos sucessores de Costa entram todos no Governo, “ele baralha e dá de novo”.

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Ana Catarina Mendes é promovida a ministra-Adjunta e dos Assuntos Parlamentares; Pedro Nuno Santos, continua nas Infraestruturas, Transportes e Habitação; Marta Temido permanece na Saúde; Mariana Vieira da Silva, ministra da Presidência do Conselho de Ministros e Fernando Medina nas Finanças. Este último, depois da inesperada derrota na Câmara de Lisboa, é promovido a ministro das Finanças, para surpresa geral do país. Foi este senhor que deixou a Câmara de Lisboa de “pantanas”, que denunciou os opositores russos de Putin e que apoiou uma presidente de Junta, a tal Margarida Martins, suspeita de peculato e abuso de poder, que, no mercado de Arroios, “esfolava” os munícipes, comprando o que queria sem pagar. Este ministro não tem o mínimo de credibilidade que o recomende para um cargo de tal importância e responsabilidade, mas Costa põe e dispõe: “L´État c´est moi”.

Estamos em presença do Governo mais socialista de sempre, por isso haverá mais lealdade, mais peso do chefe, os ministros serão mais submissos e com menos liberdade para decidir e romper, com pouca abertura à sociedade civil. Em suma, um Governo com o epicentro no Largo do Rato.

O núcleo duro do Governo são todos camaradas do PS e outras figuras demasiado subordinadas à figura tutelar de António Costa. Temo, por isso, que, com esta maioria absoluta, temos o caldo perfeito para crescer o clientelismo, o despesismo e a corrupção.

O Primeiro-Ministro, no discurso de tomada de posse, já começou a atirar areia para os olhos dos portugueses. Diz que virou a página da austeridade mas sabemos, e confirmam os economistas mais independentes, que o que fez o Governo foi dar com uma mão e tirar com a outra, pois diminuiu os impostos diretos, aumentando os indiretos e as cativações. Virou a página da pandemia, com proibições e medidas inconstitucionais, mas Portugal foi, durante semanas, o pior país do mundo em casos e mortes. Agora diz que vai virar a página da guerra, mas já sabemos que é com mais inflação e o preço da gasolina entre os mais caros da Europa, devido à brutal e vergonhosa carga de impostos. Este senhor não tem emenda, é um mentiroso compulsivo e um verdadeiro “vendedor da banha da cobra”.

António Costa, mesmo com maioria absoluta, não anuncia reformas e medidas de longo prazo, designadamente para combater o envelhecimento da população. Ele sabe que fazer determinadas reformas significa perder popularidade e pode implicar perder eleições. Está no ADN do PS controlar tudo e todos, isto é, os poderes e instituições do Estado para satisfazer e alimentar as suas clientelas. Por isso, nos meios socialistas, atendendo a que o PSD não tem maioria na Câmara de Lisboa, fala-se em fazer o cerco a Carlos Moedas e destroná-lo de presidente. Então, o PS tem o poder absoluto no país e não tem na capital?

As transferências de Bruxelas, a designada “Bazuca”, são o ouro do Brasil da atualidade, que irá continuar a alimentar o exército eleitoral do PS, que é constituído por cerca de dois terços de dependentes, direta ou indiretamente, do Estado (funcionários públicos, reformados, desempregados, beneficiários do RSI, etc.). No fundo, os portugueses, com o seu voto, disseram que queriam mais do mesmo, isto é, mais socialismo, mais estatismo e mais impostos. O PS sabe que se reduzir os impostos e controlar a dívida fica com menos recursos para distribuir. E com este tipo de política, “está na cara” que o PS e Costa não precisarão e não vão dialogar com ninguém, pois quando precisavam não o fizeram, a não ser com a extrema-esquerda, porque o fariam agora? O diálogo de Costa e PS é e será sempre uma farsa, como foi depois das eleições, em que AD de Passos e Portas ganhou sem maioria. Foi António Costa que disse que seria ele próprio o garante de que o PS não pisaria o risco, acumulando as funções de jogador e árbitro: “L´État c´est moi”.

É neste contexto, e nesta conjuntura, que se prevê que Marcelo será um presidente corta-fitas, uma espécie de Rainha de Inglaterra. A indiferença do PS e Costa por Marcelo já começou com as fugas de informação sobre os nomes dos ministros. O presidente ficou irritado porque diz que soube dos nomes pela Comunicação Social. Ora, não sejamos ingénuos, esta informação saiu para a comunicação social de forma deliberada.

É o primeiro sinal do “presidente jarra”. Não tenhamos dúvidas, Marcelo vai perder protagonismo e poder com esta maioria absoluta, os seus recados e observações vão cair em “saco roto”. Sem maioria, Marcelo tinha bastante poder, as suas recomendações e recados eram ouvidos e tidos em conta pelo Governo sendo que também foi cúmplice da maior parte das políticas do anterior executivo.

O presidente Marcelo até forçou a saída da Ministra da Administração Interna, Constança Urbano Sousa, por causa dos incêndios de Pedrógão. Agora que o PS tem maioria absoluta, não vai ligar nada ao que diz Marcelo, podendo até vingar-se de alguma “tropelia” do passado. Foi um destacado dirigente e ministro do PS, já falecido, que disse “quem se mete com o PS leva” e Marcelo não está livre de levar. Ele pode espernear, mas não será muito mais do que uma figura decorativa, como um jarro no meio da sala. Sem presidências abertas, mesmo com a sua imaginação e capacidade de comentar tudo, cairá sempre na irrelevância política. O PS, detentor de uma maioria absoluta, tornou-se hegemónico na sociedade portuguesa, se calhar por isso muitos socialistas já vieram para a praça pública anunciar que “maioria absoluta não é poder absoluto”. É o que veremos.