A proteção facial é feita com máscara cirúrgica, com respiradores filtrantes e com máscaras comunitárias, com o objetivo de se reduzir a transmissão de infeções.

A seleção da proteção a usar é feita em função de diversos critérios, nomeadamente, a aplicação a que se destina e o nível de proteção desejado.

Têm todas funções e características distintas. As comunitárias não se destinam a uso pelos profissionais de saúde. As cirúrgicas são mais indicadas para utilização em instituições de saúde, por profissionais de saúde e por pacientes com doenças infecciosas. Só protegem da transmissão por gotículas, enquanto que os respiradores protegem da transmissão por gotículas e por aerossol.

As máscaras cirúrgicas são sempre descartáveis e destinam-se a impedir a projeção de gotículas a partir das vias aéreas superiores. São também usadas pelos doentes infetados para evitar que eles contaminem outros doentes ou o meio ambiente. A eficácia das máscaras cirúrgicas é testada do interior para o exterior, ou seja, o que se testa é a sua eficácia na prevenção da contaminação a partir do ar expirado e não a sua eficácia na prevenção da infeção a partir do ar inspirado.

Os respiradores são reutilizáveis e protegem da transmissão de agentes infecciosos, quer através de partículas quer por aerossol, com recurso à utilização de um filtro. O nível de filtragem depende do tipo de filtro utilizado. Ao contrário das máscaras cirúrgicas, os respiradores são testados no sentido do exterior para o interior, ou seja, o que se testa é a capacidade de prevenção da infeção a partir do ar inspirado e não a sua capacidade de prevenir a infeção a partir do ar expirado. Em suma, enquanto que nas máscaras cirúrgicas se testa a sua capacidade para prevenir que um doente infetado possa transmitir a infeção a outros indivíduos, nos respiradores mede-se a sua capacidade para evitar que o seu utilizador seja infetado por outros doentes infetados.

Na Europa, há dois tipos de máscara cirúrgica – as que têm um nível de filtragem bacteriana superior a 95% e as com um nível de filtragem bacteriana superior a 98% – e três tipos de  respiradores:

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  • os FFP1, em que a filtragem de aerossóis será no mínimo de 80% e a fuga para o interior no máximo de 22%;
  • os FFP2 em que a filtragem de aerossóis será no mínimo de 94% e a fuga para o interior no máximo de 8%;
  • e os FFP3, em que a filtragem de aerossóis será no mínimo de 99% e a fuga para o interior no máximo de 2%.

Teoricamente, os respiradores FFP2 ou FFP3 deverão ser o equipamento mais eficaz para proteger cidadãos e profissionais de saúde de serem contaminados por doentes infetados. Na realidade, como não havia evidência científica que comparasse a eficácia entre respiradores e máscaras cirúrgicas na proteção contra a contaminação dos profissionais de saúde no local de trabalho, o uso de máscara cirúrgica com essa finalidade foi sempre baseado no princípio da precaução. Para se tentar responder a esta dúvida, Lewis J. Radonovich Jr e colaboradores fizeram um estudo científico, que publicaram no JAMA, em 2019. Dos profissionais protegidos por FFP2, 8,2% foram infetados pelo vírus da influenza e entre os protegidos por máscara cirúrgica, 7,2% (P = 0,18) foram infetados, concluindo-se que não havia diferença significativa no grau de proteção. Com o mesmo objetivo, em Fevereiro de 2020, Youlin Long e colaboradores publicaram uma meta-análise, comparando a eficácia dos respiradores FFP2 e das máscaras cirúrgicas na prevenção da influenza. Foram analisados seis estudos clínicos randomizados, envolvendo 9171 participantes. A conclusão foi de que o uso de respiradores FFP2, quando comparado com o das máscaras cirúrgicas, não estava associado a um menor risco de infeção por influenza.

A mesma conclusão foi retirada pelo Centro de Medicina Baseada na Evidência, da Universidade de Oxford, através da meta-análise publicada a 24 de Março de 2020 e feita para os profissionais dos Cuidados Primários de Saúde. A conclusão foi de que a eficácia era semelhante para os respiradores FFP2 e FFP3 e para as máscaras cirúrgicas. Os autores destacaram, ainda, que a sua eficácia teria que ser considerada apenas em combinação com as outras medidas de proteção individual e que os respiradores estariam indicados apenas para proteção durante procedimentos geradores de aerossóis.

Num outro estudo, feito em 1607 profissionais de saúde num hospital de Hanói e publicado no BMJ a 26 de Março de 2015, por Raina MacIntyre, os autores compararam a eficácia do uso de máscaras cirúrgicas e comunitárias. A conclusão foi de que a incidência de infeção era significativamente superior no grupo que usou máscara comunitária, sendo a penetração de partículas de 97%, nestas máscaras e de 44%, nas máscaras cirúrgicas. Os autores concluíram que a falta de eficácia das máscaras comunitárias não recomendava o seu uso por profissionais de saúde.

Sima Asadi e colaboradores procederam à análise laboratorial da eficácia das máscaras cirúrgicas, dos respiradores FFP2 e das máscaras comunitárias de camada única e de camada dupla, lavadas e não lavadas, ao respirar, ao falar e ao tossir. Foi analisada a emissão de gotículas respiratórias de diversas dimensões (inferiores a 0,5 μm, de 0,5 a 1 μm e de 1 a 20 μm) e os resultados foram publicados na Nature, em Outubro de 2020. Poderão resumir-se em:

  • A eficácia da máscara cirúrgica foi semelhante à dos respiradores FFP2, com uma redução de emissão de partículas de 70 a 95%;
  • A eficácia das máscaras comunitárias foi inferior à das máscaras cirúrgicas ou à dos respiradores na proteção contra a emissão de partículas maiores do que 0,5 μm. No que se refere à emissão de partículas inferiores a 0,5 μm, o uso de máscara comunitária foi pior do que não usar ou, pelo menos, não conferiu proteção adicional;
  • O uso de máscara comunitária não lavada aumentou o risco emissão de todo o tipo de partículas e em todas as circunstâncias, em particular ao tossir, entre 50% e 600%.

Recentemente, a 10 de Dezembro, Clapp e colaboradores publicaram no JAMA as conclusões de um estudo científico destinado a analisar a capacidade de filtragem contra aerossol. Os autores compararam as máscaras comunitárias, cirúrgicas e os respiradores, tendo concluído que:

  • A eficácia das máscaras comunitárias variava entre 25% e 79%, com uma média de 30%;
  • A eficácia das máscaras cirúrgicas era de 71,5%;
  • A eficácia dos respiradores FFP2 era de 98%.

O SARS-CoV-2 é transmitido, essencialmente, por via respiratória. As gotículas são a principal via de transmissão, mas os aerossóis também poderão transmitir a infeção, ainda que em menor grau e em circunstâncias particulares. A transmissão por aerossóis (que são partículas com dimensões inferiores a 5 μm) ocorre mais em ambientes fechados e mal ventilados.

Sendo as gotículas a principal via de transmissão da infeção, e tendo estas dimensões superiores a 5 μm, tem-se considerado que as máscaras faciais poderão ser eficazes, como meio supletivo, na redução da transmissão da infeção. As orientações para uso de máscara na comunidade têm sido sempre baseadas no princípio de precaução, porque não havia sido possível encontrar evidência científica suficientemente robusta que suportasse a sua eficácia.

Na tentativa de que fosse possível produzir evidência científica mais robusta, durante o último ano foram desenvolvidos mais estudos científicos observacionais e prospetivos, bem como algumas meta-análises. Infelizmente, continuou a ser difícil formular uma opinião consistente, porque a par da evidência científica credível produzida, também foi produzido muito “ruído” ou seja, muita informação sem credibilidade científica produzida por pseudo-investigadores sem escrúpulos e que mais não representam do que manifestações de desonestidade intelectual.

Um bom exemplo de desonestidade intelectual é uma meta-análise feita na comunidade e que sugeriu algum efeito protetor do uso de máscara facial, baseada em três estudos observacionais. Trata-se de uma meta-análise sem valor probatório científico, porque se baseou em três pequenos estudos observacionais e não randomizados e que incluíram, no total, apenas 725 participantes, o que não permite retirar conclusões com significado estatístico.

Pelo contrário, numa outra meta-análise feita por Chou e colaboradores, publicada no Annals of Internal Medicine, em 24 de Junho de 2020, foi feita a revisão da literatura, tendo sido incluídos 39 estudos científicos, dos quais, 18 ensaios clínicos randomizados e 21 estudos observacionais, conduzidos na comunidade e em instituições de saúde. As conclusões retiradas pelos autores, foram as seguintes:

  • Nas instituições de saúde, o uso de respiradores FFP2 ou de máscaras cirúrgicas, foi associado a uma redução semelhante ao risco de infeção;
  • Alguns estudos observacionais, mas não nos randomizados e prospetivos, sugeriram que o uso de máscara comunitária possa estar associado a um menor risco de infeção por SARS-CoV;
  • Os ensaios clínicos randomizados conduzidos na comunidade mostraram pouca ou nenhuma diferença entre o respirador FFP2 e as máscaras cirúrgicas e nenhuma diferença, com significado estatístico, entre o uso das máscaras cirúrgicas ou de nenhuma máscara.

Num outro estudo de elevado valor científico, publicado em Maio de 2020 no New England Journal of Medicine, Michael Klompas e colaboradores procederam à revisão da literatura científica para avaliação da eficácia do uso de máscaras, tendo retirado as seguintes conclusões:

  • O uso de máscara fora de instalações de saúde oferece pouca ou nenhuma proteção contra infeções;
  • O uso generalizado de máscara poderá desviar a atenção da implementação de medidas de controle de infeção mais fundamentais;
  • É mínima a probabilidade de se ser contaminado por SARS-CoV-2 numa interação passageira num espaço público, bem arejado, por um período inferior a 15 minutos e a mais de dois metros de distância do paciente infetado.

Nos primeiros meses após o início da pandemia, o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças, a Direção-Geral da Saúde e a Organização Mundial de Saúde emitiram orientações acerca do uso comunitário de máscaras, como se passa a descrever sumariamente.

Orientações emitidas pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças a 8 de Abril de 2020:

  • O uso de máscara cirúrgica por profissionais de saúde deve ter prioridade sobre o uso na comunidade;
  • O uso de máscaras na comunidade poderá reduzir a disseminação da infeção, mas não se conhece o impacto do seu uso isolado para diminuir a transmissão da doença;
  • Evidências indiretas e limitadas sugerem que o uso de máscara comunitária poderá ser considerado, especialmente em espaços fechados e movimentados e nos transportes públicos.
  • O uso de máscara na comunidade deverá ser considerado apenas como medida supletiva e não como substituto de medidas preventivas estabelecidas (distanciamento físico, etiqueta respiratória, higiene das mãos, etc.).

Nas orientações emitidas pela Direção-Geral da Saúde, a 13 de Abril de 2020, destacava-se que a utilização de máscaras pela população não contribuía para aumentar a proteção de quem as utilizava, mas, sim, para prevenir a transmissão da infeção a outras pessoas. As orientações eram as seguintes:

  • Recomendado o uso de máscaras cirúrgicas por todos os profissionais de saúde, pelas pessoas com sintomas respiratórios e pelas pessoas que entrem e circulem em instituições de saúde;
  • Recomendação de que as pessoas mais vulneráveis devem usar máscara cirúrgica sempre que saiam de casa;
  • Recomendação do uso de máscaras cirúrgicas pelos grupos profissionais em que não esteja garantido o distanciamento físico, como sejam: profissionais das forças de segurança e militares; bombeiros; distribuidores de bens essenciais ao domicílio; trabalhadores das instituições de solidariedade social, lares e rede de cuidados continuados integrados; agentes funerários; profissionais que façam atendimento ao público;
  • É de considerar o uso de máscaras por todas as pessoas que permaneçam em espaços interiores fechados com múltiplas pessoas, como medida de proteção adicional ao distanciamento social, à higiene das mãos e à etiqueta respiratória (por aplicação do Princípio da Precaução);
  • O uso de máscaras na comunidade constitui uma medida adicional de proteção. Não dispensa a adesão às outras regras de proteção (distanciamento físico, etiqueta respiratória, higiene das mãos e utilização de barreiras físicas).

A 5 de Junho de 2020, a Organização Mundial de Saúde emitiu as seguintes orientações sobre o uso de máscaras no contexto da Covid-19:

  • Todas as pessoas com sintomas sugestivos de Covid-19 devem usar máscara cirúrgica e seguir as medidas adicionais, em particular, a higiene respiratória, a higiene frequente das mãos e manter distância física de outras pessoas de, pelo menos, um metro;
  • O uso generalizado de máscaras por pessoas saudáveis, em ambiente comunitário, não é apoiado por evidência científica direta ou de alta qualidade. Contudo, tendo em consideração os estudos científicos disponíveis e a dificuldade em manter o distanciamento físico em muitos contextos, aconselha-se o uso de máscara na comunidade em situações e ambientes específicos, como parte de uma abordagem abrangente para reduzir a transmissão de SARS-CoV-2;

Finalmente, é importante destacar aqui um estudo científico publicado a 18 de Novembro de 2020, por Henning Bundgaard e Johan Bundgaard, no Annals of Internal Medicine. Trata-se de um RCT (Randomized Controlled Trial) e como tal, produzindo evidência científica de classe 1-A, o nível mais elevado de evidência científica, que incluiu um total de 4862 participantes.

O estudo foi feito entre o dia 3 de Abril e 2 de Junho de 2020, na Dinamarca., num período em que as autoridades dinamarquesas não recomendavam o uso de máscara na comunidade.

As pessoas elegíveis foram adultos com mais de 18 anos de idade, sem sintomas atuais ou passados de Covid-19, que passassem mais de três horas por dia fora de casa e que não usassem máscara no seu trabalho diário. Foram recrutados 17.258 cidadãos e 6024 completaram o inquérito final. Destes, 3030 foram randomizados aleatoriamente para uso de máscara (máscaras cirúrgicas de alta qualidade, com uma taxa de filtragem de 98%) e 2994 para não usarem. No final, 4862 (80,7%) completaram o estudo e passaram, em média, 4,5 horas por dia fora de casa.

No final do estudo, ocorreu infeção por SARS-CoV-2 em 42 dos participantes (1,8%) do grupo com uso de máscara e em 53 (2,1%) do grupo controle. A diferença de 0,3 pontos percentuais (p=0,38) permitiu concluir que o uso de máscara, mesmo cirúrgica e de alta qualidade, não era acompanhado de uma redução de infeção por SARS-CoV-2 com significado estatístico.

Assim, no contexto do exposto, poderemos concluir que é evidência científica robusta, de Classe 1-A, que:

Em laboratório:

  • A eficácia da máscara cirúrgica é semelhante à dos respiradores FFP2;
  • As máscaras comunitárias protegem significativamente menos do que as máscaras cirúrgicas ou os respiradores e para partículas inferiores a 0,5 μm poderão agravar a transmissão, se mal utilizadas;
  • O uso inadequado de máscara comunitária pode aumentar até 600% o risco de transmissão da infeção;
  • A eficácia das máscaras comunitárias varia entre 25% e 79% (média de 30%).

Na proteção dos profissionais de saúde:

  • A diferença de eficácia entre as máscaras cirúrgicas e os respiradores não tem significado estatístico;
  • A eficácia das máscaras comunitárias é significativamente inferior à das cirúrgicas e à dos respiradores;
  • Os respiradores são mais eficazes na proteção em procedimentos geradores de aerossóis.

Na comunidade:

  • Não há diferença de eficácia entre o uso de máscara cirúrgica e máscara de respirador;
  • Quando comparado o uso e o não uso de máscara cirúrgica de alta eficácia, o seu uso não reduziu, com significado estatístico (p=0,38), a transmissão da infeção;
  • As máscaras cirúrgicas deverão ser usadas preferencialmente por indivíduos comprovadamente infetados, ou com sintomas que sugiram Covid-19, para prevenir que transmitam a infeção a terceiros. Deverão também ser usadas por pessoas mais vulneráveis e por grupos profissionais em que não seja possível garantir o distanciamento físico;
  • Os respiradores deverão ser usados preferencialmente para prevenir que os seus utilizadores sejam infetados, em particular, aquando de procedimentos geradores de aerossóis;
  • O uso de máscaras na comunidade constitui uma medida adicional de proteção, não dispensando a adesão às outras medidas de proteção.