Tenho ouvido mais recentemente e em diferentes contextos desde a saúde, à educação e às organizações, políticos e decisores falarem de prevenção, dos custos de só se investir para remediar problemas e do quão importante é mudar do paradigma da doença para o da saúde. Aplausos. Todos de acordo, não?

No entanto, e apesar deste aparente consenso as evidências no nosso país sugerem que das palavras às acções não vai só um grande passo, vão milhares de milhões de euros perdidos, de sofrimento evitável, de produtividade desperdiçada, de bem-estar não alcançado, de vidas pouco cheias de vida. Sim, não há como contornar a evidência científica que nos demonstra que um em cada cinco portugueses tem um problema de saúde psicológica, o que quer dizer que é bastante provável que nós, um dos nossos amigos, colegas, vizinhos ou familiares venham a passar por um problema de saúde psicológica.

Ainda que presente no dia-a-dia de todos, a saúde psicológica continua a estar circundada por estigma sustentado pelo preconceito, ignorância e medo. O cunhado que está desempregado e se isolou em casa e ficou deprimido, “não tem iniciativa, é um mole”. A estudante que falta aos exames na Universidade por não conseguir lidar com os níveis de ansiedade, “é uma preguiçosa que vive às custas dos pais” para o Director da escola. O colega de trabalho com quem o chefe grita e que já esteve de baixa é “um banana de personalidade fraca”. A prima que “não é boa dos nervos”, o que precisava era de um pulso firme. A mulher que trata da casa, dos filhos, do marido, do pai idoso acamado e que se queixa de dores de cabeça e de costas e chora todos os dias, “faz é fitas”. O encarregado de educação que ri sarcasticamente no gabinete de apoio ao aluno “olha!… Lencinhos para eles chorarem”. A madrinha que diz ao seu afilhado com fobia de animais “não sejas medricas, que até tenho vergonha”. O fornecedor que compara o serviço de psicologia a “o gabinete dos ostracizados”…

O que diria de uma pessoa que teve um AVC? E de uma pessoa com um cancro? O estigma é em si mesmo um dos principais obstáculos que as pessoas com um problema de saúde psicológica enfrentam e contribui para aumentar a dificuldade em encontrar e manter um emprego, fazer amigos e conviver socialmente ou pedir ajuda profissional, agravando o estado de saúde e tornando a recuperação mais lenta e difícil.

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Não obstante esta triste realidade, o Orçamento do Estado para a Saúde será em 2019 de 11 mil milhões de euros (mais 540 milhões que em 2018). Dedicará ele mais que no ano anterior para a prevenção? (Pasme-se, pois foi cerca de 1%). É igual a dizer que o Estado quase nada fará, com os recursos que são de todos, para evitar que os portugueses adoeçam, ignorando os conhecimentos científicos disponíveis que, se aplicados, contribuiriam para a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde e de outros sistemas e para a qualidade de vida dos Portugueses.

Mas haja esperança “por uma saúdinha da boa” porque como o Orçamento do Estado ainda se encontra em discussão, o tal passo de gigante entre as palavras e as acções pode ser encurtado em favor da prevenção da doença e promoção da saúde com a ampliação dos contributos de todos os parlamentares nos temas do sector da Saúde e também dos da Educação, da Ciência e Ensino Superior, da Justiça e do Trabalho e Segurança Social.

Teresa Espassandim, Psicóloga especialista em Psicologia Clínica e da Saúde, Psicologia da Educação, Psicoterapia e Psicologia Vocacional e do Desenvolvimento da Carreira