No passado dia 22 de Fevereiro, no programa Grande Reportagem da SIC, que aconselho a ver, foi-nos dada uma amostra daquilo que é o abandono a que votamos os nossos idosos, pelo que inicio com um título provocatório para captar a atenção do leitor. Naturalmente não é o que penso, bem pelo contrário.

Temos de honrar o nosso passado e aqueles que nos permitem hoje ser o que somos. Cuidaram de nós, contribuíram para a sociedade e são a quem temos o dever de retribuir. Na mesma medida, estamos a acautelar o nosso futuro e o mesmo deverá fazer a geração vindoura; é como se olhássemos para o “espelho do futuro”.

Costumo dizer que Portugal é um País muito desorganizado, muito mal gerido, duas das principais razões pelas quais somos pobres e não conseguimos criar riqueza. Ao contrário dos países ricos, desperdiçamos dinheiro e não resolvemos os nossos problemas. E penso que isso ficou bem patente nesta reportagem. Um qualquer hospital é uma estrutura cara, com recursos alocados cujo objectivo consiste em resolver os problemas de saúde mais graves. Cerca de 700€/dia é quanto custa uma cama num hospital, mas cerca de 10% estão ocupadas com pessoas que podiam estar nas suas casas, num Lar de Idosos ou ainda numa Unidade de Cuidados Continuados Integrados (UCCI). Desperdiça-se assim centenas de milhões de euros sem que se resolva os problemas das pessoas.

Há que fazer um trabalho que nunca foi feito, precisamente a tal organização que referi, isto é, avaliar as reais necessidades de quem já hoje está num hospital, numa UCCI, num Lar, em casa com apoio domiciliário e, naturalmente, quem está em casa sem apoio porque aguarda em lista de espera. Depois desta avaliação e cruzamento de informação, devemos alocar as pessoas ao apoio de que realmente necessitam e criar as vagas necessárias.

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Só assim resolvemos os reais problemas das pessoas e em acréscimo, gastaremos menos, na medida em que uma resposta domiciliária é 700 vezes mais barata, um Lar 35 vezes mais barato e uma UCCI 7 vezes mais barata, do que um hospital.

No entanto é preciso denunciar, aliás como no programa foi feito, que no apoio domiciliário é tudo feito à pressa, que os Lares de Idosos não têm a qualidade desejada e que os cuidados continuados estão a falir e a fechar portas. E o problema é sempre o mesmo, o Governo esmaga as instituições de solidariedade social, porque não actualiza os preços (o caso dos cuidados continuados como escrevi no último artigo há 1 semana) ou actualiza em valores que não chegam sequer para cobrir o aumento do salário mínimo, nem o aumento dos custos dos bens e serviços. O mesmo Governo que lança milhares de milhões para o SNS sem quaisquer resultados visíveis, e hoje, incrivelmente, o SNS está pior do que no período da Troika. Um Governo que não é capaz de pagar mais ao sector social nem aos cuidados continuados, o que é de deplorar, porque para além de colocar tudo a funcionar melhor, traria enormes poupanças globais ao Orçamento de Estado.

Quem não se lembra na Pandemia de ouvir repetidamente juras de amor, por parte do Governo, de que iria dar condições para aumentar os recursos humanos dos Lares, nomeadamente dotá-los de profissionais de saúde? Alguma coisa foi feita nesse sentido? NADA.

Sou licenciado em Recursos Humanos. Andei 4 anos a ouvir apregoar a importância das pessoas nas organizações, que não são meros números, que são vitais para o sucesso organizacional. O leitor sabe qual é o único critério de seleção que resta a uma IPSS para contratar um trabalhador para cuidar de crianças ou idosos? O critério da disponibilidade, ou seja, o candidato que aceitar a condição de ganhar o salário mínimo (e em muitos casos com salários em atraso). A maioria, só vem para este sector enquanto não tem oportunidade de conseguir outro trabalho e muitas deles não têm perfil para cuidar de seres humanos. No entanto, a legislação do trabalho é igual para todos e mesmo depois de várias ações de formação, torna-se muito difícil despedir aqueles que não têm perfil. É este o estado miserável do sector. Por contraposição há aqueles que trabalham por amor ao próximo, e mesmo sem salários dignos, mantêm-se anos a fio a cuidar do outro. Para eles, o meu eterno obrigado em nome dos que represento.

Repito, o Governo não atribui dinheiro suficiente para se cumprir sequer com o quadro legal (o qual, em muitas situações, o Estado não cumpre no que concerne à saúde e apoio social, mas que exige aos outros) quanto mais para dar qualidade de apoio aos utentes. O Governo discrimina quem trabalha nas IPSS, basta constatar que para a mesma função os trabalhadores ganham menos 60 a 80% do que no sector público (e trabalhando mais horas). O sector social e dos cuidados continuados, perderam nos últimos anos excelentes profissionais porque infelizmente não lhes conseguem aumentar salários; fruto da asfixia a que o Governo os vota (deixo como exemplo o facto do Governo não ter dado 1 cêntimo, nem uma máscara, no período da Pandemia).

Termino perguntando, até quando a nossa sociedade permite este tipo de situações? Permite isto de um Governo?

A comunicação social em geral, debate horas e horas a fio sobre política e futebol, mas não arranja espaço de debate para estes temas do sector social e dos cuidados continuados. Mas devia, todos envelhecemos e mais cedo ou mais tarde vamos precisar de um lar de Idosos ou de uma UCCI.