Foi anunciada há tempos a aprovação do lançamento de um concurso para aquisição de 117 automotoras elétricas. A compra inclui 62 automotoras para o serviço urbano (34 para a Linha de Cascais, substituindo as atuais 29, que têm mais de 50 anos; 16 unidades para reforçar as restantes linhas da Área Metropolitana de Lisboa – Sintra, Azambuja e Sado; 12 unidades para reforçar os serviços urbanos do Porto) e 55 automotoras elétricas para todas as linhas do serviço regional.

O investimento envolvido é de cerca de 819 milhões de euros, mas este material só começará a ser entregue em 2026. O objetivo principal é substituir o material obsoleto, como por exemplo na linha de Cascais, onde alguns comboios têm mais de 70 anos.

O investimento no modo de transporte ferroviário é bem-vindo, na linha, aliás, do que é há muito preconizado no Livro Branco sobre Ambiente da União Europeia, onde claramente se aponta este modo de transporte, a par do transporte fluvial, como altamente vantajoso do ponto de vista energético e ambiental.

Quanto à Linha de Cascais, muitos não terão ideia que se trata de uma linha com características próprias, diferentes das restantes linhas da rede nacional, da qual está totalmente separada. Pensou-se no passado na necessidade de uma eventual ligação da Linha de Cascais à rede geral, mas entre outras dificuldades de ordem física (e.g. o problema do nó de Alcântara), as avaliações de custo/benefício nunca lhe foram muito favoráveis.

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A definição de uma solução viável, eficiente e ajustada à realidade, baseada no actual modo de transporte ferroviário pesado, parece difícil de alcançar. Sendo certo que a forma como se equaciona o futuro da linha tem uma relação directa com a viabilidade da solução.

Segundo a ADFER, a quebra sustentada da procura na Linha de Cascais não se deve exclusivamente à deterioração do serviço, é reflexo de uma mudança económico-social que impactou de forma muito significativa a nossa sociedade depois da década de 80, com uma opção clara pelo transporte individual, culminando com a abertura da A5. Sendo um dos eixos fundamentais nos movimentos pendulares com Lisboa, a intermodalidade é muito débil.

Para além disso, a Linha de Cascais tem de ser encarada como um dos elementos no planeamento da mobilidade no eixo Cascais–Lisboa e é estruturante. Os planos de mobilidade das autarquias devem ter como primeira prioridade a integração modal, prevendo e coordenando serviços de rebatimento sobre a linha. A reabilitação e renovação do sistema é inevitável e deve servir em primeiro lugar as necessidades das populações abrangidas.

A exploração da Linha de Cascais no âmbito da Rede Nacional Ferroviária afigura-se também impossível neste momento. Para além das novas automotoras, seria também necessário proceder a outros investimentos, tais como mudar a tensão da catenária, construir uma ou duas subestações de tracção a 25kV AC, resolver o problema do nó de Alcântara, ou enterrar a via, pelo menos, a partir de Alcântara-Mar.

Há quase 20 anos o Metro do Porto expandiu a sua rede nuclear para dois concelhos vizinhos, tirando partido dos canais existentes das antigas linhas ferroviárias da Póvoa e da Trofa. Foi assim que o aeroporto Francisco Sá Carneiro foi o primeiro aeroporto nacional a ter uma ligação em modo ferroviário (ligeiro) e se garantiu a ligação ao progressivo concelho da Maia, onde chega a uma grande instituição de ensino superior, o ISMAI. Em ambos os casos, com evidentes vantagens sociais, económicas e ambientais.

Pergunto-me hoje, como há 20 anos, se não se deveria estudar a viabilidade de transformação da Linha de Cascais numa extensão natural do Metro de Lisboa. Transformar um modo ferroviário pesado em ligeiro, com vantagens do ponto de vista energético e ambiental, com ligação à rede de metropolitano já existente no Cais do Sodré e noutros previsíveis pontos futuros (e.g. Alcântara), com menos exigência de gabarit, com menores custos para enterrar a linha. Penso que valeria a pena pensar no futuro da área metropolitana. Quando foi construída a Linha de Cascais nem se sonhava com o metropolitano em Lisboa, a realidade metropolitana era completamente diferente.

Uma aposta nestas novas automotoras para a Linha de Cascais pode parecer boa, mas é muito curta. Não deveríamos parar, escutar e olhar mais ao longe?