Terminaram este fim-de-semana as candidaturas para o Portugal FinLab – “Where regulation meets innovation”, programa criado pelos três reguladores do sector financeiro (Banco de Portugal, CMVM e Autoridade Supervisora dos Seguros) e a Portugal Fintech (comunidade de fintechs portuguesa). O objectivo do FinLab é criar um canal dedicado de comunicação com o objectivo de clarificar o contexto regulatório para inovadores no sector financeiro, sejam startups ou incumbentes.

Olhando para o número de candidatos, que excedeu quase cinco vezes as vagas disponíveis, parece que o mercado confirmou que as fintechs vêem na regulação uma hipótese de diferenciação. Desta forma, Portugal junta mais uma vantagem em relação aos outros países, como destino para criar e fazer crescer fintechs. O programa volta a abrir candidaturas a 5 de Novembro deste ano, dia em que arranca o Web Summit, mas apesar destas boas notícias, Portugal tem ainda muito trabalho pela frente.

  1. Empreendedores. De todo o contexto fintech são o factor mais positivo desta transformação da realidade financeira. Não falta talento a Portugal, pessoas que fazem, arriscam e avançam com projectos que rapidamente se tornam sólidas e diferenciadoras realidades. Basta olhar para o caso da Feedzai, na detecção de fraude e a trabalhar com alguns dos maiores bancos mundiais. A James, que utiliza inteligência artificial para dar crédito de forma mais eficiente. A Loqr, que apoia a toda a autenticação da abertura de conta digital. A Switch que agrega todos os meios de pagamento. A Seedrs e a Raize que seja do lado do capital ou do crédito apoiam as empresas a financiar-se. A Drivit (ecossistema carro) e a Habit (ecossistema casa) que ajudam as seguradoras a ligar os dados do comportamento das pessoas aos prémios que os seus seguros realmente devem custar. Neste momento seria possível gastar todo o artigo com as mais de 50 fintechs que operam com ligação a Portugal.
  2. Reguladores. Têm-se desmultiplicado em iniciativas, conferências, estudos e inquéritos. Mas é assinalável a abertura demonstrada e o compromisso com o evoluir do impacto da tecnologia no sector ao co-criarem o Portugal Finlab. É um programa único a nível Europeu, pois é o único que não só reúne todos os reguladores financeiros como entidades que representam os inovadores. Poderá no futuro haver espaço para outros modelos de relação com os inovadores, como o modelo de Sandbox? Depende de muitos factores, mas os primeiros passos estão dados.
  3. Incumbentes. O sector parece ressuscitar de mais de meia década de estagnação e recuperação da pesada crise. A consciência do positivo que é a cooperação e investimento neste tipo de empresas parece começar a existir, mas os resultados práticos parecem estar ainda na sua infância. Há poucos bancos e seguradoras com metodologias correctas de cooperação, análise e implementação. Basta assistir a qualquer conferência do sector para se perceber que estas entidades se consideram também “fintechs” quando seria lógico considerarem-se “bancos e seguradoras” a usarem fintechs para servir melhor os seus clientes, de forma mais rápida, barata e simples.
  4. Governo. Infelizmente parece ser o elemento que mais trabalho de casa tem para fazer. Seria extremamente importante criar um contexto fiscal (tanto no IRC como no IRS) mais vantajoso e estável para Portugal, uma lei do trabalho descomplicada, tribunais céleres, etc. Todos estes fatores são importantes para que investidores internacionais ganhem confiança e invistam nas nossas empresas em rondas mais avançadas e avultadas. Mas surgindo este orçamento antes de eleições, é complicado sugerir este tipo de iniciativas. Felizmente há trabalho a fazer sem necessidade de incorrer em custos, como por exemplo desenhar o contexto para apoiar a componente legislativa de uma Sandbox regulatória e colocar recursos a trabalhar no projecto.

Portugal tem o essencial: os empreendedores. Estes lutadores — com ou sem apoios, WebSummits ou vouchers — vão impondo a sua tecnologia pelo mundo. Mas, tal como os reguladores fizeram com o FinLab, cabe aos intervenientes acima descritos irem criando as melhores condições para que tudo isto aconteça mais e melhor.

João Freire de Andrade é ‘head of venture capital’ na BiG Start Ventures. Fundador e presidente do BET e da Portugal Fintech, completou o curso de Fintech do MIT. Licenciou-se em Economia pela Nova SBE e tem um mestrado em Management and Finance da Católica LSBE, onde lecionou a primeira cadeira de Fintech num mestrado de Finanças em Portugal.

O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes. Irão partilhar a visão para o futuro do país, com base nas respetivas áreas de especialidade, como aconteceu com este artigo. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers.

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