De um passado longínquo promissor a um presente redutor

Fomos sempre, ao longo da nossa história, já enquanto nação, pobres que, quando perante a possibilidade de enriquecer e viver condignamente, recusávamos. Até parecendo que riqueza e condições condignas de um povo tem de ser simultaneamente sinónimo de rompimento com a sua identidade, quase que assumindo que se nascemos pobres, enquanto povo, para mantermos a nossa identidade cultura e valores, devemos continuar pobres.

Aconteceu com a época das navegações marítimas, as descobertas e a expansão do império além-mar, mais tarde com a primeira república, depois o estado novo – segundo alguns historiadores, a segunda república – e com ele a continuidade da mentalidade de pobres e desgraçados, onde apenas as classes dirigentes, políticas e elites sociais tinham a ganhar, uma vez que este estado de indigência garantia a incapacidade de um povo exigir, pensar e tomar o seu destino nas suas próprias mãos.

De um povo aprisionado à ignorância, com uma elite medíocre de dirigentes, com o total domínio e controlo do poder a ser dividido, entre elite política, religiosa e alguns fantoches do “regime”, a p(n)obre nação, viveu até aos dias da liberdade.

O 25 de Abril tinha chegado, com ele a esperança de que essa liberdade nos trouxesse políticos capazes, abnegados com a causa pública, os superiores interesses da nação e do seu povo. Esperavam-se políticos que, por virem do povo, construiriam uma nação a partir da visão de que “um povo culto, capaz e respaldado por uma sociedade construída nos valores de liberdade, faria uma nação próspera, justa e rica”. Nada viria a mostrar-se mais errado.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

De entre todas as promessas, da esquerda à direita, todas elas apenas se centravam em defender os seus valores ideológicos, que, por mais paradoxal que pareça agora, eram as primeiras importações da era democrática desse novo Portugal da suposta liberdade. Falharam esses políticos ao preterirem o caminho que realizaria um Portugal moderno no futuro, através do desenvolvimento da máxima de – um povo forte, faz uma nação capaz – em detrimento das máximas, da esquerda à direita de – um povo dependente e não pensante, faz um país submisso aos políticos, numa dança de poder de uma democracia bipolar.

Nos últimos 100 anos, passamos 41 anos numa ditadura não parlamentar e 48 anos numa ditadura de (par)lamentar. A primeira caracterizada pelo estado autocrático e a segunda pelo estado apático.

Nestes últimos 48 anos vimos chegar mais ventos e tempestades do que as prometidas bonanças que os cravos de abril anunciavam. Se os primeiros anos foram pautados pela desordem e desorientação de toda a sociedade, o que é normal, numa fase de transição de uma nação que esteve presa, por 41 anos, a um sistema redutor das liberdades, das iniciativas cívicas, empresariais e livre participação de um mercado aberto ao exterior, os anos posteriores e já pertencendo à avô da atual União Europeia, a então CEE, mantivemos o mesmo status enquanto nação. Nada mudou. Os políticos eram outros, iam-se revezando, mas as politiquices eram as mesmas. Geração após geração a sociedade ia-se renovando, o povo inculto ia adquirindo conhecimento, estudos e qualificações, mas as mentalidades permaneciam as mesmas.

E agora Portugal, como queres escrever a tua história?

As novas oportunidades estão aí. O mundo está a mudar, a reconfiguração devido à geopolítica do pós-guerra, a agenda do clima e as crises, alimentar e humanitária, daí decorrentes, colocarão Portugal numa espécie de encruzilhada de oportunidades únicas na sua história e para as quais precisamos de ter a audácia e bravura dos nossos antepassados que partiram rumo ao novo mundo, sob o olhar dos velhos do Restelo que os miravam e criticavam por não se resignarem ao fado de que, da inevitável pobreza em que nascemos, devemos morrer.

A localização e as características de Portugal, são condições únicas nesta nova realidade de desafios que enquanto humanidade enfrentaremos e que se colocarão ao mundo. Um país que tem uma área marítima exclusiva com um potencial único para a produção de energias verdes – eólica, fotovoltaica, hidrogénio e biocombustíveis, usando de novo este nosso mar, para lançamento das novas caravelas, as plataformas offshore que poderão tornar Portugal de novo a potência que foi no passado, hoje, perante um mundo dependente do que temos para oferecer.

Um mar que permite a criação de uma nova indústria de derivados, para cumprimento das novas necessidades que surgirão com a Agenda Climática, tanto na restituição e preservação dos ecossistemas marinhos, como na produção de ecoprodutos e, não menos importante, a constituição de uma nova indústria de captura de dióxido de carbono, através de florestas de algas marinhas, podendo esta tornar Portugal, não só o primeiro país europeu neutro em emissões de gases de efeito estufa (GEE), como ir além, tornando o nosso superavit um produto vendável a outros países, enquanto crédito de carbono e derivados, contribuindo com peso significativo para o PIB nacional e para a balança de exportações.

Será à luz esclarecedora do tempo e à lupa da história que poderemos dizer, após 2030 e 2050, se afinal o mundo criou novos paradigmas, trazendo novas oportunidades e a pobre nação, mais uma vez, recusou o papel de nobre povo.

Restará para a história um pobre ou um nobre povo?!

Hoje, esta é a incógnita a uma resposta que apenas dependerá de nós. Todos nós, enquanto nação, para tal devemos beber da inspiração característica do melhor dos nossos antepassados e não do pior que alguns outros desses nos entregaram, renunciando desta vez à constante negação da herança que agora, de novo, nos é prometida por uma urgência circunstancial mundial, intrínseca a toda a grande oportunidade.