O século XXI trouxe-nos a Humanidade mais escolarizada que jamais existiu. E, ao mesmo tempo, acentuou, também, a distinção entre guerra e terrorismo, como variantes da irracionalidade, da violência e do ódio humanos. Depois daquilo que assistimos na Ucrânia e na Palestina, torna-se quase anedótico que expliquemos aos nossos filhos que todas as pessoas são boas, de confiança, amáveis e solidárias. Já não se trata de reconhecer que os nossos antepassados — sem escolaridade, sem recursos e fechados num mundo mais obscuro — nos ajudaram a perceber que todos os animais são agressivos mas que só os seres humanos são violentos. Mas de lhes responder aos porquês que os assaltam sobre os motivos que levam pessoas inteligentes, sensíveis e bondosas — como os pais — até à estupidez, à crueldade e à destrutividade. À absoluta ausência de humanidade. De gratidão pela vida. E de compaixão. Diante de tudo isto, como havemos de ter argumentos para que se co-movam para a sabedoria humana se as pessoas que destroem, que destroçam e matam são pessoas como eles e como nós?…

Mas aquilo que os nossos filhos também precisam de perceber é que o que separa a racionalidade e a bondade humanas da maldade não é uma linha ténue. Ou uma fronteira frágil e precária. Mesmo que a reboque da maldade haja quem se aproveite para nos advertir – com uma espécie de “terrorismo de seda” – que, “lá no fundo”, somos todos maus. Como se a forma de elegerem a maldade os sossegasse da bondade de que não são capazes.

O número de maus é, infinitamente, menor que o das pessoas boas! Por mais que uma parca quantidade de maus faça por conspurcar os bons. E os tente corromper com a sua maldade.

Sim, há “os bons” e há “os maus”. E, sim, nem sempre estamos do lado certo da história. Mas há “os bons” e “os maus”! E é falsamente correcto não o reconhecermos. Mas “os maus” não são só as pessoas que se entregam à violência ou ao ódio. Há uma “violência urbana” com que deixamos os nossos filhos crescer. Como se ela fosse uma “violência limpa”.

Que se sente na forma como olhamos pouco para os outros e pelos outros. No modo como elegemos a nossa notoriedade e a vaidade sobre tudo o resto que não é bondade. Ou como a indiferença e o individualismo ou o imediatismo e o narcisismo não são bondade. Ou no jeito indolente – e, até, um bocadinho cobarde – como nos insurgimos contra a maldade. Sempre que escolhemos não ser, claramente, bons condescendemos com a maldade.

Daí que não se trata só de lhes lembrarmos que a bondade é um exercício de inteligência e uma escolha. Mas, também, de lhes recordarmos que todas as formas de “maldade liofilizada” com que vivemos – que, passo a passo, os “estragam” – são pequenas maldades que, sem os tornarem capazes da irracionalidade e do ódio, os “amolecem” e “encolhem” quando se trata de fazer frente aos “maus”.

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