O meu nome é Belarda Mondlane, tenho 22 anos e sou uma Girl Mover. Tenho muito orgulho em ser Moçambicana. É o meu país de coração!

Infelizmente, Moçambique é um dos países mais pobres do Mundo, fazendo parte da lista dos oito com mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano. Enfrenta, por isso, vários desafios ao nível da economia, da saúde, educação e do ambiente. Mas, o que realmente mais me preocupa no meu país é o papel da Mulher na sociedade e o seu potencial inexplorado, enquanto agente transformadora.

Eu acredito que isto tem que mudar! Que temos todos que mudar, que pensar diferente e fazer melhor. A educação é um direito humano básico e não tenho dúvidas dos resultados da educação de uma Mulher! Desenvolvimento económico, abertura de mentalidades, famílias mais instruídas e mais saudáveis. Uma Mulher com educação é uma Mulher com poder para mudar um país. Devemos criar estas oportunidades!

Não nego que têm sido dados pequenos passos no que diz respeito à representação feminina em cargos políticos ou posições administrativas, mas há muito caminho ainda a percorrer se pensarmos nos apenas 10% de mulheres que terminam o Ensino Secundário [1], nos preocupantes 40% de raparigas que engravidam antes dos 18 anos [2] ou nos 60% de mulheres que, aos 40 anos, têm elevada probabilidade de ser mães solteiras [3].

Estes números são espelho de uma cultura onde a Mulher não tem acesso a oportunidades de crescimento. Estes números são espelho de uma cultura que deixa que as raparigas não vão à escola porque estão menstruadas ou que acredita que o lugar da Mulher é em casa ou na machamba (horta). Estes números são espelho de uma cultura onde as meninas têm de percorrer quilómetros para ir para à escola, que as incentiva a escolher o caminho estabelecido de casar cedo de mais e ter filhos.

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A verdade é que fui uma privilegiada por poder pensar de maneira diferente e por ter tido a oportunidade de continuar os meus estudos. Quando eu tinha 13 anos lembro-me que já tinha quase toda a minha vida planeada: aos 17 terminaria o 12° ano, aos 21 terminaria a licenciatura, aos 23 ambicionava ter uma experiência pessoal ou profissional e, por fim, um Mestrado aos 25.

No entanto, ao terminar o Ensino Secundário, a minha Mãe não tinha recursos financeiros que me permitissem avançar para o Ensino Superior. O meu Irmão mais velho já estava há um ano na Universidade e eu acabei por me sentir impotente porque desistir do meu sonho não me parecia uma opção. Acabei por procurar uma opção mais acessível. Ainda assim, provavelmente, a minha Mãe não conseguiria.

Felizmente, pouco tempo depois, uma Tia minha decidiu responsabilizar-se pela minha formação. Sou assim parte do 1% das jovens moçambicanas que chegam ao Ensino Superior. Agradeço-lhe o que fez por mim, porque teve um impacto na minha pessoa, muito para além da formação superior.

Desta forma, tenho conseguido concretizar estas e outras ambições, também graças à importância que a Girl MOVE ganhou na minha vida. Essa fase de vulnerabilidade tornou-me uma pessoa mais consciente do privilégio que é receber educação e, também por isso, sinto que investir na nossa formação é investir num mundo menos cego e mais justo. Por isso mesmo, senti necessidade de retribuir, de alguma forma, esse privilégio que é poder estudar.

Lembro-me que, quando decidi candidatar-me à Girl MOVE, me perguntaram o porquê de me querer tornar uma Girl Mover e de ter respondido “porque sou a pessoa certa”.  Digo isto porque quero ser a pessoa que proporciona aos outros o que eu tive a minha vida toda: oportunidade de fazer as minhas escolhas, oportunidade de estudar, oportunidade de escolher quem quero ser, oportunidade de sonhar e voar alto e porque, essencialmente, queria agora ter a oportunidade de criar mais mudança, de servir como exemplo, de contribuir para uma geração mais forte e mais consciente dos seus direitos.

A Academia de Liderança foi para mim uma oportunidade de crescimento pessoal, de desenvolvimento da minha análise crítica e da capacidade de criar impacto. Ganhei competências de mediação de conflitos ou resolução de problemas. Ganhei foco no desenvolvimento da minha carreira com impacto e ganhei ferramentas para me tornar numa “change maker”.

A Academia deu-me nome à inquietação que sentia em relação a ajudar o próximo. Foi na Girl MOVE que comecei a ser mentora de raparigas em situação de extrema vulnerabilidade. No início não tinha noção do poder (e da responsabilidade) que tinha nas minhas mãos. Mas, à medida que o tempo ia passando, fui-me apercebendo do brilho nos olhos daquelas meninas mais novas. Olhavam para mim com admiração e viam-me como uma inspiração para lutar pelo que se quer na vida. Vi nos seus olhares brotarem sonhos adormecidos pela opressão da sociedade e foi aí que tive a certeza que já estava a transformar as suas vidas e a comunidade. Tive esperança que as próximas gerações poderiam ter percursos diferentes da (ainda) maioria das meninas. Estou segura que a mentoria que tive e que dei pode fazer a diferença no meu país. É uma rede que nos une e que combate os desafios que temos pela frente.

Dito tudo isto, quero continuar convicta que o meu papel nesta luta é o de contribuir para que sejam dadas mais oportunidades às raparigas de hoje, Mulheres de amanhã. Quero continuar a construir uma carreira com propósito, quero fazer o bem bem feito, quero inspirar e quero acreditar que também nos cabe a Nós, Mulheres, mudar o Mundo!

Hoje, tenho uma história diferente para contar da que tinha há dois anos e dizem que sou uma referência para milhares de jovens Mulheres moçambicanas que perseguem o sonho de criar impacto no seu País. Sou uma Girl Mover – a por em prática o meu propósito.

Aluna de Mestrado em Gestão da Nova School of Business & Economics, integrou o programa de liderança da Girl Move, ONG portuguesa que trabalha nesta área em Moçambique


[1] INE (2013) Inquérito Demográfico e de 2011, Saúde
[2] “Casamento Prematuro e Gravidez na Adolescência em Moçambique: Causas e Impacto”, UNICEF, Maputo, Moçambique, 2015.
[3] Clark, Shelley. Análises originalmente comissionadas pela Population Council e outros dados relevantes podem ser consultados em: “Single Motherhood, Poverty, and Child Mortality in Sub-Saharan Africa: A Life Course Perspective.” Commissioned by the Population Council; Clark, Shelley and Dana Hamplova. 2013; “Single Motherhood and Child Mortality in Sub-Saharan Africa: A Life Course Perspective.” Demography, 50 (5):1521-1549; Clark, Shelley and Sarah Brauner-Otto. 2015; “Divorce in Sub Saharan Africa: Are Unions Becoming Less Stable?” Population and Development Review, 41 (4):583-605