Vota como uma mulher, dizia um tweet da Joana Mortágua.

Fez-me sentido, votar como o ser livre e inteligente que somos. Não temos dono: nem a esquerda, nem a direita, nem o marido, nem o pai, nem o patrão.

A minha bisavó conheceu um rei que era de longe, ia com trouxas de bordados levados da fábrica do meu avô para Lisboa vender enxovais, teve quatro filhos e nunca casou. Votou em Sá Carneiro que era de perto e que vivia com uma mulher divorciada e mostrou que o país era menos conservador que os partidos e o Poder e ajudou a combater um ou dois preconceitos. Somos todas iguais: casadas, solteiras ou divorciadas, mães ou sem sermos mães, qualquer que seja a profissão, a religião, a raça, a nacionalidade ou qualquer coisa.

Veio a CEE e os governos de Cavaco e as mulheres que saíram da vida miserável e dura da lavoura para a apesar de tudo menos dura de criadas de servir, saíram desta vida para as fábricas dos “alemães” que trouxeram os têxteis e o calçado (para o interior do distrito do Porto e Braga) e passaram a ter um salário melhor e fins de semana livres, um novo mercado surgiu. E lá fui eu a um comício em Amarante, “vamos ver a Leonor Beleza”. E, criança, corri para a ver, de mão dada com a minha avó por entre a multidão. Era uma ministra.

Não se nasce mulher, torna-se mulher, dizia a Simone de Beauvoir e eu acho que se nasce mulher, mas sim, também nos tornamos mulher forjadas ao longo das diversas fases da vida. Começamos por achar que tudo é possível, e talvez seja, e rápido, não tanto; depois, talvez estudemos – hoje estudamos mais e recebemos menos -, talvez vamos a manifestações, talvez cheguemos aos 80 com um cartaz a dizer “I can´t believe I have to fight that sh..t  again”, talvez possamos escolher a vida pessoal que queremos. Também trabalhamos; talvez sejamos uma atriz como as de Hollywood, talvez façamos limpezas, talvez uma primeira-ministra, uma executiva de sucesso, uma profissional liberal, uma jornalista, uma operária ou uma funcionária pública, uma cuidadora, uma doméstica ou uma reformada… e/ou uma das que “Chegou a casa, não disse nada. Pegou na filha, deu-lhe a mamada; bebeu a sopa numa golada; lavou a loiça, varreu a escada; deu jeito à casa desarranjada;”. Em todo o caso, já sabes: anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.

Depois chega o 8 de março e é sempre igual, aquela sina de fazer o que as mulheres sempre fizeram, ESPERAR – mais ou menos isto escreveu Mia Couto.

Notícias de 2024, dados desde 2023:

  • A menor falta de atenção dada à saúde das mulheres em comparação com a dos homens custa anualmente 920 milhões de euros segundo um relatório do Fórum Económico Mundial. Embora as mulheres vivam mais tempo do que os homens, a nossa qualidade de vida é inferior devido à desigualdade que existe ao nível da investigação e nos tratamentos médicos;
  • Em Portugal, faltam ginecologistas e obstetras e as mulheres estão a dar à luz na urgência mais próxima que calhar estar aberta;
  • O aceso a tratamentos de fertilidade é curto;
  • O investimento em longevidade reprodutiva é negligenciado em todo o mundo, mesmo entre os gurus da longevidade de Silicon Valley;
  • Voltando a Portugal, por falta de médicos de família, a falta de acesso a consultas de planeamento familiar é gritante;
  • Cerca de 12% das jovens portuguesas já tiveram de faltar às aulas por não terem dinheiro para comprar produtos menstruais;
  • Mais de 70% das vítimas de violência doméstica são mulheres;
  • As mulheres continuam a receber menos do que os homens e estamos sub-representadas nos cargos de decisão e poder tanto na política como na economia;
  • Em 2023 quase 70% das mulheres trabalhadoras em Portugal recebe uma remuneração base bruta mensal até mil euros, quase metade delas 800 euros no máximo. Menos homens ganham tão pouco, há mais mulheres a ganhar o salário mínimo que homens, dados da CGTP;
  • O rendimento médio salarial líquido das mulheres era de 965 euros no 4.º trimestre de 2023, o dos homens 1.140 euros, mais 15%, dados do Instituto Nacional de Estatística;
  • Os quadros de pessoal de 2022 mostram um diferencial de 13,4% em desfavor das mulheres no salário base bruto, não havendo melhorias face ao ano anterior e com as diferenças a acentuarem-se entre os mais qualificados.
    “Os baixos salários, além de atirarem para a pobreza uma em cada dez trabalhadoras, obrigam muitas a ter mais do que um emprego”, diz a CGTP. No ano passado, 128,5 mil mulheres tinham uma segunda atividade profissional, um aumento de 22% face a 2021 (mais 23 mil), constituindo 51% do total de 251 mil trabalhadores com um segundo trabalho.”
  • Também nos atiram para reformas mais baixas e mais pobreza na velhice;
  • A taxa de risco de pobreza em Portugal que é de 41,8% antes de qualquer transferência social, afeta mais as mulheres, 17,7% do que os homens, 16,2%, e, entre as mulheres, são as que têm mais de 65 anos que apresentam maior risco de pobreza, próximo dos 20%;
  • 74% das pensões de velhice da Segurança Social são inferiores ao salário mínimo. O valor mínimo da pensão de velhice é de € 319,49e e de €191,69 euros a de sobrevivência. Em 2022, mais de sete em cada 10 pensões de velhice estavam abaixo do salário mínimo nacional.

Muitas mulheres que toda a vida trabalharam, a cuidar dos filhos, dos pais, da família e da casa e que nunca descontaram porque obviamente não tinham salário, estão entre os reformados que recebem a pensão mínima. Se forem solteiras ou tiveram um divórcio a meio da vida, não têm sequer direito a pensão sobrevivência que sempre compõe o orçamento.

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Trabalhando e muito, dependeram financeiramente toda a vida de terceiros. Na reforma, podem não ter acesso ao complemento solidário para idosos se o rendimento dos filhos não o permitir e, portanto, continuam dependentes de outros. Temos obrigação de olhar pelos nossos pais, mas também temos obrigação de valorizar o trabalho que fizeram e promover a sua maior independência e auto estima. Esta é uma das maiores injustiças que a sociedade portuguesa comete contra as mulheres e o trabalho que sempre fizeram por esta mesma sociedade. Luís Montenegro, espero que se possa corrigir isto.

Portanto, entradas no nono ano de governos socialistas, seis deles de toda a esquerda, como se espera que vote uma mulher? Pela mudança, porque temos de mudar de vida.

Começar por olhar para os salários acima e ver algumas propostas económicas da AD: baixa do IRS até ao 8º escalão, com enfoque na classe média; baixa do IRS jovem; baixa do IRC; 15º mês isento de contribuições e IRS; o suplemento remunerativo solidário que compense os apoios sociais que o trabalhador deixa de receber se aceitar um emprego para que não diminua o rendimento disponível; pensões atualizadas de acordo com a lei; complemento solidário para idosos com valor de referência nos € 820 até 2028; contas poupança isentas de impostos; mais flexibilidade aos trabalhadores para reduzirem ou subirem horas de trabalho por semana (com ajuste de salário); reforma a tempo parcial, creches gratuitas.

Maior independência económica e flexibilidade na vida é importante e empodera-nos. Todas as gerações de mulheres antes de nós nos ensinaram isso. Certo que só o poder é poder e o melhor é usarmos já o que temos de sermos metade do eleitorado português.

Mas a mudança traz o retrocesso social! e a proibição do aborto!, grita a esquerda. É evidente que Paulo Núncio tem zero influência num governo da AD para mudar este direito que a AD não questiona. Se o quisermos inscrever na Constituição como os franceses nós mulheres trabalharemos para que essa inscrição seja um símbolo de que só nós somos donas de nós próprias.

Retrocesso social é não passarmos da cepa torta.

Vota como uma mulher, como um ser inteligente e livre. E, se te fizer sentido aquilo que disse, vota AD.