790kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Um campo cheio de cravos em São Bento: António Costa conduz o PS mais à esquerda de sempre no Governo
i

Um campo cheio de cravos em São Bento: António Costa conduz o PS mais à esquerda de sempre no Governo

MIGUEL A. LOPES/LUSA

Um campo cheio de cravos em São Bento: António Costa conduz o PS mais à esquerda de sempre no Governo

MIGUEL A. LOPES/LUSA

Seis meses de "geringonça" e o PS? Eppur si muove... para a esquerda

A "geringonça" rola há seis meses e exigiu cedências, reorganizações e redesenho de medidas. O PS encostou-se à esquerda para governar, mas dá sinais de ter aí mais do que um simples encosto.

“Eppur si muove”. Helena Roseta recupera Galileu para falar na “solução governativa” atual. “A geringonça!”, exclama perante as reservas jornalísticas em assumir o nome de batismo dado por Paulo Portas. “Já é ternurento”, diz a deputada independente na bancada do PS, que assistiu a estes seis meses com agrado. “É geringonça, mas funciona”, disse António Costa. E, no entanto, ela move-se, prefere Roseta. E, no entretanto, o PS também se move… para a esquerda.

Esta deslocação provoca todo o tipo de sensações entre os socialistas. Há quem deteste, há quem receie, há quem o desejasse há muito, há quem veja como arriscado, há quem ache que é natural. Só não há quem a negue. “Há um resultado final de consolidação de políticas mais à esquerda que não tínhamos”, reconhece ao Observador Pedro Delgado Alves. E até dá exemplos, como o da “mensagem anti-austeridade” que o deputado do PS considera estar entranhada no partido, ou o discurso (e as conferências) contra a precariedade no mercado de trabalho.

Este deputado faz parte do famoso grupo dos jovens turcos que não se chocam com o caminho tomado pelo PS, pois nos últimos anos alimentaram a esquerda dentro do partido e agora estão no centro da nova fórmula. Isso já não é tanto assim noutras alas socialistas. António Galamba, que fez parte da direção de António José Seguro, assumiu entre os socialistas uma postura publicamente muito crítica face ao líder António Costa e agora critica uma “série de radicalizações do PS”. Quais? “Esta questão das escolas. É instrumental, desvia as atenções do Programa Nacional de Reformas e consolida a geringonça“, exemplifica em declarações ao Observador. E ainda afirma que “todos os Governo, do PS e do PSD, aprovaram colégios em localidades que sabiam que iam ficar desertas no futuro”. Na polémica em torno de uma reavaliação dos contratos de associação entre o Estado e as escolas privadas, este membro da Comissão Política Nacional do PS diz que se trata de “alimento para a geringonça”.

"No meio de todo este alimento para a geringonça, quem paga a fatura são as crianças", diz António Galamba ao falar dos contratos de associação entre Estado e escolas particulares

“É tudo uma questão de sobrevivência, a boia foi colocada à tona da água”, diz o socialista referindo-se ao posicionamento mais à esquerda do partido nesta fase — que até considera ser “conjuntural, não tem nada de estrutural –, servindo apenas um objetivo: “É tudo secundário, desde que se garanta a sobrevivência do chefe”. O partido está a 15 dias de um congresso, mas este opositor de Costa não está entusiasmado em ir até ao pavilhão da Feira Internacional de Lisboa, onde vai decorrer a reunião de 3, 4 e 5 de junho: “Não estou para validar a destruição de um projeto político em Portugal como é o do PS”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A postura crítica não é facilmente assumida a viva voz no partido. Mas entre os descrentes na solução de um Governo apoiado nas forças de esquerda, há um texto que incomodou mais ainda, nesta fase, por deixar preto no branco esta linha mais à esquerda: a moção que António Costa leva ao congresso de Lisboa. Um destes socialistas que não apoia a geringonça pega no texto enquanto fala como o Observador e lê: “E, como desde logo ficou claro, embora alguns teimassem em negar as evidências, esses entendimentos à esquerda não se propunham apenas inviabilizar a continuidade das políticas da direita – no que poderia ser entendido como uma mera ‘coligação negativa’ – mas também viabilizar uma outra solução governativa, protagonizada pelo PS e assente essencialmente no Programa do PS, de modo a concretizar, com o contributo substantivo e a participação ativa dos demais partidos de esquerda, uma política de recuperação dos rendimentos dos trabalhadores e das famílias que permite demonstrar a viabilidade de um caminho alternativo para Portugal”.

“Isto não parece o PCP a falar?”, atira em jeito crítico. O texto da moção, que foi redigido por Pedro Silva Pereira (num grupo onde também esteve Paulo Pedroso), os socialistas adotam a fórmula de quem está à sua esquerda para se referir à governação PSD/CDS: “A política da direita”. Outro exemplo: “Os mais saudosos da política da direita pretendiam que nada se alterasse, que nada se revertesse. Mas não foi para tudo ficar na mesma que os portugueses votaram na mudança”. Jorge Lacão desvaloriza, mas questionado sobre o posicionamento que o partido agora vinca mais à esquerda admite que “aqui e ali há afloramentos. Mas a política é isso mesmo. É dinâmica”.

"Há um resultado final de consolidação de políticas mais à esquerda que não tínhamos", admite Pedro Delgado Alves.

Não é comum ver um partido de Governo que promove na sua sede nacional, no Largo do Rato, uma conferência sobre a precariedade laboral, mas o PS fez isso esta semana. Menos ainda que conte com oradores convidados personalidades de movimentos habitualmente contestatários dos Governos nesta matéria, como Carla Abreu dos Precários Inflexíveis, João Labrincha, da Academia Cidadã/Geração à Rasca, ou João Camargo, que escreveu um livro sobre o movimento Que se lixe a troika. Em 2011 e 2012, Camargo promoveu das maiores manifestações no país contra a intervenção externa pedida por um Governo socialista.

Um à frente cá, dois atrás na Europa

Até em matéria europeia o PS ensaia, dentro de portas, um discurso mais radical. Na moção que António Costa levou ao congresso de há dois anos, atacava-se “quem, também em Portugal, explore politicamente a perceção de que a Europa não esteve à altura das suas responsabilidades” para se concluir: “Contudo, a tentação de virar as costas à Europa seria um erro grave”. Não que os socialistas defendam agora romper com a Europa, como os seus parceiros no Parlamento, mas no 1º de maio, durante uma visita aos Açores, António Costa apelou diretamente à luta dos sindicatos: “É necessário que prossiga uma mobilização muito forte em defesa desta política, que tem muitos adversários, não só internos, como externos”.

Mais: foi o mesmo António Costa que subscreveu, ao lado de Alexis Tsipras durante uma visita recente à Grécia, um “pacto anti-austeridade”. Também fala na sua nova moção de “uma parcial e progressiva mutualização europeia das dívidas” soberanas. Os mínimos, é certo, mas Costa sempre evitou entrar por este tema, muito menos falando em reestruturação da dívida, coisa que é ponto de honra para os seus parceiros da esquerda. Aliás, o PS até acedeu a discutir a questão da dívida num grupo de trabalho com o Bloco de Esquerda. Agora aparece inscrita nestes moldes num documento do partido, quando o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, já admitiu que a “dívida tem que ser negociada, reestruturada para reduzir os encargos anuais” — embora com um acrescento para a Europa ver: “Sempre no quadro europeu”.

No 1º de maio, António Costa apelou aos sindicatos: "É necessário que prossiga uma mobilização muito forte em defesa desta política, que tem muitos adversários, não só internos, como externos”.

Neste ponto, uma realidade pode a ser a teoria e outra a prática, já que ainda há dois dias, o ministro das Finanças, Mário Centeno, se desviou de um pedido de reestruturação da dívida à boleia da discussão que se gerou para a Grécia: “É altura de nos concentrarmos nas nossas obrigações no contexto quer nacional, nos compromissos que temos com os portugueses, com o Parlamento e, obviamente, também na Europa”. Jurando mesmo, depois de uma reunião do Eurogrupo, que “o Governo português sabe bem o rigor e a exigência que tem que pôr na sua ação”: “É esse caminho que queremos trilhar”.

O equilíbrio entre agradar aos parceiros de fora e aos de dentro tem sido o ponto mais delicado (e que tem gerado maior desconfiança), nestes seis meses de “geringonça”. O PS não quer rasgar os compromissos europeus, mas também não os quer aceitar tal qual estão, defendendo que é preciso “conquistar condições para uma política orçamental mais favorável ao crescimento e ao emprego”.

“O que tem sido original não são as cedências, mas todos assumirem as suas divergências. Uma divergência não é uma crise, é o normal. Uma convergência é uma construção”, afirma Helena Roseta. “Isso é que é bonito”, remata. Mas há quem não seja tão lírico e veja na sustentação da esquerda uma “quarta roda”, que é o Presidente da República. “Sozinha ela era frágil, mas com esta quarta roda…”, sugere um dos críticos da solução governativa montada por Costa, para quem Marcelo Rebelo de Sousa está apostado em prolongar a solução enquanto for Passos Coelho o líder do PSD.

A geringonça sustenta-se porque tem uma "quarta roda, que é o Presidente da República", garante um crítico da solução de Costa.

Jorge Lacão diz que “os que não viam com bons olhos esta solução estão hoje mais discretos”. “O PS confrontou-se com uma clarificação dentro de si próprio”, nestes seis meses, acredita o deputado socialista. “Na base há uma adesão muito grande” à “geringonça”, acrescenta Delgado Alves, “sobretudo depois dos últimos quatro anos, e quando na Europa vemos os partidos socialistas na desgraça. Em Portugal sentem-se confortados por haver uma ideologia clara próxima da matriz”.

Na moção que leva ao congresso, Costa atira aos “presságios que não se confirmaram” de “subversão radical de sistema de Governo” ou de um “PS refém dos partidos à sua esquerda e um Executivo manietado, se não mesmo paralisado”. “O percurso tem sido mais sereno do que foi augurado”, sintetiza Lacão. Mas há receios no partido que vão tomando lugar, principalmente quando se começa a ter a cabeça na próxima ida às urnas (as autárquicas de 2017). “Há o risco brutal de perdermos a ambição de vencermos e de se consolidar o voto no BE. A aproximação vai libertar o voto útil no PS”, argumenta um dirigente socialista. Galileu estava certo sobre o movimento da terra. E estará Costa, nesta deslocação do PS?

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora