Entendam-se lá, disse o Presidente. Até ao outubro, sff.

Durante os próximos dias, meio Portugal dirá que não faz sentido, que sabemos todos que não é possível, que o PS está no meio de uma guerra, que o Governo está noutra – com os juízes do Tribunal Constitucional.

Deixem-me ser do contra: acho que o que o Presidente disse esta terça-feira não é pedir demais, é o mínimo; que o calendário definido é bem visto; e que esta é a única maneira de Cavaco sair menos mal dos seus mandatos em Belém. Vou ser sintético, prometo.

1. Este acordo a três é o mínimo porque Cavaco Silva não foi exigente nos termos em que o pediu: trajetória de redução da dívida; reformas para sustentar o crescimento da economia. Não me parece que alguém de bom-senso consiga hoje dizer que não temos um problema de dívida pública, tão pouco que se mostre despreocupado com a estrutura e capacidade de crescimento da economia.

À partida, tendo em conta que os três assinaram o Tratado Orçamental Europeu, não me parece difícil que PSD, PS e CDS se entendam sobre a primeira – desde que não sejam obrigados a definir em conjunto as políticas para lá chegar.

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Quanto à economia, o que me parece mais irrealista é que todos eles tenham uma ideia concreta sobre o que fazer para Portugal crescer. Mas lá que era bom que pensássemos sobre isso, agora que o memorando está no seu fim, lá isso era. E como dinheiro no Estado é coisa que não há, talvez desta feita seja mais fácil a esquerda e a direita entenderem-se sobre as linhas gerais do que possa ser feito.

Já agora: deitemos as táticas fora por um minuto e perguntemo-nos: é assim tão disparatado que nos entendamos sobre o básico?

2. Vamos ao calendário: o Presidente propõe um acordo lá para outubro. Improvável? Sim, claro. Mas entre todos os possíveis, é o único que poderia fazer sentido.

Vejamos então a crise em curso. O Governo está a braços com o TC, crise que só terá fim (?) à vista lá para setembro, se tiverem efeito os esforços do Governo para acelerar tudo. O PS também está adiado para melhores dias – o confronto Seguro/Costa está marcado para 28 de setembro. Coincidência? Do ponto de vista de Cavaco Silva, não.

Cavaco conta que a clarificação das duas situações possa ajudar a serenar os ânimos durante uns meses – antes da corrida final até às legislativas. E parece com isto sugerir que o líder eleito dos socialistas possa aproveitar o fôlego de uma vitória para dar uma prova de liderança (que costuma ter bons efeitos na opinião pública, pelo menos quando os líderes da oposição são recém-chegados).

3. Por fim, a questão Cavaco: faltam menos de dois anos para acabar o mandato deste Presidente. E Cavaco Silva já não tem como sair do cargo mostrando um país melhor do que quando entrou. Tem, por isso, uma última missão: deixar construídas as bases para que o país recupere.

Cavaco sabe melhor do que ninguém que isso não será fácil. Até às legislativas, em teoria, o PS terá pouco ou nenhum interesse em deixar de lado as armas da guerra eleitoral. E mesmo depois das legislativas não será fácil convencer quem perder a segurar as pontas de um Governo difícil.

É por isto que, em junho deste ano de 2014, este Presidente já não pode perder um minuto deste seu último mandato que não seja nesta batalha por um acordo partidário de médio prazo. Porque esta ele só pode ganhar através da opinião pública. E esta ele não vai poder perder.