O diretor-geral da Autoridade Tributária (AT) reafirma que não existe uma lista VIP de contribuintes e justifica a demissão por não ter informado a tutela sobre procedimentos internos que podem ter criado a perceção de que essa lista existia.

“Tenho consciência de que, ao não ter informado a tutela destes procedimentos e estudos internos, possa ter involuntariamente contribuído para criar uma perceção errada sobre a existência de uma alegada lista de determinados contribuintes, razão pela qual coloco o lugar à disposição”, lê-se na carta de demissão, a que a Lusa teve acesso, escrita hoje por Brigas Afonso e enviada à ministra das Finanças, Marias Luís Albuquerque.

Na carta, o diretor-geral demissionário enfatiza que o Governo não teve qualquer intervenção nesta questão e que a AT “nunca” recebeu qualquer lista por parte de “nenhum membro do Governo” nem “nunca recebeu quaisquer instruções, escritas ou verbais, de qualquer membro deste Governo” para elaborar aquela lista, explicando ao longo da carta, de forma cronológica, os vários acontecimentos que agora levam à sua demissão.

A controvérsia criada à volta deste tema pode ter origem num conjunto de decisões internas da AT, explica Brigas Afonso, lembrando que a AT detém nos seus sistemas de arquivos informáticos informação cada vez mais pormenorizada acerca dos contribuintes, o que – na sua opinião – “obriga” a aperfeiçoar mecanismo que garantem que esses dados são apenas utilizados para o cumprimento da missão da AT.

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A existência de mais informação nos sistemas e a repetição de situações que evidenciam a violação do direito dos contribuintes ao sigilo fiscal, como noticias sobre a situação fiscal de contribuintes, obrigam – segundo Brigas Afonso – o Fisco a aperfeiçoar mecanismos que garantem que os dados fiscais são somente utilizados para cumprimento das obrigações da AT.

Nesse sentido, acrescenta, têm sido propostas e ponderadas diversas metodologias de segurança já experimentadas a nível internacional, nomeadamente a identificação de segmentos ou grupos de contribuintes em que o risco de tentativas de acesso indevido seja mais elevado.

Em setembro do ano passado, explica Brigas Afonso na carta enviada à ministra das Finanças, a área de segurança informática da AT propôs um procedimento de controlo de acesso aos dados, com mecanismo de alerta de determinados contribuintes e verificação da legalidade das respetivas consultas.

No mês seguinte, em outubro, o subdiretor-geral, substituto-legal de Brigas Afonso despachou favoravelmente essa informação, solicitando uma avaliação sobre as medidas propostas e que fosse apresentada uma proposta de implementação de uma medida definitiva de salvaguarda do sigilo fiscal.

Paralelamente a este procedimento e de forma totalmente autónoma e sem relação com os acontecimentos anteriores de setembro e outubro, explica o diretor demissionário, foi decidido também em setembro, e “de acordo com procedimentos habituais”, abrir um procedimento de auditoria na sequência de notícias que revelavam indícios de violação do direito do primeiro-ministro, Passos Coelho, ao sigilo fiscal.

Brigas Afonso diz também que nos últimos anos foram abertos “diversos” procedimentos de auditoria e de inquérito com base em noticias publicadas na comunicação social, referentes a outros contribuintes, que não o primeiro-ministro.

E reafirma que todos os processos e procedimentos em questão são do foro estritamente interno da AT, não tendo origem na tutela política, que não teve conhecimento desses procedimentos em nenhuma fase.

Mas explica que, em resultado da sua decisão de setembro de averiguar fugas de informação sobre a situação fiscal de Passos Coelho, a direção-geral de Serviços de Auditoria Interna (DSAI) elaborou em novembro um relatório de auditoria a eventuais consultas de dados pessoais do primeiro-ministro, no qual é feita uma “desadequada e errada” referência à implementação de uma medida de controlo de acessos a determinados contribuintes.

Brigas Afonso garante ainda que nuca foi recebida por parte da DSAI a proposta de concretização da medida de controlo sugerida; nunca foi constituída qualquer lista de contribuintes nem acionados quaisquer alertas.

Por fim e já em fevereiro de 2015, Brigas Afonso, depois de analisar a medida e mais uma vez, sublinha, sem dar conhecimento à tutela, decidiu dar sem efeito aquele procedimento “por ter concluído que a utilização das tecnologias mais recentes proporciona modelos de auditoria com resultados mais eficientes e aplicáveis de forma transversal a todos os contribuintes”.

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