Jonathan Pollard, um dos espiões mais odiados pela comunidade de serviços secretos norte-americana, pode estar prestes a ser libertado depois de ter sido condenado a prisão perpétua em 1987, por crime de espionagem contra os Estados Unidos a favor de Israel. Foi isso mesmo que as autoridades norte-americanas adiantaram ao Wall Street Journal e ao ABC.
Mas a libertação do homem de 59 anos, cuja prisão foi sempre um espinho na relação entre os norte-americanos e israelitas, é estranha: porquê agora? A libertação de Pollard é uma exigência de Tel Aviv há anos. Esta decisão terá algo que ver com a tensão que assaltou a relação entre Estados Unidos e Israel, depois da celebração do histórico acordo nuclear entre norte-americanos e iranianos? É esta a pergunta que tem feito eco na imprensa internacional.
Uma das hipóteses que tem sido avançada é que Washington pode estar a tentar compensar os israelitas pelo acordo nuclear com o Irão, uma espinha que ficou atravessada na garganta do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Segundo o Wall Street Journal, que cita fontes oficiais da Administração Obama, a libertação de Pollard pode ser um trunfo para “suavizar as relações com Israel”.
Mas da Vox chega uma leitura diferente: é altamente improvável que Benjamim Netanyahu vá mudar de opinião em relação ao acordo nuclear desenhado entre norte-americanos e iranianos só porque Obama decidiu libertar um espião israelita que está preso há décadas.
É preciso recuar no tempo para perceber os verdadeiros contornos do caso. Em maio de 1984, então com 28 anos, Jonathan Pollard decidiu aproximar-se de um coronel da Força Aérea israelita, Aviem Sella, com o objetivo de lhe entregar relatórios secretos sobre os inimigos de Israel. Começou aí uma relação estreita que permitiu às autoridades israelitas terem acesso a milhares de documentos classificados. Embora nunca tenha sido possível perceber as verdadeiras motivações do ex-agente dos serviços secretos norte-americanos, Pollard continua a garantir que fez o que fez porque estava preocupado com a segurança de Tel Aviv. Mas existe um dado nesta versão que parece não bater certo: é que Pollard passou também informações secretas ao Paquistão e ao regime apartheid da África do Sul.
Um ano e meio depois, quando percebeu que ia ser detido, tentou fugir com a mulher para a embaixada de Israel nos Estados Unidos, acreditando que os israelitas lhe iam garantir asilo diplomático. Mas a embaixada recusou-lhes a entrada e o FBI acabou por prender ambos. As autoridades norte-americanas acreditam que Pollard divulgou cerca de 2.300 documentos secretos sobre temas que iam desde as defesas aéreas soviéticas aos sistemas de mísseis egípcios. Foi condenado a prisão perpétua em 1987.
Mas a condenação de Pollard nunca foi bem aceite por Israel: Tel Aviv vê nele um verdadeiro herói. Já Washington considera-o um dos maiores traidores da história. Por isso, a pergunta volta a ganhar força: porquê agora? Em novembro, quando se cumprem 30 anos da sua condenação, as autoridades prisionais norte-americanas vão avaliar a possibilidade de conceder a Jonathan Pollard a liberdade condicional – uma obrigação prevista na lei – e existem rumores de que Barack Obama poderá estar disposto a capitalizar politicamente a libertação do ex-espião.
E isto enquanto, no Congresso norte-americano, joga-se agora a possibilidade de aprovar uma lei que limitaria a capacidade de Obama de remover as sanções impostas ao Irão, o que na prática deitaria por terra o acordo nuclear. Assim, a libertação de Pollard poderia ajudar a convencer alguns congressistas pró-Israel a juntarem-se à causa do Presidente norte-americano.
Mas Pollard pode, afinal, não ser libertado tão cedo. O jornal lembra que, já no ano passado, quando as negociações de paz entre israelitas e palestinianos estavam a ser acertadas, circularam exatamente os mesmos rumores de libertação do antigo ex-espião, com o objetivo de acalmar a opinião pública israelita e convencer os políticos norte-americanos pró-Israel. E o mais provável é que Jonathan Pollard venha mesmo receber a liberdade condicional em novembro, sem que isso tenha que ver com qualquer questão de política externa.