Mais de 150 moradores de bairros sociais de todo o país estão hoje a manifestar-se frente à sede do Instituto de Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), Lisboa, exigindo a suspensão da nova lei da renda apoiada.

Esta é a segunda manifestação organizada pelos moradores de mais de 30 bairros sociais de todo o país, depois de não terem recebido qualquer resposta à primeira manifestação nacional, realizada em março deste ano.

Em causa está a nova lei da renda apoiada, que entrou em vigor no início do mês de março e que prevê, entre outros aspetos, que se determine o valor a pagar com base nos rendimentos brutos e não nos líquidos dos arrendatários e que não se tenha em conta que os arrendatários mais antigos podem ter doenças crónicas e despesas com medicamentos.

A nova lei estabelece que as rendas sejam calculadas consoante os rendimentos e o agregado familiar, beneficiando, segundo o Governo, as famílias com mais elementos.

A presidente do Instituto de Apoio aos Bairros Sociais (IBS), Daniela Serralha, disse à agência Lusa que os moradores vão exigir a suspensão da nova lei, que “provocou aumentos nas rendas e despejos diários nos bairros sociais”.

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O protesto arrancou junto à rotunda da Praça de Espanha (Lisboa), cerca das 15:30, percorrendo cerca de 200 metros até à sede do IHRU, o que provocou o condicionamento do trânsito.

Os moradores gritaram frases como “Vítor [presidente do IHRU], ladrão, pede a tua demissão”, “IHRU, quem deve aqui és tu”, “obras sim, aumentos não”, “com esta lei mais aumentos de renda, o povo não aguenta”, “rendas a subir e as casas a cair” e com cartazes a expressar que “esta lei facilita os despejos”, “se pago a renda não como” e “revogação da lei 81/2014 das rendas apoiadas”.

“Em primeiro lugar, queremos ser ouvidos. Nunca somos ouvidos, não há qualquer resposta do IHRU. Este instituto é um instituto fantasma, atualiza as rendas, recebe os aumentos dos nossos reformados e não faz obras, não tem qualquer tipo de intervenção nos bairros” afirmou a presidente do IBS, alertando que os bairros sociais estão “super degradados” e é uma questão de segurança e de higiene.

Os moradores vão “exigir a suspensão deste aumento das rendas e da nova lei das rendas”, afirmou Daniela Serralha.

De acordo com a responsável da IBS, as rendas continuam com “aumentos na ordem dos 1.000%”, alertando que as pessoas não conseguem pagar e há ações de despejo todos os dias, devido à nova lei das rendas.

A atualização do valor das rendas é calculada através do rendimento bruto, o que para a presidente do IBS “não é exequível”, porque as pessoas não estão a conseguir pagar.

“Temos pessoas com reformas de 300 euros e com aumentos para os 250 euros. Com 40 euros não conseguem comer, não conseguem comprar medicamentos, não conseguem viver”, manifestou Daniela Serralha, explicando que a população afetada “está na miséria […] está a passar fome e não consegue pagar as rendas”.

Os moradores de mais de 30 bairros sociais de todo o país, vindas em autocarros de norte a sul do país, desde Guimarães, Barcelos, Almada e Setúbal, manifestaram as preocupações e os problemas que têm nas habitações.

A morar há 44 anos no bairro social de Arcozelo, em Barcelos, Manuel Duarte, de 74 anos, disse à Lusa que “nunca fizeram uma obra e estão sempre a aumentar as rendas”, acrescentando que não existem aumentos na reforma, nem nos ordenados, mas as rendas estão sempre a aumentar.

Para este morador, “a renda apoiada é tudo uma treta, não tem renda apoiada nenhuma”, referindo que paga a totalidade da renda, 95 euros/mês, sem ter condições de habitabilidade.

Filomena Brito, de 63 anos, mora no bairro social do Condado/Zona J, em Lisboa, explicando que há 35 anos que não há obras.

“Sofremos um aumento, pediram-nos 225 euros de renda, quando temos só uma pensão de 300 euros”, afirmou esta moradora, exigindo que o IHRU veja as condições que as pessoas têm para poderem pagar as rendas.

Vindo de Guimarães, do bairro social de São Gonçalo, Jerónimo Couto encontra-se desempregado, é o ordenado mínimo da esposa que equilibra as finanças deste casal com duas filhas, e sofreu um aumento da renda, passando a pagar 215 euros/mês.

“Para ter condições dentro de casa tive que fazer obras do meu bolso”, disse o vimaranense, explicando que os prédios do bairro já não têm obras há mais de 30 anos.

Durante a manifestação, os moradores dos bairros sociais entregaram no IHRU um cabaz com material de construção civil, numa ação simbólica que pretendeu alertar para o facto de “aumentarem as rendas às famílias, mas não fazerem qualquer tipo de obras”.

Segundo a lei, as famílias monoparentais ou que integrem menores, deficientes, idosos e vítimas de violência doméstica podem ser casos preferenciais na atribuição de casas com renda apoiada.